Depois de chuva de críticas, a Decathlon não vai vender o hijab em França

A cadeia francesa de lojas estava prestes a lançar um hijab desportivo em algumas dezenas de países.

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A Decathlon tinha anunciado que iria começar a vender um hijab desportivo em França, mas voltou atrás na decisão, no seguimento de uma onda de críticas, inclusive de políticos. A peça em questão já estava à venda em Marrocos e iria passar a ficar disponível em 49 outros países a partir de Março.

A marca francesa terá recebido mais de 500 chamadas e emails de queixa. “As nossas equipas das lojas foram insultadas e ameaçadas, às vezes fisicamente”, comunicou a marca no Instagram. “Face à polémica violenta e às ameaças (...), nossa prioridade é encontrar uma situação de paz”, anuciou ainda.

No coro das críticas estavam figuras políticas como Agnès Buzyn, ministra da Saúde francesa. “É uma visão das mulheres que eu não partilho. Preferia que uma marca francesa não promovesse o lenço para a cabeça”, comentou, citada pelo Guardian.

Aurore Bergé, política do mesmo partido de Emmanuel Macron, pronunciou-se no Twitter. “O desporto emancipa. Não submete. A minha escolha enquanto mulher e cidadã será não confiar mais numa marca que rompa com os nossos valores. Aqueles que toleram mulheres no espaço público somente quando se escondem não são amantes da liberdade", escreveu. A marca respondeu, afirmando que o seu objectivo é “democratizar a prática do desporto” e que “algumas mulheres correm com um hijab, muitas vezes pouco adequado”.

A Decathlon não seria a primeira grande marca desportiva a responder às necessidades das mulheres muçulmanas. A Nike, por exemplo, anunciou em 2017 o lançamento de um hijab para atletas. Aliás, nos grandes eventos desportivos tem sido crescente o número de mulheres muçulmanas que o usam. Nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro a imagem das jogadoras de voleibol Doaa Elghobashy e Nada Meawad (do Egípto e Austrália) tornou-se viral pelo contraste de vestuário — a primeira com apenas a cara visível e a segunda de biquíni.

Polémicas em França

O véu islâmico é um tema particularmente controverso em França. Desde 2011 que o uso da burqa ou niqab (ambos cobrem o corpo, mas o niqab deixa os olhos à vista) em público dá direito a multa — uma medida avançada pelo Governo de Nicolas Sarkozy. No dia em que a lei entrou em vigor, quatro mulheres foram detidas por usarem burqas.

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Reuters/ Lucy Nicholson

Em 2004, foi proibido o uso do véu islâmico nas escolas e por funcionárias de organismos públicos. Um dos principais argumentos prendia-se com o facto de a França ser um estado laico, devendo, por isso, manter um nível de neutralidade e evitar o uso de símbolos religiosos no sector público. Já os grupos de direitos civis têm acusado as entidades responsáveis de islamofobia, afirmando que estas decisões são uma resposta desmedida a atentados extremistas.

O burqini, um fato de banho que cobre o corpo inteiro deixando apenas visível o rosto, voltou a acender uma polémica em 2016, resultando na sua proibição em várias regiões de França, sobretudo na Côte d'Azur. Contudo, o Conselho de Estado francês acabou por anular essa proibição. “Os burqinis não são uma ameaça à ordem pública em Villeneuve-Loubet [uma das 30 regiões que tinha adoptado a medida]”, anunciou o Conselho de Estado, afirmando que a sua proibição é “claramente ilegal e viola as liberdades fundamentais”.

França não é o único país onde têm surgido este tipo de questões. A ÁustriaDinamarca e Bélgica aprovaram nos últimos anos leis para banir o uso do véu integral islâmico em espaços públicos.

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