Os deuses devem estar loucos

Pensar ou ler sobre Portugal confere o direito a que se seja invadido por uma tristeza profunda.

Pensar ou ler sobre Portugal (algo cada vez mais escasso) confere o direito a que se seja invadido por uma tristeza profunda. Olhemos Portugal.

O órgão superior da Administração Pública, o Governo, está pejado de impedimentos legais. Marido e mulher, pai e filha, não podem participar no mesmo procedimento administrativo e por aí adiante. Bastaria ler o Código de Procedimento Administrativo, que ainda é lei escrita (será?). Claro que há formas de o contornar.

Declaram-se todos impedidos? Tu nomeias a minha família e eu a tua. Não é solução, manifestamente. Assim sendo, como o é, em matéria do quotidiano da administração do país, como ficamos?

Por outro lado, a parlamentarização da actividade administrativa esquece a separação de poderes: as intromissões nas competências do Governo são constantes e sem pudor.

Quanto à fiscalização que compete ao Parlamento efectuar ao Governo, aos costumes diz nada. Por seu turno, o Governo não se deixa fiscalizar pelo Parlamento. Coisa normal nos nossos dias.

Quanto a entidades independentes, estamos falados: nada como as controlar, de que é exemplo a proposta para fiscalizar o Banco de Portugal. Porquê? Serão guerrinhas pessoais? Centeno nunca brilhou no BdP. Vinga-se como ministro?

O Presidente da República não tem qualquer temor em pressionar a actividade legislativa, pré-anunciando a sua vontade, designadamente. Quanto ao mais, no que toca ao nepotismo, a culpa é do seu antecessor, o Presidente, como há tantos anos escrevi.

De facto, em dias de espuma, é bem mais fácil abraçar, tirar umas quantas selfies, do que fiscalizar com o total conhecimento dos dossiês e a reserva que o cargo impõe (promulgar diplomas em horas?). Ser Presidente não é ser o alfa e o ómega da popularidade: é pôr o país à frente.

Curiosamente, as imagens do actual Presidente, publicadas no semanário Expresso de dia 30 de Março, revelam... um tal azar... (um Presidente só, omnisciente).

Por outro lado, na nossa sociedade, criam-se novos empregos, mas a servir à mesa e com o salário mínimo.

A oposição ao Governo (qual?) existe dia sim ou dia não. Basta ver as posições do BE, do PCP, do PSD ou do CDS-PP.

Por vezes, as oposições parecem sadomasoquistas: referências há aos passes sociais que esquecem que a maioria dos impostos vem precisamente das grandes áreas metropolitanas e que existem programas, no interior, como o Porta-a-Porta e o transporte escolar, para além de iniciativas outras de várias juntas de freguesia. O que não significa que tal questão não deva ser melhorada.

Em 2015, o PSD ganhou as eleições em Lisboa, o que não acontecia há 17 anos. O que fez o PSD com esse património? Simples. O que fazem gerações que destroem o património herdado. Esbanjam-no, com ilustres excepções.

“Em breve passaremos a falar de excedentes”, afirma o ministro das Finanças. Certo. Só que as suas palavras me recordam umas quantas fábulas. Se os excedentes se devem a deixar de dar palha ao cavalo (leia-se, aos serviços públicos), estamos falados. Claro que o cavalo morre. Vamos morrendo como um todo.

Pensões há que estão há alguns anos por pagar. Anunciam-se obras. Estão concretizadas? Não.

Quanto ao Judiciário, até tem de ser ensinado e formatado em cursos especialmente dirigidos, como se não soubesse.

As nossas crianças não precisam de saber mais História, Geografia ou Matemática, por exemplo. Têm é de aprender a andar de bicicleta. E as que não o podem fazer, a vários títulos?

Os deuses podem estar loucos, mas, no fim, perdem os que querem perder.

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