Haja coragem

Os atos eleitorais que batem à porta são uma boa altura para impedir que os mesmos de sempre façam a mesma política. É preciso coragem e dar mais força aos partidos que nunca foram governo.

As sociedades “ocidentais” apresentam hoje alguns sintomas muito idênticos, sendo de presumir que poderão certamente ter a mesma origem.

Nos últimos vinte ou trinta anos, os governantes sucedem-se e os males permanecem.

Se os problemas permanecem, com maior ou menor intensidade, significa que as políticas que os geram são, na sua essencialidade, as mesmas. Se houvesse políticas diferentes, nos diversos países, os resultados seriam certamente outros.

Uma das consequências desta situação é gerar uma impotência nos cidadãos quanto à sua vontade de mudar o rumo das coisas. Se o disco é o mesmo, a música só pode ser a mesma…

Em teoria uma das maiores virtudes de um regime democrático é dar aos cidadãos a possibilidade de optar por múltiplas escolhas.

O que, entretanto, tem vindo a suceder é a subversão deste princípio, sobretudo quando se instalou uma espécie de poder mundial que impõe “democraticamente” um modo de governar que é o mesmo em todo o lado e que consiste em tornar os ricos mais ricos, alargar as desigualdades e estreitar o leque das classes médias. Quanto menos rendimentos obtiverem os cidadãos, mais recebem os gestores que o conseguirem. Já se chegou a esta enormidade: vinte e seis bilionários têm rendimentos igual a metade da população mundial.

Eis o eixo: privatizar tudo o que possa dar lucro, colocar a gestão dos bens da comunidade em mãos privadas, enaltecer o poder do dinheiro, tornar os cidadãos numa legião de basbaques a contemplar a vida dos bilionários.

Para tanto a própria União Europeia atirou as malvas a coesão económica e social e elegeu a saúde do sistema financeiro como a sua maior preocupação.

Nesta ordem de ideias são os cidadãos que são expropriados dos seus rendimentos para acudir ao sistema bancário cujos dirigentes o guiou ao descalabro, não sendo, por isso, penalizados, antes tratados com todo o cuidado, salvo um ou outro caso, algures nos EUA (Bernard Madoff, 150 anos de cadeia) e na Islândia (banqueiros condenados a prisão).

A governança, em que ora entra um partido que sai para entrar outro e tudo se mantém nas mãos desse poder económico mundial, gera impotência, descrédito e desconfiança no próprio regime na medida em que bloqueia possíveis saídas.

Um dos casos mais gritantes está a acontecer em França. Hollande e o PS, ao contrário do que apregoaram, atacaram com fervor as condições de vida das populações, empobrecendo os franceses. O descrédito foi enorme.

Antes da implosão do PS, o ministro da Economia do governo PS, Emmanuel Macron, bateu com a porta e saiu para formar um novo partido e prometer aos franceses uma França rejuvenescida e melhor.

Chegando ao poder ainda levou o país a uma situação bem pior aquela que gerou no seu tempo de ministro da Economia.

A exasperação é enorme e surgiu o movimento dos coletes amarelos, que vem perdendo apoio devido a grau de violência gratuita que permite Macron recuperar algo, por instantes.

Não é preciso sair de Portugal para se constatar o número de políticos que saem do governo para os bancos e que mais tarde regressam aos governos com os mesmos ou com outros partidos.

As saídas de dirigentes e quadros do CDS, PSD, PS para gerirem bancos e depois regressarem aos partidos de onde saíram mostra bem até que ponto há muito de siameses neste chamado arco de governação que, apesar de Costa ter tido a coragem de enfrentar, ainda persiste em muitos domínios.

Gera desconfiança no sistema, o que vai levando ao poder Trump, Salvini, Balsonaro, Vitor Orban e c.ª.

Certos políticos saem de cena derrotados, mas logo aparecem de novo a comandar partidos ou opiniões públicas pelo chamamento dos donos das televisões.

Um exemplo acabado desta manigância é Marques Mendes que dominicalmente vai à SIC dizer missa. O senhor doutor foi à SIC em 2014 garantir que o BES era sólido, de total confiança, em diversas ocasiões, até em Faro, em agosto; sempre a garantir que a partir de então o banco bom era mesmo bom. Garantiu a pés juntos.

Há dias teve o despautério de arengar que afinal os portugueses têm todas as razões para se indignar porque o lixo que tinha sido eliminado pelo governo de Passos e Cristas, afinal apareceu com toda a força por obra e graça de Centeno…

Os atos eleitorais que batem à porta são uma boa altura para impedir que os mesmos de sempre façam a mesma política. É preciso coragem e dar mais força aos partidos que nunca foram governo.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

                  

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