Reino Unido é agora o melhor parceiro de trocas comerciais com Portugal

Em 2018, ano em que o défice comercial de bens se agravou, o mercado britânico voltou a liderar o ranking dos países com os quais Portugal tem maior excedente: 1775 milhões de euros. No extremo oposto está Espanha. Serviços ajudaram as contas finais, mas não evitaram que a balança corrente voltasse a gerar um défice.

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No top 10 dos países com os quais Portugal tem maior défice só dois contrariaram a tendência de agravamento: Itália e Rússia Paulo Pimenta

No ano passado, período em que o défice da balança de bens atingiu os 17.130 milhões (agravou-se 2670 milhões face ao ano anterior), o Reino Unido voltou a liderar o ranking dos países com os quais Portugal tem maior excedente comercial.

Em 2017, o mercado britânico estava no terceiro lugar desta tabela, depois de a ter dominado no ano anterior. Agora, e num clima de incerteza face ao “Brexit” e às implicações que tal terá nas contas com Portugal, passou o ser o mercado com o qual o saldo na troca de produtos é o mais positivo, superando os EUA e a França (com os quais tem disputado o primeiro lugar): ao todo, o excedente foi de 1775 milhões de euros, ligeiramente abaixo (menos 0,3%) do valor registado em 2017.

Já a França e os EUA viram o excedente deteriorar-se em 9,6% (para 1611 milhões) e 19,1% (para 1495 milhões), respectivamente. Para se ter uma noção das assimetrias, o maior défice comercial de Portugal é com Espanha, tendo atingido os 8935 milhões de euros no ano passado (mais 4%).

O cálculo dos maiores excedentes e défices comerciais na troca de bens de Portugal com o exterior em 2018 faz parte de uma análise às contas do país feita por Eric Dor, director do departamento de estudos económicos da IESEG, escola de gestão francesa.

Impulso dos serviços

Na análise, Dor sublinha que o crescimento do excedente nos serviços, impulsionado pelo turismo, ajudou a diminuir os impactos negativos nos bens. De acordo com os dados publicados pelo Banco de Portugal na semana passada, a balança comercial (bens e serviços) manteve-se positiva em 2000 milhões, não obstante a redução de cerca de 40% (1500 milhões) face a 2017.

No caso de Espanha, as exportações dos serviços ajudaram a descer o défice da balança comercial (a factura final acabou por ficar abaixo dos oito mil milhões). Já em relação ao Reino Unido e a França os excedentes foram reforçados para mais de cinco mil milhões, com o primeiro a liderar no saldo das viagens e turismo e o segundo no cômputo geral. 

Balança corrente volta a negativo

Apesar do impulso dos serviços, nota este académico francês, o saldo da balança corrente, incluindo aqui a componente de rendimentos - que sofreu também um pequeno agravamento em 2018 -, voltou a ser ligeiramente negativo, depois de cinco anos em terreno positivo.

De acordo com os dados do banco central, este saldo foi de -1230 milhões em 2018 (cerca de 0,6% do PIB), mais 2109 milhões face ao ano anterior. Para Eric Dor, a entrada em terreno negativo é “preocupante” porque um défice na conta corrente faz subir a dívida global do país perante o resto do mundo.

O passado, acrescenta, já demonstrou que os países com uma combinação de elevada dívida pública e elevadas dívidas perante o exterior ficam demasiados expostos ao risco no caso de uma crise de dívida soberana, devido à dependência de financiamento externo.

Em termos globais, juntando a balança corrente e a de capital, o saldo recuou face a 2017 mas acabou por fechar o ano de 2018 em terreno positivo: 0,4% do PIB, equivalente a 900 milhões de euros.

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Aumentar

Factura a subir

Na análise que fez, Dor tentou perceber o que é que provocou a subida das importações de bens nos anos de 2017 e de 2018, em termos nominais (e cujo ritmo superou o das exportações). Feitas as contas, chegou à conclusão de que a deterioração da balança de bens deveu-se fundamentalmente a três grandes grupos de produtos: combustíveis minerais (cuja factura subiu 1838 milhões no período em análise), maquinaria e equipamento de transporte (1576 milhões) e produtos químicos (1168 milhões).

Nos dois primeiros casos, segundo calculou com bases em dados do Eurostat, a subida da despesa está relacionada com o aumento do valor (o preço do barril do petróleo subiu após ter estado em valores historicamente baixos), enquanto no segundo caso houve mesmo uma subida do volume de compras.

Uma análise do departamento de estudos económicos do BPI às contas da balança corrente e de capital de 2018 divulgada esta semana dá também nota de factores extraordinários que afectaram as vendas ao exterior de duas das maiores exportadoras nesse ano: as paragens programadas nas refinarias da Galp (um dos seus grandes mercados são os EUA), e a paralisação dos estivadores no Porto de Setúbal, que bloqueou no final do ano a saída dos veículos da VW montados na Autoeuropa.

Neste último caso, diz o BPI, “a exportação de automóveis de passageiros, que representam cerca de 42% das exportações de material de transporte, caiu 8,5% nos dois últimos meses do ano”, em termos homólogos.

Por outro lado, nota que parte do agravamento na balança corrente “deve-se ao aumento de bens de investimento, o que se deverá traduzir em reforço da capacidade produtiva a médio prazo”. Assim, acrescenta, “esta deterioração não é tão preocupante quanto no passado”, quando “reflectia falta de competitividade da economia portuguesa”, realçando também a importância de o país “manter capacidade de financiamento face ao exterior”.

Realidades distintas

Olhando para o top 10 dos países com maior défice na balança de bens, verifica-se que houve uma tendência de agravamento apenas contrariada por dois mercados: Itália (que desceu 16%, para 1525 milhões) e Rússia (menos 22%, para 1093 milhões).

No caso da Rússia, a ideia de alívio parece fazer mais parte de um fenómeno de transferência da factura para outros países exportadores de produtos energéticos, já que foi o principal abastecedor de petróleo de Portugal em 2017. De resto, o maior agravamento na lista de dez países verificou-se no Cazaquistão, exportador de crude, com uma subida de 52% em termos homólogos (para 762 milhões), acompanhado de perto de Arábia Saudita, com mais 37,4% (para 617 milhões).

Aqui, merece também destaque a subida do défice comercial com a Alemanha e com a China, que ocupam a segunda e a terceira posição na tabela liderada a longa distância pela Espanha com os seus cerca de nove mil milhões (Espanha, com o seu factor de proximidade, é o mercado de que Portugal mais depende: comprou o equivalente a 14.676 milhões - 25% do total exportado pelas empresas nacionais -, e vendeu 23.611 milhões de euros).

No caso da Alemanha, a diferença face à maior economia do euro (e à qual, marcada por excedentes com o exterior, diversas entidades já têm pedido um maior esforço de políticas públicas que dinamizem o consumo interno) a subida foi de 15,4%, para 3749 milhões de euros.

Em relação à China, a subida da “fábrica do mundo” foi mais expressiva: 39,8%, para 1692 milhões de euros. Em Dezembro do ano passado, quando se realizou a visita oficial do presidente da China, Xi Jinping, a Portugal, foi assinado um memorando de entendimento. Nesse documento ficou estipulado que haveria um esforço para a promoção do comércio e do investimento “em condições equitativas”, com “normas e padrões internacionalmente acordados” e “regras de mercado e procedimentos de licenciamento céleres”.

No extremo oposto, o dos dez países com mais excedente na troca de bens, houve uma queda do valor nos nove primeiros, cabendo a excepção ao México: mais 13,6% para 159 milhões. De resto, a menor queda foi mesmo a do Reino Unido, que se situou assim no topo e ultrapassou os EUA e a França.

Já a maior descida foi a de Angola, com o excedente a tombar 61%, de 1508 para 586 milhões de euros, devido essencialmente à queda das exportações para este país africano.

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