Diário

A catástrofe de Moçambique descobriu repentinamente a miséria em que deixámos aquele lastimável país.

16 de Março

A SIC Notícias e os três canais congéneres, da RTP 3 à CMTV, estão às portas da morte. Todo o fim-de-semana só têm “futebol falado”. O que é simples: basta juntar, três a três, os 15 maiores fanáticos de Portugal à volta de uma mesa, de sábado à tarde a domingo à noite. Para meu espanto, a subtileza da argumentação e a força retórica não ficariam mal a qualquer parlamento, e são muito superiores às da nossa representação nacional. O único verdadeiro demagogo que o 25 de Abril produziu chama-se Pedro Proença (o da TVI 24).

17 de Março

O que julga ela que está a fazer? O que julga ela que está a fazer, quando aceita ir a um programa da “noite lisboeta” tão deprimente como o Cabaré da Coxa? O que julga ela que está a fazer, quando aceita que lhe chamem milf (para quem não saiba, e ela declarou toda contente que sabia, milf significa o seguinte: mother I’d like to fuck) e ouve, com toda a tranquilidade, os piores palavrões da língua? O que julga ela que está a fazer, quando depois de uma entrevista pró-forma a obrigam a engolir uma arenga de Pedro Abrunhosa sobre o populismo e, a seguir, a ignoram até ao fim do programa?

Não consigo perceber esta mulher, dando de barato que tem uma inteligência média. O CDS não pode e não deve procurar na liberdade de costumes uma respeitabilidade de “esquerda” de que não precisa e que só o pode prejudicar. Assunção Cristas e a sua incompreensível direcção tentaram ser “modernos” e vão acabar tristemente sem os votos do PSD com que contavam. Nenhum partido pode encarnar a modernidade, porque todos existem no tempo. O que Assunção Cristas, de facto, fez hoje foi degradar a sua condição política e com ela, também, a condição dos políticos.

18 de Março

Pedro Nuno Santos veio esclarecer quando tinha conhecido e se tinha apaixonado por Catarina Gamboa, a sua presente mulher. A causa desse esclarecimento foi a nomeação dela para chefe de gabinete de Duarte Cordeiro. Aparentemente, não ocorreu a Pedro Nuno Santos que essa atitude era um gesto de autoridade política e marital. Catarina Gamboa é adulta e não precisa que ninguém fale por ela. Não perceber isto é, pelo menos, ofensivo; e poupo outras considerações.

Quem se devia ter explicado, se alguém, era Duarte Cordeiro. Afinal, foi ele que a contratou.

19 de Março

Para um português da minha idade, ver pela televisão a catástrofe de Moçambique é um peso na consciência. Aos 15 anos, já me entusiasmava com a vitória do general Giáp em Dien Bien Phu. Depois veio a Argélia e estive de alma e coração com a Frente de Libertação Nacional e contra os generais franceses. Assisti, entretanto, com alegria, à descolonização inglesa, suave e a favor dos “ventos da história” de Macmillan. A seguir, os oito anos da guerra do Vietname acabaram por absorver a atenção política de quase toda a gente. No fim, veio Portugal e a rendição do 25 de Abril. Nada disto me perturbou. Pior: aprovei sem hesitar tudo o que se fez. No que não me desviei nem de Soares, nem de Sá Carneiro, que, como toda a classe média da metrópole, só se queriam ver livres das colónias e dentro do Mercado Comum. O império da imaginação de Salazar e de alguma direita portuguesa não existia.

A catástrofe de Moçambique, que, dizem, não foi tão grave como a de 2000, descobriu repentinamente a miséria em que deixámos aquele lastimável país. Mas descobriu também a irresponsabilidade histórica da minha geração. Seguimos a nossa vida sem nos preocupar com o que ficava para trás: guerras civis, matanças tribais, ditaduras, cleptocracias, e a ausência das condições mínimas para uma sociedade viável. Agora, mandamos socorros, como novos-ricos que somos.

21 de Março

Joana Marques Vidal declarou publicamente que não percebia a necessidade de uma Polícia Judiciária Militar. Os portugueses compreendem cada vez menos o que é um soldado. Mas Joana Marques Vidal devia saber que nenhuma polícia civil pode prender um militar. E parece que não sabe. A ideia das Forças Armadas como o último árbitro do poder político e, portanto, acima de qualquer outro, nunca lhe ocorreu. Talvez fosse muito nova durante o PREC ou não tenha percebido o que se passa na Venezuela.

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