A tarefa mais difícil da História americana

Lamentavelmente, este processo revela um defeito importante do governo americano: um responsável político nomeado pelo Presidente é chamado a tomar uma decisão que afectará o futuro do seu chefe.

O dia há muito esperado chegou finalmente, o dia que podia vir descansar ou desgraçar Donald Trump. Após 22 meses de trabalho árduo, Robert Mueller entregou o seu minucioso relatório ao recém-empossado procurador-geral William Barr.

A função nada invejável de rever o relatório recaiu sobre Barr. Até agora, William Barr apenas apresentou um curto relatório, muito conciso, que declara que a administração Trump e o próprio Presidente não serão alvo de acusação. O procurador-geral não pode em boa consciência, como leal cidadão, atenuar o relatório, mas há razões para crer que é capaz de ter feito isso mesmo. O dever de Robert Mueller, na eventualidade de um relatório incriminador, é apontar a William Barr que, em caso algum, ele pode ocultar partes-chave do documento ou atenuar o seu conteúdo.

Em resumo, podemos ver que, ainda que Mueller possa ter prestado um serviço de grande valor a supervisionar a preparação do relatório, não lhe é solicitado que tome a decisão mais difícil; ele apenas apresenta o seu trabalho ao procurador-geral, que fica com a tarefa mais difícil de toda a história dos Estados Unidos: dar o importante passo para derrubar um Presidente que ainda há pouco o nomeou para o seu cargo.

É demasiado cedo para saber se ele desempenhou o seu dever lealmente ou se arranjou uma saída política. Lamentavelmente, este processo revela um defeito importante do governo americano: um responsável político nomeado pelo Presidente é chamado a tomar uma decisão que afectará o futuro do seu chefe. Pode-se argumentar que seria preferível um sistema que depositasse responsabilidades tão pesadas nas mãos do poder judicial independente em vez daquilo que enfrentamos agora na América. William Barr pode sentir que ficou encurralado numa situação de lealdade dividida.

Como Barr deve, evidentemente, fazer para o Congresso um relatório mais desenvolvido do que as insultuosamente escassas quatro páginas que apresentou até agora, resta-nos esperar que ele tenha o estômago e o carácter necessários para a tarefa. A única defesa – talvez não muito segura – para o caso de William Barr se limitar a varrer o grosso do relatório para debaixo do tapete é alguém produzir uma fuga de informação. Se, por qualquer razão, Barr faltar ao seu dever, pode-se ter a certeza de que, de uma maneira ou de outra, quaisquer conteúdos potencialmente nocivos do relatório acabarão por abrir caminho até ao domínio público. “Beware the ides of March.”

Tradução de Rita Veiga

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