Auditoria à CGD não revela perdas do banco público com o BES

Responsável da Ernst&Young explicou no Parlamento que verificação funcionou por amostra e que foram estudados créditos do Espírito Santo, mas não foi "feita análise de dívida por grupo económico". Deputados querem informação adicional.

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Florbela Lima diz que não foi encontrado um padrão de irregularidades na CGD nos principais créditos LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Desde o início da audição, nesta terça-feira no Parlamento, que Florbela Lima, responsável pela auditoria da Ernst&Young (EY) à Caixa Geral de Depósitos (CGD), explicou as limitações do trabalho que foi feito. Uma delas teve a ver com o facto de ser uma avaliação “operação a operação” dos principais créditos dos maiores devedores do banco público. Isto quer dizer, assumiu perante os deputados da comissão de inquérito à gestão da CGD, que não foi feita “uma análise de dívida por grupo económico”, o que pode ter deixado de fora parte da dívida do Grupo Espírito Santo (GES). Mas a auditoria não especifica se os créditos que foram verificados, incluindo os dos GES, foram pagos ou se foram assumidas as perdas pela Caixa. No sumário da auditoria, a EY refere que os prejuízos da CGD em 2014 e 2015 se deverem também ao colapso do GES, mas não quantifica as imparidades em causa.

O assunto é complexo e a EY ficou de enviar mais dados sobre estes casos aos deputados, porque tem mais informação do que a que consta da auditoria. Em causa está o facto de o trabalho identificar créditos elevados em relação aos quais a CGD já não tinha exposição em 2015, sem no entanto explicar o que aconteceu a essa exposição, em particular se o crédito foi pago ou se o banco público assumiu a perda.

O caso foi levantado pela deputada do BE Mariana Mortágua que quis saber a razão pela qual a auditoria tem “em branco” informação sobre o que aconteceu a vários créditos. “O que justifica este branco? Porque foram pagos ou foram imparizados [assumidas perdas] e saíram do activo antes de 2015? Eu não sei se quem não está nesta lista é porque pagou ou porque não pagou”, questionou a deputada. “Com base no que está aqui, não lhe consigo responder”, retorquiu Florbela Lima, que admitiu enviar informação sobre o assunto ao Parlamento.

Um dos casos em que este dado não é revelado diz respeito a uma dívida da ES Enterprise, o “saco azul” do GES. E é aqui que entra a segunda parte do problema: a auditoria identificou os grandes devedores do banco (entre eles a ES Enterprise), também analisou os 246 principais créditos problemáticos, apesar de não ter informação para muitos, mas, como não agrupou créditos por devedor, “é possível”, admitiu Florbela Lima, que haja grandes devedores que tenham ficado de fora da análise. “É possível? É. Acho que será difícil pelo menos não termos identificado os devedores com maiores perdas”, esclareceu.

Um deles poderá ser a Ongoing. Em relação a este grupo, a responsável pela auditoria admitiu que não constou da análise. Outros devedores entretanto identificados são a Golden Eagle, sobre a qual “não foi disponibilizada informação”, e a operação de Vale de Lobo, “que está com a Procuradoria-Geral da República”.

A audição à EY foi a primeira da comissão de inquérito à gestão da CGD entre 2000 e 2015 e, apesar das promessas dos partidos de que esta comissão iria ser menos partidarizada, notou-se uma divisão entre dois lados da barricada. O PSD concluiu, e tentou que a EY confirmasse essa conclusão, que os principais créditos ruinosos por não respeitarem as regras internas foram originados entre 2005 e 2008, durante o Governo de José Sócrates, e o PS tentou perceber se algo poderia ter sido feito em 2012, aquando da recapitalização feita pelo Governo de Passos Coelho.

Florbela Lima desviou-se do jogo partidário, não querendo atribuir responsabilidades directas a nenhum Governo ou administração, e reforçou a ideia de que não é possível estabelecer uma relação directa entre o incumprimento das normas internas e as perdas que esses créditos geraram para o banco. Questionada várias vezes pela deputada do PSD Inês Domingues, Florbela Lima respondeu: “O facto de termos uma perda não tem uma relação directa com o incumprimento dos normativos aplicados, há outros factores que contribuem para as perdas”, disse. Ou seja, não há um “padrão” na actuação das aprovações que levaram aos créditos mais ruinosos, há sim, um padrão de falta de informação em relação a alguns créditos.

Sem “juízos de valor"

A falta de documentação foi um dos problemas de que se queixou a EY, sobretudo porque a CGD não tinha um arquivo centralizado até 2013 e a EY teve de se socorrer de “arquivos mortos, em cofres”. Perante esta constatação, os deputados perguntaram se houve créditos de favor, mas a EY recusa fazer “juízos de valor” sobre os empréstimos concedidos. “Há decisões que não foram justificada? Sim. Se houve créditos de favor? É o senhor deputado que tira essa conclusão, não somos nós. Não analisámos a qualidade das decisões”, disse.

Já a deputada do CDS Cecília Meireles viu outro problema associado à falta de documentação. Se não foi entregue “é um indício forte” que não “há sequer contrato” e como pode o banco público “recuperar esse empréstimo” sem documentos? É difícil, admitiu Florbela Lima.

Em resposta ao deputado Carlos Pereira, do PS, Florbela Lima informou que a EY não teve conhecimento de “comunicações com indicações para conceder determinado tipo de empréstimos” por parte da tutela.

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