I’m a firestarter!

Keith Flint foi o grito de uma geração, a nossa, estávamos em 1997 e ensurdecíamos pais e mães enquanto a aparelhagem explodia de encontro às janelas e dezenas de adolescentes saltavam como loucos dentro da sala.

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Reuters/Alessia Pierdomenico

Firestarter não é a só das músicas mais conhecidas dos Prodigy, é também o termo que melhor define Keith Flint, a sua vida, o seu percurso, a sua marca, a sua revolução, a nossa revolução. Keith Flint foi o grito de uma geração, a nossa, estávamos em 1997 e ensurdecíamos pais e mães enquanto a aparelhagem explodia de encontro às janelas e dezenas de adolescentes saltavam como loucos dentro da sala.

Não queríamos saber. Naquele momento, naqueles segundos, nós éramos os firestarters, os incendiários, e por aqui, sem sequer desenvolver a letra, se percebe a energia de quem se prepara para dar um pontapé numa vida que não era a nossa. Queríamos mais, queríamos um futuro e já sabíamos não o ter, tínhamos medo, não tínhamos dinheiro e a esperança era pouca. Mas tínhamos a música, e os Prodigy. E Keith Flint a falar por nós. O mundo que se acautelasse, ainda não havíamos dito a última palavra. Na verdade, ainda mal começáramos a dizer tudo o que havia por dizer em 19 anos de vida. 

Keith Flint nunca foi consensual. A ele também de pouco lhe interessava. Interessava-lhe a música, as motos (sim, Keith era um motard), a liberdade, o descomprometimento, dançar, saltar, gritar, deitar tudo cá para fora no sotaque inglês de quem nasceu e cresceu no leste de Londres onde tudo é seco e tudo é duro, o pai é duro, as paredes e as ruas escuras, as fábricas abandonadas, as escolas abandonadas mas cheias de crianças e professores abandonados à sua sorte diante de milhares de meninos perdidos, como nós em 1997, igualmente sem futuro nem esperança.

Firestarter surge assim como um soco no estômago de quem deu a Keith Flint outros tantos entre a infância e a adolescência. É um rasgo de génio pela simplicidade da emoção em apenas 14 versos. E em apenas 14 versos se conta a história de uma geração. Não queríamos que fosse assim, não pedimos para ser assim, mas foi assim que aconteceu entre pais separados, mães agredidas e insultadas, a vontade de nunca voltar a casa depois da escola, a vida nas ruas, a vida à noite, os vizinhos à perna e as queixas em casa, os castigos, quem quer saber dos castigos, mas os castigos à mesma, não podemos sair de casa mas saímos à mesma, os pais do Luís puseram-no fora de casa mas o Luís saiu antes que o pudessem fazer.

Felizmente tínhamos a música e a sorte de Keith Flint para podermos deitar tudo cá para fora. E deitámos, até o sol nascer, muitas vezes. E assim, através da música e das letras, não consensuais, Keith Flint salvou uma geração. Só o Keith é que não se salvou

Obrigado por tudo, Keith, vais fazer muita falta, já fazes. 

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