Isto de comer morangos todo o ano alcança dois objectivos essenciais: leva as pessoas a esquecerem-se da época dos morangos e leva-as também a esquecerem-se do sabor dos morangos da época.

Com esses dois esquecimentos qualquer pessoa está preparada para comer morangos de Janeiro a Dezembro.

Uma prova dessa amnésia é encontrar o morango publicamente apresentado como fruta do Inverno – mas não do Verão! Quantos virão do célebre mar de plástico de Almería? Como dizia o título da grande reportagem de Carlos Dias aqui no PÚBLICO: “Odemira já mal respira sob o plástico das estufas”.

Pensamos vagamente que os morangos fora de época são obrigatoriamente de estufa – “porque tem de ser, não é?”, essa aziaga mas útil pergunta sob a qual conseguimos esconder o tamanho da nossa ignorância. Porque será que o morango é número um na lista Dirty Dozen das frutas com mais pesticidas do Environmental Working Group?  

E os morangos hidropónicos que se produzem em Portugal e em todo o mundo? Esses nem precisam de solo, só de água açucarada e de pesticidas. Qualquer dia também não precisam de sol – podem ser cultivados em armazéns com luz eléctrica. Aposto que esses são mesmo saborosos e bons para a saúde.

É triste não poder conversar sobre o sabor dos morangos com pessoas que nunca tiveram a oportunidade de comer um morango como deve ser, no tempo dele, “quando se torna uma praga”, como diz um amigo meu.

É triste que a cor e o sabor sejam manipulados até ser só água e açúcar. Isso não são morangos? Agora já são.