RTP com acesso preferencial a jogos das selecções em troca de conteúdos para canal da federação

Memorando entre a estação pública e a FFP prevê a cedência de 52 jogos do arquivo da RTP e futuros conteúdos que a TV pública tenha de competições internacionais. E também estúdios no Porto, meios humanos e técnicos.

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A RTP vai ter um privilégio preferencial de acesso aos direitos de transmissão dos jogos das selecções nacionais de futebol que a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) colocar à venda. Este primeiro lugar na grelha de partida em relação aos canais privados (SIC, TVI e SportTV) é uma das contrapartidas para a estação pública previstas no memorando que a estação pública e a FPF assinaram a 9 de Janeiro deste ano e que se destina a conseguir conteúdos para o futuro canal da federação, cujo lançamento está previsto para meados de Maio.

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A RTP vai ter um privilégio preferencial de acesso aos direitos de transmissão dos jogos das selecções nacionais de futebol que a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) colocar à venda. Este primeiro lugar na grelha de partida em relação aos canais privados (SIC, TVI e SportTV) é uma das contrapartidas para a estação pública previstas no memorando que a estação pública e a FPF assinaram a 9 de Janeiro deste ano e que se destina a conseguir conteúdos para o futuro canal da federação, cujo lançamento está previsto para meados de Maio.

Nesse documento a que o PÚBLICO teve acesso, a RTP e a Federação elencam as áreas em que vão colaborar durante quatro anos, nomeadamente na partilha de recursos, meios técnicos e humanos, arquivos e direitos de programas. A televisão pública praticamente abre as portas das instalações e do arquivo ao canal 11 (nas plataformas de TV paga) e o assunto está a provocar críticas nas estruturas da RTP.

Em contrapartida, a RTP “terá direito de primeira escolha, para operadores free to air [de sinal aberto], nos conteúdos em directo da FPF, nomeadamente jogos das competições que organiza”, lê-se numa cláusula do documento. A que se junta o igual direito em conteúdos exclusivos de bastidores das selecções, e ainda a possibilidade de transmitir nos canais RTP África e Internacional conteúdos originais da federação.

O acordo prevê também que a RTP facultará à FPF o uso das instalações do Centro de Produção do Norte para a instalação do canal de desporto que a Federação prevê lançar em meados de Maio e cujo projecto está a ser coordenado por Nuno Santos, antigo director da RTP e da SIC, com a ajuda do jornalista Carlos Daniel, que deixou a RTP no final do Verão – mas depois soube-se que se trata apenas de uma licença sem vencimento. Para além das instalações, o documento prevê também a cedência de trabalhadores do quadro de pessoal da RTP “mediante o enquadramento legal adequado em condições a acordar e a formalizar” para o projecto do canal 11.

O PÚBLICO questionou a administração da RTP e o Conselho Geral Independente sobre o conteúdo do memorando, mas os dois órgãos recusaram-se a fazer comentários, tendo também tentado contactar Nuno Santos, sem sucesso. Muitos pontos do memorando vincam que serão feitos acordos para formalizar os termos e condições (sobretudo as financeiras) em que as cedências mútuas irão ocorrer. E terá sido esse compromisso de colocar por escrito no futuro questões que agora são muito genéricas, e ainda a ideia de que haverá realmente reciprocidade, que levou o Conselho Geral Independente, que fiscaliza a gestão da administração, a não levantar problemas ao memorando.

Cem horas de imagens do arquivo da RTP

Tanto a cedência das instalações no Porto (que não está ainda prevista se e quando acontecerá) como de trabalhadores não será, no entanto, gratuita. A FPF deverá pagar por ambas em moldes a acordar, como fazia, por exemplo, a SportTV quando esteve no MediaParque, ou como fazem actualmente tanto a RTP como as outras televisões privadas quando contratam entre si meios para cobrir algum evento.

No Verão, o jornalista Carlos Daniel anunciou que ia sair da RTP e integrar o projecto do canal 11, mas o processo de negociação para a sua saída foi tão longo que acabou por se transformar numa licença sem vencimento. E hoje, com este protocolo, o seu caso pode facilmente encaixar-se num destes casos de cedência de meios humanos da RTP à FPF.

Para além das instalações e dos trabalhadores, o acordo pressupõe o acesso recíproco da RTP e da FPF aos respectivos arquivos. Mas se para a FPF se especifica que esta terá acesso a cem horas de imagens do arquivo da RTP para uso em programas do canal 11, e até 52 jogos integrais cedidos pela RTP para “emissões especiais e temáticas” daquele canal, para a estação pública não são especificados os tempos. O PÚBLICO apurou que há dezenas de jogos das selecções nacionais de futebol de diversos escalões nos arquivos da RTP mas cujos direitos de transmissão pertencem em exclusivo à federação. O acesso da FPF aos restantes conteúdos do arquivo da RTP será pago.

Outro activo da RTP cobiçado pelo canal 11 são os direitos sobre competições internacionais da FIFA e da UEFA que a TV pública tem ao abrigo da União Europeia de Radiodifusão e que não é obrigada a transmitir (normalmente só tem que o fazer quando se trata de meias-finais e finais). Por exemplo, jogos do Campeonato do Mundo de futebol feminino. A FPF pagará à RTP o custo destes jogos.

O memorando está a ser alvo de contestação interna na RTP por parte da comissão de trabalhadores (CT), que só conseguiu acesso ao documento nesta semana depois de o ter pedido ao Ministério da Cultura, que tutela o serviço público de rádio e TV. A CT tinha pedido o memorando à administração, que lho recusou, alegando confidencialidade. Em comunicado divulgado na terça-feira, a CT afirma que devido à “gravidade do que consta no documento”, pediu “esclarecimentos adicionais” ao ministério e à ERC - que pretende que sejam emitidos pareceres para sustentar uma reclamação contra a equipa de Gonçalo Reis.