Biden critica “cultura do homem branco” e penitencia-se pelo seu próprio passado

Antigo vice-presidente dos EUA e possível candidato à Casa Branca em 2020 lamenta a forma como geriu a audição a Anita Hill, a advogada que acusou o juiz Clarence Thomas de assédio sexual em 1991.

Joe Biden foi vice-presidente de Barack Obama, entre 2009 e 2017
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Joe Biden foi vice-presidente de Barack Obama, entre 2009 e 2017 Charles Mostoller
Clarence Thomas é um dos nove juízes do Supremo Tribunal dos EUA
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Clarence Thomas é um dos nove juízes do Supremo Tribunal dos EUA Reuters/Jonathan Ernst

O antigo vice-presidente dos EUA Joe Biden lamentou a forma como geriu as audições no Senado a Anita Hill, em 1991, quando a advogada afro-americana acusou um candidato a juiz do Supremo Tribunal de assédio sexual. Biden foi acusado de não proteger Hill de um interrogatório duro pelos 14 senadores brancos da Comissão de Justiça, o que pode custar-lhe algum apoio se decidir candidatar-se às eleições presidenciais de 2020 pelo Partido Democrata.

Numa cerimónia em honra de jovens que lutam contra o assédio sexual nas universidades, na noite de terça-feira, em Nova Iorque, Joe Biden disse que Anita Hill “pagou um preço terrível” quando deu a cara para acusar o juiz Clarence Thomas de assédio sexual, e admitiu que a advogada não teve “a audição que merecia”.

“Gostaria de ter podido fazer alguma coisa”, disse o ex-senador do Delaware, de 76 anos, que em 1991 era o presidente da Comissão de Justiça do Senado.

Nesse cargo, foi o responsável máximo pela forma como decorreram as audições a Clarence Thomas para o Supremo Tribunal, e também a Anita Hill, que acusou o juiz de a ter assediado no tempo em que ambos trabalharam na Comissão de Oportunidades Iguais no Emprego.

No discurso de terça-feira, Joe Biden recordou que votou contra a nomeação de Clarence Thomas para o Supremo Tribunal – o juiz seria nomeado com 52 votos a favor e 48 contra, num ano em que o Partido Democrata estava em maioria no Senado.

“Até hoje, lamento não ter encontrado uma forma de lhe proporcionar o tipo de audição que ela merecia, à medida da coragem que demonstrou ao pedir-nos ajuda”, disse Biden.

“Ela merecia ter sido respeitada, e que o tom das perguntas não fosse hostil ou insultuoso”, disse o antigo senador e vice-presidente dos EUA. “Em vez disso, pagou um preço terrível. Foi abusada ao longo de toda a audição, aproveitaram-se dela, a reputação dela foi atacada.”

Não é a primeira vez que Joe Biden lamenta a forma como Anita Hill foi tratada pela Comissão de Justiça do Senado em 1991, e na terça-feira disse que pediu “desculpas públicas” à advogada. Mas não é certo que o tenha feito pessoalmente – algo que Anita Hill espera há anos.

“Nós sabíamos muito menos sobre a dimensão do assédio naquela época, há mais de 30 anos”, disse Biden. “É uma cultura britânica de jurisprudência, uma cultura do homem branco. Isso tem de mudar.”

"Deve desculpas ao país"

No ano passado, quando o juiz Brett Kavanaugh foi acusado de abusos sexuais pela professora Christine Blasey Ford, Anita Hill foi entrevistada sobre a sua experiência. E repetiu a crítica que tem feito a Joe Biden nas últimas décadas.

“Passou a ser uma espécie de anedota em nossa casa, sempre que a campainha toca sem que estejamos à espera de alguém”, disse Anita Hill numa entrevista à revista Elle, em Setembro de 2018. “Nós dizemos: ‘Oh, será que é o Joe Biden para pedir desculpas?’”

“Ele deve-nos a todos um pedido de desculpas”, disse a advogada ao jornal Boston Globe, também em Setembro. “Deve ao país um pedido de desculpas porque não me ofendeu só a mim. Foi um mau serviço para cada um de nós – não apenas em nome das vítimas de assédio sexual, mas também em nome das pessoas que acreditam na integridade do tribunal, que deve ser protegida pelo Senado, cujo papel é prestar aconselhamento sobre nomeações judiciais.”

As declarações de Joe Biden sobre o tema do assédio sexual surgem numa altura em que se espera um anúncio sobre o seu futuro político. Num ano em que a lista de candidatos do Partido Democrata às eleições primárias ultrapassa as três dezenas, o antigo senador lidera as sondagens à frente do senador Bernie Sanders (Vermont) e da senadora Kamala Harris (Califórnia), dois rostos conotados com o sector mais progressista.

Numa sondagem feita para a CNN, publicada na semana passada, Biden é o nome mais referido entre os eleitores do Partido Democrata quando se pergunta qual é o candidato mais forte contra Donald Trump.

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