Foi libertado o marido que ajudou a mulher a morrer

María Carrasco, com esclerose múltipla há trinta anos, morreu com a ajuda do marido. Associação Derecho a Morir Dignamente quer reforçar a discussão sobre eutanásia em Espanha.

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Ángel Hernández LUSA/Carlos Perez

Esta quinta-feira, após ser interrogado, Ángel Hernández, de 69 anos, foi libertado sem medida de coação pelo Tribunal de Instrução de Madrid. O espanhol passou uma noite detido, depois de, na quarta-feira, ter ajudado a sua esposa, com esclerose múltipla há 30 anos, a morrer.

De acordo com o El País, Ángel Hernández deu à esposa, María José Carrasco, de 61 anos, uma bebida de pentobarbital para provocar a morte – pedida, várias vezes, pela madrilena, que estava praticamente paralisada e com graves problemas de visão e audição.

Ángel Hernández decidiu gravar o momento, “para que vissem o sofrimento e o abandono em que estavam”, disse a advogada do espanhol, Olatz Alberdi. “Ele sempre disse que não iria fazer isto de forma encoberta, que queria dar luz ao assunto”, explica. Depois de dar a bebida a María Carrasco, Hernández telefonou aos serviços de emergência e foi detido, mais tarde, pela polícia de Madrid.

Em Outubro do ano passado, María Carrasco deu uma entrevista ao El País, na sua casa, em Saconia, Madrid, onde já manifestava a vontade de morrer. “Eu quero o fim o quanto antes”, disse.

Quando foi realizada a reportagem do jornal espanhol, María já era dependente do marido: não conseguia falar, comer, ficar de pé ou escrever. Às vezes tinha de receber cuidados paliativos. Ángel Hernández conta que chegaram a ser oferecidos pelos serviços médicos sedativos para atenuar a dor, mas María rejeitou-os. “Eu não quero dormir, quero morrer”, disse. Na entrevista, Hernández admite que está disposto a ajudar a esposa a morrer, mas María descarta a possibilidade por receio de que o marido seja preso. “Ele não tem medo, mas eu tenho”, diz.

Eutanásia em Espanha

A cooperação para pôr fim à vida é punida em Espanha, embora sejam equacionadas determinadas atenuantes caso aconteça com uma pessoa em estado grave. O artigo 143.4 do código penal diz que “aquele que causa ou colabora activamente com actos necessários e directos à morte de outro, pelo pedido expresso, sério e inequívoco deste, no caso de a vítima sofrer uma doença grave que conduziria necessariamente à morte, ou que produziria dificuldades severas e permanentes é condenado com uma penalidade menor em um ou dois graus”. Desta forma, o código penal espanhol previa uma pena de prisão de seis meses a dois anos para Ángel, que acabou por ser libertado sem que o magistrado lhe aplicasse nenhuma medida cautelar.

A associação espanhola Derecho a Morir Dignamente, que está a auxiliar Ángel Hernández, explicou ao El País que este não é o único caso em que se recorreu à ajuda clandestina para cometer suicídio – uma vez que a eutanásia continua a ser proibida no país. Contudo, segundo o jornal, desde Ramón Sampedro, o tetraplégico galego que se suicidou em 1998 com a ajuda de um amigo, nenhum caso ganhou tanta visibilidade mediática. Perante a história de María e Ángel, a associação pede “aos futuros deputados que regulem e descriminalizem urgentemente a eutanásia”.

Em Junho do ano passado, o parlamento espanhol discutiu uma proposta de lei do Partido Socialista espanhol (PSOE) para regulamentar a eutanásia. O Partido Popular (PP) foi o único partido a votar contra o projecto de Pedro Sanchéz que pretendia tornar a eutanásia num direito individual, efectivo e possível de ser exercido nos serviços do Sistema Nacional de Saúde.

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