Juros por cobrança da taxa de Protecção Civil vão custar a Lisboa cerca de três milhões de euros

Fim da cobrança da taxa municipal de Protecção Civil provocou uma descida nas receitas fiscais da autarquia de 20,1 milhões. “Não fosse [isso e] tínhamos estado em linha” com 2017, considerou o vereador das Finanças.

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Miguel Manso

Pela primeira vez desde 2014, houve uma inversão da trajectória dos proveitos operacionais: a câmara de Lisboa fechou o ano de 2018 com as receitas a atingirem os 697,7 milhões de euros, uma diminuição de 20,4 milhões face ao ano anterior. Apesar desta descida, é o segundo ano consecutivo que a autarquia obteve um valor de receitas correntes superior ao da dívida. Já o investimento promovido pela autarquia atingiu, em 2018, os 134 milhões de euros, menos 22 milhões do que no ano anterior. 

Para esta redução nas receitas da autarquia contribuiu o fim da cobrança da taxa de Protecção que o Tribunal Constitucional considerou ilegal. É uma perda de 20,1 milhões. “Não fosse a taxa de protecção civil tínhamos estado em linha” com 2017, notou o vereador das Finanças, João Paulo Saraiva, na apresentação do Relatório e Contas da autarquia de 2018, que decorreu nos Paços do Concelho. 

Respondendo a questões dos jornalistas, o vereador das Finanças anunciou que a autarquia irá devolver cerca de três milhões de euros de juros indemnizatórios pela cobrança indevida desta taxa, declarada inconstitucional em 2017. 

Já este ano, em Fevereiro, foi publicada uma lei — "uma lei um bocado estranha, porque é uma lei retroactiva”, notou João Paulo Saraiva — que clarificou que, além dos 58 milhões de euros relativos à taxa, que tinham sido já devolvidos, os munícipes tinham agora direito a ser ressarcidos com juros. "Na altura a lei não permitia pagar juros, fizeram uma lei de propósito para nós devolvermos os juros”, notou o responsável pela pasta das Finanças. 

Esse montante deverá ser devolvido aos munícipes através de um método “muito parecido com o formato que foi utilizado na devolução da taxa propriamente dita”, disse o autarca. 

Menos 30 milhões em impostos

Do bolo total das receitas, quase três quartos (513 milhões) correspondem aos impostos cobrados aos lisboetas que, face a 2017, diminuíram 30 milhões de euros. 

Além da taxa de protecção civil, também contribuíram para a descida das receitas da autarquia em matéria fiscal uma diminuição de oito milhões na derrama (cobrada às empresas com volume de negócios superior a 150 mil euros) e na TRIU (taxa cobrada às operações urbanísticas), que rendeu menos 10,6 milhões face a 2017. Para João Paulo Saraiva, a descida nestes impostos/taxas serão “situações episódicas”. No que respeita à TRIU, o vereador justificou que houve “um pico no levantamento de licenças” no final de 2017, o que terá provocado esta descida em 2018. As restituições relacionadas com processos judiciais ligados à derrama aumentaram o encargo para a autarquia em mais de 11 milhões de euros. 

Ainda assim, a diminuição destes impostos e taxas foram compensadas por um aumento no Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT) — cobrado de cada vez que se vende um imóvel —, cuja receita ascendeu a 262 milhões de euros (mais 16,5 milhões face ao período homólogo), a reboque da dinâmica do mercado imobiliário. 

Já o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) rendeu 120 milhões de euros (mais 4,1 milhões), apesar de Lisboa ser uma das duas autarquias da Área Metropolitana de Lisboa, juntamente com Vila Franca de Xira, que aplica o seu valor mínimo (0,3%). 

A taxa turística, por sua vez, rendeu 18,5 milhões de euros em 2018 aos cofres da autarquia, valor semelhante ao do ano passado, e cerca de mais quatro milhões do estimado no orçamento municipal. Esta taxa, cobrada sobre as dormidas em unidades hoteleiras e apartamentos turísticos desde o início de 2016, duplicou no início de 2019, passando de um para dois euros. 

Investimento “sustentado”

No ano passado, a autarquia fez investimentos da ordem dos 134 milhões de euros, menos 22 milhões que em 2017. O vereador justificou esta descida com o facto de 2017 ter correspondido ao fim do mandato autárquico, coincidindo assim com a conclusão de algumas empreitadas de maior monta. Ainda assim, refere que o município tem “conseguido manter uma trajectória ascendente de investimento e actividade”, acreditando que 2019, 2020, 2021 serão anos com mais investimento. 

O autarca lembrou a execução do Programa Lisboa XXI, que corresponde a uma linha de financiamento ao município do Banco Europeu de Investimentos, no montante global de 250 milhões de euros. E que servirá para financiar obras como o plano de drenagem, de habitação e regeneração urbana, incluindo escolas.

Em Dezembro de 2018, a execução total do programa situava-se em 141,5 milhões de euros. Deste bolo, a fatia maior destinou-se à regeneração urbana (106,2 milhões), seguindo-se 31,2 milhões em habitação social, e 3,1 milhões no plano de drenagem, que prevê a construção de dois túneis de drenagem para a qual será lançado um novo concurso “muito em breve” — depois de o primeiro ter ficado deserto —, referiu João Paulo Saraiva. 

O montante executado na regeneração urbana inclui 32,6 milhões em reabilitação do espaço público, 20,9 milhões de euros de investimento em escolas, 16,9 milhões em arruamentos e pavimentos, 9,6 milhões em estacionamento, 7,9 milhões na estrutura verde, e 6,9 milhões em equipamentos culturais.

Na habitação social, foram investidos 12,4 milhões de euros na reabilitação de bairros municipais, 10,4 milhões de euros na reabilitação de fogos municipais, 5,5 milhões no Bairro da Boavista, 1,7 milhões nos realojamentos do Bairro da Cruz Vermelha e 1,6 milhões no Bairro Padre Cruz. 

“Amargozinho de boca”

João Paulo Saraiva começou a sua intervenção por referir que as contas que se preparava para apresentar eram “certas, equilibradas e sustentáveis”: “Em 11 anos, de forma consecutiva, sistemática e sustentável, o passivo reduziu 1048 milhões de euros”. Em 2018, o município reduziu o passivo em 162 milhões de euros (15,2%), passando para os 904 milhões. João Paulo Saraiva confessou ainda ter ficado com um “amargozinho de boca” por não ter baixado dos 900 milhões. 

Já a dívida de 2018 situou-se nos 433 milhões de euros - menos 51 milhões face ao ano anterior. 

João Paulo Saraiva destacou ainda que os números de 2018 representam “uma nova forma de olhar para as empresas municipais”. “Houve uma mudança de paradigma, uma aposta clara nas empresas e no seu reforço de capacidade”, disse. De acordo com o relatório, as empresas municipais detinham, no ano passado, 160 milhões de euros de capital próprio e uma dívida bancária de 15 milhões de euros, sendo que dez milhões são referentes à Gebalis, a empresa municipal que gere os bairros da autarquia de Lisboa. 

Nas contas da autarquia, o ano passado ficou ainda marcado pelo desfecho do “Processo Arez Romão”, no qual a câmara de Lisboa foi condenada, pelo Supremo Tribunal de Justiça, a pagar 96 milhões de euros. Em causa está um contrato firmado entre a câmara e António Pais Arez Romão, que cedeu ao município 45.700 metros quadrados de um terreno, na Quinta das Pedreiras, no Lumiar, ficando com a restante propriedade. “Sem esse impacto, estas contas seriam mais interessantes”, notou o autarca. 

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