Da Terra ao espaço: o céu nunca é o limite e a idade não importa

Participar no concurso Jovens Cientistas foi fulcral para hoje ser astrofísico e professor universitário. A experiência internacional expôs-me ao nível do que era possível fazer e mostrou-me que a idade não importava.

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NASA/Reuters

A Ciência não tem género, idade, raça ou nacionalidade. É alimentada pela nossa inata criatividade e tem como consequência imediata percebermos a nossa insignificância e ignorância. Dá-nos a oportunidade de sermos humildes. Tem consequências práticas, mas não é por isso que a fazemos. A Ciência não nos dá certezas nem verdades, antes ferramentas para iluminarmos as sombras e construirmos novos caminhos. Permite-nos ver mais longe, nos ombros uns dos outros. Há 15 anos experimentei uma pequena amostra de Ciência no Barreiro e concorri ao concurso Jovens Cientistas. Acabei numa entrega de prémios na Gulbenkian e ganhei uma experiência única em Dublin para representar Portugal na final Europeia do concurso, em 2004. O meu prémio em Dublin foi admirar a excelência dos projectos que ali estavam, vindos de toda a Europa. Senti-me ainda mais pequeno e insignificante, mas com uma vontade imensa de descobrir coisas novas e trabalhar para ser pelo menos tão bom como os melhores.

Todos nascemos e crescemos curiosos e, por isso, querer saber, questionar e investigar são coisas comuns a todos nós. Claro que nem todos gostamos dessa constante incerteza e de querer saber mais, mas não há mesmo nada como experimentar. Mesmo que acabemos por seguir os mais diversos caminhos e encontrar a nossa vocação noutro sítio. No meu caso, o experimentar fez toda a diferença. Engane-se quem acha que isto de ser cientista/investigador(a) ou astrofísico(a) é algo que já nasce connosco e dura para sempre. O que nasce connosco é a curiosidade imensa, o querermos saber mais. Mas daí em diante são mais as incertezas, inseguranças e medos do que todas as estrelas no céu.

Há 16 anos decidi finalmente o que queria estudar: línguas e literaturas modernas. Queria ser escritor. Escrevinhava coisas e lia imenso. Arranhava poesia e esboçava contos no DN Jovem e até escrevi uns “romances”. Ganhei prémios literários e publiquei umas coisas e, sobretudo, “aprendi” a levar com comentários brutais do género “destruição nuclear de almas e sonhos em menos de cinco segundos”. Só que, em pouco mais de um ano, a literatura acabou por ser a segunda opção e entrei em Física. As razões para esta mudança aparentemente radical? Uma escola de Verão de Ciência organizada pela UNL-FCT na Caparica em 2003, que me levou a mudar de escola para estudar Física, Biologia e Psicologia, um livro do João Magueijo que a minha mãe me deu e o concurso Jovens Cientistas.

Na Caparica descobri que gostava mesmo de Física, mas que o que queria ainda mais era escrever e recebi um livro de poemas do Álvaro de Campos. Na Escola Secundária Alfredo da Silva, no Barreiro, tive uma professora de Física fantástica que nos levou a conciliar desporto com Física, e a fazer um projecto sobre projécteis: no laboratório e no basquetebol. Peguei nisso e meti-me na programação para prever e mostrar trajectórias em qualquer planeta do sistema solar. Sempre se perguntaram como seria jogar basquetebol fora da Terra? O puto David tinha a reposta, com o trabalho Projécteis: da Terra ao Espaço.

Ganhei o quarto prémio nacional, apresentei parte do projecto numa aula teórica na FCUL da minha referência de excelência no ensino universitário, o professor Augusto Barroso, e representei Portugal em Dublin, em 2004. Daí em diante, a Associação Juvenil de Ciência (AJC) e o Observatório Astronómico de Lisboa levaram-me a gostar cada vez mais de Astrofísica, a fazer e lançar foguetes um pouco por todo o país e a lançar-me a mim mesmo para Edimburgo, para começar a fazer investigação a tempo inteiro.

Participar no concurso Jovens Cientistas foi fulcral para hoje ser astrofísico e professor universitário. A experiência internacional expôs-me ao nível do que era possível fazer e mostrou-me que a idade não importava. Fez-me querer trabalhar para ser tão bom ou melhor do que os exemplos inspiradores que vi, e um dia, poder contribuir para muitos mais serem ainda melhores. Por isso, foi fantástico ter sido convidado para ser fundador do grupo Jovens Cientistas Alumni em 2018 e até entregar prémios.

A oportunidade de ter estado presente na XII Mostra Nacional de Ciência, que não existia no meu tempo, mostrou-me algo absolutamente claro. A qualidade dos projectos e dos participantes nacionais é tal que já nem é preciso ir à Europa para testemunhar o mesmo tipo de ambiente, a mesma qualidade, o mesmo buzz que foi tão importante para mim. Os muitos concorrentes com quem falei directamente, com quem joguei, com quem aprendi métodos matemáticos antigos e pedi autógrafos na minha brochura do concurso são hoje ainda promessas, mas amanhã serão, certamente, valores seguros. Na Ciência ou na sociedade. Porque o que se aprende num concurso e em mostras deste género aplica-se muito para além da investigação e tem uma qualidade muito acima da média do que se faz nas próprias universidades.

Os jovens cientistas de 2018 inspiraram-me ainda mais a continuar em busca das nossas origens cósmicas — e de certeza que se inspiraram uns aos outros a saber mais, a serem melhores e a não desistirem dos seus sonhos, por mais que lhes digam que não são capazes, que são novos demais, que não percebem nada disto. Inspiraram-me a perceber como é que galáxias como a nossa própria casa se formaram e evoluíram ao longo de mais de 13 mil milhões de anos e a inspirar ainda mais as gerações seguintes. E tu, de que estás à espera para concorrer em 2019?

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