Manifestação junta milhares em Lisboa: “Igualdade não está cumprida, é para isso que lutamos"

Manifestação assinalou o Dia Internacional da Mulher, que se celebrou na sexta-feira. Jerónimo de Sousa salientou o papel “decisivo e determinante” das mulheres no acesso aos seus direitos.

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LUSA/ANTóNIO PEDRO SANTOS
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Milhares de pessoas responderam ao apelo do Movimento Democrático de Mulheres (MDM) e desfilaram neste sábado,  em Lisboa, para celebrar os direitos das mulheres sob o lema “Igualdade na vida. O combate do nosso tempo”.

Perto das 14h30, na Praça dos Restauradores, já se concentravam centenas de pessoas, homens e mulheres de todas as idades, muitos acabados de descer das camionetas que os transportaram de diversas regiões do país, de norte azul. “Prostituição não é trabalho, é violência contra as mulheres”, lia-se num cartaz erguido por uma manifestante.

Ao lado, mulheres com trajes agrícolas do Alentejo afinavam as vozes à capela, enquanto os Karma Drums, perfilados e com igual número de jovens rapazes e raparigas, iniciavam o seu batuque para o início de desfile, que após percorrer a Rua do Ouro e a Praça do Comércio terminou na Ribeira da Naus com as tradicionais declarações finais.

“O significado desta manifestação é de comemorar o 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, homenageando as mulheres que lutaram e ergueram de facto a democracia, a liberdade, o voto. Mas também para reivindicarmos e mostramos quanto a igualdade na vida ainda não está cumprida, e é para isso que lutamos. Pela igualdade na vida, pela igualdade no trabalho, contra as discriminações salariais, e também contra a violência doméstica”, disse Regina Marques, do secretariado nacional do MDM e uma das organizadoras da manifestação onde terão participado cerca de 10 mil pessoas, à Lusa.

"Muitas violências"

Lutamos por medidas que correspondem às ansiedades e às questões que se colocam, e são muitas”, prosseguiu. “Mas também estamos aqui porque queremos denunciar muitas violências que se exercem sobre as mulheres, muitas discriminações, desigualdades, e é por isso que a manifestação tem sentido.”

No terceiro ano em que o MDM organiza uma manifestação nacional, a responsável deste movimento, que mantém afinidades com o PCP, evocou ainda “as vozes e as inquietações das mulheres de todo o país que temos aqui, das agricultoras às estudantes, intelectuais, professoras, às mulheres dos serviços, e estamos aqui para dizer que queremos independência económica, as mulheres têm direito à independência económica para se libertarem das violências, dos maus tratos, e exercerem os seus direitos”.

Simão, 18 anos, estudante no liceu Camões, segurava uma faixa junto a rapazes e raparigas da sua idade com a mensagem: “Juventude, Igualdade, na Escola, no Trabalho, na Vida.”

“Estou aqui porque hoje em dia é mais importante do que nunca lutarmos pela igualdade na vida, é um combate do nosso tempo. Cada vez mais é necessário, não só as mulheres mas também os homens, lutarmos pelos direitos dos trabalhadores, do nosso povo, inclusive das mulheres, para nos conseguirmos emancipar e tornar a nossa sociedade numa sociedade melhor”, explicava. E insistia em assinalar uma “clara diferença” que detecta na sua geração. “A minha geração é muito mais respeitadora, muito mais consciencializada para a igualdade de género, o problema é que muitas vezes estamos consciencializados de uma forma não muito correcta, o que leva por um lado a termos um discurso que à partida parece promover a igualdade de género mas que depois em funções práticas não representa a igualdade de género, nomeadamente no trabalho e noutras situações, com na escola, etc.”

“Vim aqui para lutar pelos nossos direitos, dos escândalos que se ouve na televisão, da violência doméstica sobre as mulheres, temos de lutar contra tudo isso. São coisas que não deviam existir no nosso país. Não é lógico, temos de arranjar meios para que isso acabe. Vimos de longe, de Riba de Ave, Famalicão, para lutar por isso”, assinalava uma participante, ao lado do marido.

Balões brancos foram erguidos por um grupo de manifestantes. Turistas sorriam à passagem do cortejo. Pelas ruas também se escutaram reivindicações por uma agricultura de qualidade e por serviços públicos de qualidade. E Mário Nogueira, da Federação Nacional de Professores, exibia o crachá da luta central dos desta federação: 9 anos, 4 meses, 2 dias de recuperação do tempo de serviço docente que esteve congelado.

Muito de Abril por cumprir

O desfile foi engrossando quando chegou ao Rossio e seguiu pela Rua do Ouro, onde no passeio, em locais distintos, o secretário-geral da PCP, Jerónimo de Sousa, e o líder da CGTP, Arménio Carlos, aguardavam a passagem da manifestação e se preparavam para declarações aos meios de comunicação social.

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, declarou que o papel das mulheres no acesso aos seus direitos vai ser “decisivo e determinante”, numa luta que se encontra muito actual. “Aqui há, de facto, a luta comum a travar em torno desta questão das desigualdades e, por isso, saúdo esta manifestação, tendo em conta os objectivos que defende, tendo em conta que isto é uma luta do nosso tempo.” O líder do partido considerou que esta luta foi importante no passado, “continua a ser no presente”, e que “ainda falta muito para andar para conseguir esse objectivo da igualdade perante a lei e perante a vida”.

Mostrou-se ainda convicto de que o legislador não vai “tomar a iniciativa própria por sua autoria”, e que “aqui quem vai ter um papel decisivo serão as mulheres e a sua luta, porque ninguém dá nada a ninguém nesta matéria”. Para acrescentar de seguida: “Acho que deve haver também aqui uma responsabilização dos homens numa procura de convergência em relação a questões que estão detectadas, que estão identificadas.”

Apontando que desde a revolução de 25 de Abril de 1974, há 45 anos, “houve avanços significativos”, salientou que “continua por cumprir muito daquilo que Abril referia e pretendia em relação às mulheres”. E assinalou que o grupo parlamentar do PCP entregou na sexta-feira, na Assembleia da República, “um projecto de lei sobre a questão da violência doméstica”.

“Precisa de facto de haver correcções, precisões e até avanços”, salientou, acrescentando que “isto não invalida nem substitui a luta das mulheres pela sua própria emancipação, por um estatuto digno em relação à lei e à vida, particularmente no trabalho”.

Questionado ainda se será uma mulher a próxima pessoa à frente dos destinos do partido, o secretário-geral disse que essa é uma “questão que não está colocada neste momento”.

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