Justiça sul-coreana declara lei anti-aborto “inconstitucional”

A lei que proíbe o aborto, em vigor desde 1953, deverá ser revista pelo Parlamento até ao final de 2020. Cabe agora ao Parlamento decidir, por exemplo, se o aborto nas fases mais tardias da gravidez deve permanecer ilegal.

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Reuters/KIM HONG-JI

O Tribunal Constitucional da Coreia do Sul declarou inconstitucional a proibição do aborto. Uma decisão histórica noticiada nesta quinta-feira pela agência de notícias sul-coreana Yonhap.

O tribunal concluiu que a lei antiaborto era “uma restrição inconstitucional que viola o direito de escolha de uma mulher grávida”. A lei que proíbe o aborto – e que data de 1953 – deverá ser revista pelo Parlamento até ao final de 2020. Se esta data não for cumprida, a lei fica simplesmente sem efeito. Cabe agora ao Parlamento decidir se o aborto nas fases mais tardias da gravidez deve permanecer ilegal.

Actualmente, as mulheres sul-coreanas que tentarem fazer um aborto podem ser multadas até dois milhões de won (aproximadamente 1557 euros) ou ser condenadas a uma pena de prisão até 12 meses. O médico que realizar uma interrupção da gravidez pode ser condenado a dois anos de prisão.

A Coreia do Sul, país asiático de herança cristã, é um dos únicos países ditos desenvolvidos onde o aborto ainda é crime. A excepção é feita para os casos de violação, incesto ou casos em que a gravidez apresente riscos para a saúde da mulher.

Apesar de ser ilegal, foram realizadas cerca de 50 mil interrupções voluntárias da gravidez na Coreia do Sul em 2017 – sendo que quase 94% dessas intervenções foram ilegais, escreve o New York Times. Este número é, ainda assim, inferior às estimativas oficiais de 2010, que apontam para 160 mil. Esta queda deve-se, entre outras razões, ao melhor acesso a métodos contraceptivos, escreve a BBC.

Apenas uma pequena percentagem das mulheres e dos médicos que interrompem a gravidez é levada a tribunal: entre 2012 e 2017, apenas 80 mulheres e médicos foram julgados por estarem envolvidos em abortos e apenas um foi condenado a pena de prisão efectiva.

 A iniciativa de levar a lei antiaborto a tribunal partiu de vários colectivos a favor dos direitos das mulheres, que defendem que proibir o aborto só coloca em perigo as mulheres e limita os seus direitos. As últimas sondagens, financiadas pelo Governo, mostram que a maioria das mulheres em idade fértil (entre os 15 e os 44 anos) também pensa assim: 7500 das 10.000 mulheres inquiridas é a favor da despenalização do aborto.

“A decisão marca um passo importante no fortalecimento da igualdade de género e nos direitos das mulheres”, escreveu o grupo Solidariedade do Povo para a Democracia Participatória, em comunicado.

Ainda há, no entanto, quem defenda que a intervenção deve continuar ilegal, porque obriga as mulheres a ponderar melhor, escreve a BBC. A conferência episcopal católica coreana lamentou a decisão por defender que “nega ao feto o direito básico à vida”. “O aborto é o crime de matar uma vida inocente durante a gravidez”, lê-se em comunicado, citado pelo New York Times.

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