O velho Inácio encontrou o seu ponto G

Os clássicos da cozinha tradicional mantêm-se como referência neste restaurante de Braga e são fonte de satisfação e prazer gastronómico. Em ambiente renovado, com pormenores cuidados, conforto e serviço.

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Inês Fernandes
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Já perto de se tornar centenário, o restaurante Inácio, em Braga, ganhou uma segunda vida. Um novo fôlego que, mais do que preservar a rica história da casa, a potencia e projecta para um contexto contemporâneo, com pormenores cuidados, conforto e serviço.

O nome tem agora mais uma letra. Um “gê” que lhe acentua o gosto pela cozinha tradicional e pelo rico receituário local, e com isso Paula Peliteiro parece ter encontrado também o ponto G para um dos históricos restaurantes da cidade dos arcebispos. Chama-se agora Ignácio, mas os pratos de sempre, como as papas de sarrabulho, o bacalhau à moda de Braga, os rojões ou o cabrito assado no forno aos domingos mantêm-se como referência e principal fonte de satisfação e prazer gastronómico.  

Com o interior retocado e de cara lavada para um ambiente de maior conforto, as duas salas do Ignácio transmitem agora uma sensação de maior aconchego, com mesas impecavelmente compostas com toalhas de algodão branco, guardanapos, serviço de copos e baixela a condizer. Um serviço focado no cliente, atento e dinâmico, completa o quadro de regeneração que tira todo o proveito de um espaço com história e reputação na restauração bracarense.

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A par do rigoroso compromisso com as receitas de sempre, Paula Peliteiro quis também juntar na carta alguns apontamentos da cozinha fresca e aromática que lhe deu fama com o Sra. Peliteiro, que se mantém em Esposende.  Os peixes frescos, cocktail com gambas, uma caldeirada ou o ossobuco com pasta fresca são disso exemplo. Mesmo nas propostas tradicionais, também as “papas de sarrabulho da minha avó” reforçam a oferta das “papas à moda de Braga”, que são servidas com os rojões.

São à volta de uma dezena as sugestões de “Entradas”. Além do aveludado creme de legumes (3€), provaram-se os bolinhos de bacalhau (9€/6 unidades), o cocktail de gambas com abacate (9,50€) e as papas de sarrabulho (4€).  Com farinha de milho, carnes esfiadas, espessas e consistentes, e marcada presença do sarrabulho, as saborosas papas da minha avó respeitam integralmente a receita tradicional minhota. Também assim as crocantes bolinhas de bacalhau, enxutas e sápidas, mesmo com presença de salsa e cebola em dose minimalista.

Muito interessante ainda o cocktail de gambas com abacate, em porção generosa, com leve toque de picante e envolvência de salada fresca. O caldo verde, pataniscas de bacalhau, lascas de Ibérico, duas saladas e amêijoas à Bulhão Pato completam as propostas entradeiras.

Nos pescados, dominam o bacalhau e o polvo, com a “pescada à poveira” (14,50€), “arroz de tamboril com gambas” (17,50€) ou o “peixe da lota escalado no forno” como boas alternativas. O polvo, assado no forno, é servido com batatas recheadas, enquanto o bacalhau se oferece em lombo à lagareiro ou na tradicional posta à moda de Braga.

O “bacalhau do Inácio” (32€), em posta completa que se alonga aí por dois palmos, pode saciar bem à vontade três ou quatro. A par das dimensões generosas, impressiona também pela qualidade da fritura, homogénea e a fazer com que as lascas deslizem sobre as gelatinas. É servida em longa travessa – doutra forme não caberia – sobre cama de gulosas batatas às rodelas impecavelmente fritas e escorridas.

Por cima, a cama de cebola com toque avinagrado que compõe o quadro de sabor e cobiça, com o cuidado de não haver excesso de molho a empapar as batatas. Domina, por isso, a crocância, tanto do bacalhau como das batatas, em perfeita harmonia com a cebolada. Como complemento de frescura, é servida também uma tigelinha com tomate em brunesa e cebola roxa e equilibrada vinagreta.

Provou-se também a “caldeirada de bivalves com filete de peixe de lota” (18,50€). Lombo de dourada, no caso, de fritura impecável a preservar a suculência do peixe. Na caldeirada, saboroso e espesso creme com tomate, pimento e cebola a envolver mexilhões e amêijoas a contrastar com a frescura e suculência da dourada.

Nas carnes, o desfile propõe assado de pernil de porco fumado, perna de porco confitada, ossobuco com pasta fresca ou o costeletão de vitela grelhado. O cabrito assado no forno é uma especialidade domingueira, mas os rojões com papas à moda de Braga são servidos todos os dias.

Provaram-se os rojões, em dose mais que generosa (28€/2 pessoas) e em criteriosa interpretação da receita tradicional. A começar pelas carnes, entremeadas e confitadas na própria gordura, com todos os complementos da tradição, e de execução culinária igualmente criteriosa. Sarrabulho, farinhote, fígado, bucho e a saborosas tripinhas enfarinhadas crocantes e estaladiças. Tudo na perfeição e na companhia de castanhas, cubinhos de batata fritos e grelos salteados.

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Nas sobremesas não faltam, claro, o pudim abade de Priscos (5,50€) e toucinho do céu (5,50€), numa lista que é verdadeiramente pecaminosa e inclui ainda coisas como leite-creme, pão-de-ló e cornucópias conventuais.

Cuidada e criteriosa é também a carta de vinhos, com boas e sensatas propostas para a generalidade das regiões, com natural destaque para os Verdes, mas também Douro e Alentejo.

Herdeiro de longa e reputada tradição, bem se recomenda este Inácio renascido pelas mãos de Paula Peliteiro depois de um período de navegação à vista na turbulência da sucessão familiar. Uma evolução que lhe acrescenta uma letra, que significa gosto gastronómico mas também critério e modernidade que bem podem ser o ponto G para a satisfação e prazer à mesa do Ignácio.

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