Andreia desafia os “construtores dos próximos 50 anos” no Mês da Arquitectura da Maia

Depois de Guimarães 2012 e do centenário do Theatro Circo, Andreia Garcia faz o tempo avançar cem anos na Maia. Profetizar o futuro do concelho é um exercício de “pensar a cidade e a arquitectura”, que dura até ao fim de Março.

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Andreia Garcia Nelson Garrido

Desde o clima à economia, sem deixar de pensar na comunidade, Andreia Garcia não reflecte sobre a arquitectura sem antes conhecer o cenário local. O primeiro grande teste à arquitecta vimaranense foi em casa, em 2012, quando Guimarães foi Capital Europeia da Cultura. Agora prepara-se para fazer um Fast Forward ao concelho da Maia até daqui a cem anos. A segunda edição do Mês da Arquitectura da Maia acontece durante o mês de Março.

Parece faltar muito para o longínquo ano de 2119, mas para Andreia há um "descontrolo do tempo" que ameaça a consciência do impacto das acções do dia-a-dia. A arquitecta fala ao P3 de um tempo "que cada vez é mais volátil, mais rápido", quando urge prever as várias hipóteses, de forma a controlar os possíveis cenários do futuro. "A capacidade de antecipação é o busílis desta exposição."

Andreia, de 33 anos, lançou um "desafio maior" ao "sangue novo" da arquitectura portuguesa. Os "construtores dos próximos 50 anos" — arquitectos, ateliers e especialistas — foram convidados a profetizar a paisagem arquitectónica do concelho da Maia daqui a cem anos, com base em questões como a comunidade, o ambiente ou a mobilidade. No Fórum Maia, as gasolineiras passarão a ser monumentos, as fábricas e lojas serão ruínas com história e a cidade deixará de estar dividida pela estrada nacional 14, transformada em túnel.

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Nelson Garrido

"Ando sempre nesta lógica de pensar a cidade, pensar a arquitectura e pensar no futuro", confessa Andreia. Este hábito não é recente, mas sim uma das conclusões da experiência do projecto Smaller Cities. Entre 2011 e 2012, a arquitecta vimaranense teve a oportunidade de trabalhar na coordenação de um dos programas da Capital Europeia da Cultura. O objectivo era estudar a criação de espaços e de outras actividades de acordo com a "identidade e escala" da cidade. Graças ao "trabalho intenso" com a comunidade local, várias das iniciativas pensadas continuam a ser realizadas nos dias de hoje e outras já existentes, como o festival Noc Noc, ganharam ainda mais força.

A colaboração com a Smaller Cities aconteceu durante a tese de doutoramento que estava a desenvolver na Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa. A investigação sobre a importância da cenografia no trabalho arquitectónico "abriu uma janela" para vários convites, entre os quais as celebrações do centenário do Theatro Circo de Braga, em 2015 — de onde saiu o livro O Theatro e a Memória —, e agora a curadoria do Mês da Arquitectura da Maia.

A exposição Fast Forward ("Avanço Rápido", em tradução livre) vai desde o desenho mais simples à instalação mais complexa, passando ainda pela realidade virtual. As soluções apresentadas — "umas mais catastróficas, outras menos" — são um sinal da mudança dos tempos. Andreia exemplifica: "Se falarmos do hyperloop [transporte de alta velocidade em tubos de ar comprimido], o que será feito das nossas auto-estradas?"

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A arquitecta tenta "provocar" a população através da selecção de trabalhos "mais descomprometidos com as estandardizações do processo arquitectónico". Além da exposição, os debates no cinema Venepor, a 8 de Março, querem proporcionar uma maior valorização do "discurso directo". "Há esta vontade de ir ao encontro das pessoas e de semear algumas ou todas das questões que vão ser levantadas", revela Andreia.

Enquanto arquitecta, curadora e professora nas universidades do Minho e da Beira Interior, tem uma "obrigação" em contribuir para o "conhecimento em arquitectura e em cidade". A propósito dessa mesma vontade, fundou, com Diogo Aguiar, a Galeria de Arquitectura no Porto, em 2016. E foi aí que decidiu começar a projectar.

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O Andreia Garcia Architectural Affairs, criado em 2008, conta com uma equipa de portugueses, espanhóis e italianos. Uma vantagem para o atelier: "Essa dimensão internacional ajuda-nos a reflectir outros territórios, outras pessoas e outras identidades, que nos trazem outras referências." Com obras em Guimarães, Braga ou Porto, Andreia descarta ficar com a totalidade dos créditos: "Esta lógica de partilha, de interdisciplinaridade, pode, em qualquer projecto e momento, enriquecer o resultado."

A segunda edição do Mês da Arquitectura da Maia arranca esta sexta-feira, 1 de Março, pelas 21h30, no Fórum Maia. Os debates e a exposição são de acesso gratuito. A galeria abre de terça-feira a domingo e apresenta obras de oito ateliers — Ana Aragão, Artéria, Branco del Rio, Corpo Atelier, Fala, Os Espacialistas, Skrei e Summary — e quatro teóricos — Inês Moreira, Joaquim Moreno, Pedro Bandeira e Susana Ventura.

Até 31 de Março, a arquitectura esquece a complexidade de plantas e cálculos para se abrir a todos: Andreia não quer “arquitectos a falar para arquitectos”. 

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