Ciclovia na avenida central de Quarteira criticada pela população

Os moradores queixam-se que a pista destinada às bicicletas retirou espaço para os autocarros circularem com segurança. A autarquia admite alterar o projecto, em fase experimental.

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Rui Gaudencio

A criação de uma ciclopista na principal avenida de Quarteira levou à redução da largura da via e à obrigação de diminuir os limites de velocidade automóvel dos 50 km/h para 30 km/h. “Isto é que faz Lisboa, Paris ou Nova Iorque”, explicaram os técnicos. Os populares, contestatários, replicaram: “E isto aqui é Quarteira”. O projecto experimental — no valor de 904 mil euros, co-financiando pelo Fundo Ambiental — vai sofrer alterações para se ajustar às críticas e às realidades locais. O presidente da câmara, Vítor Aleixo, garantiu: “O projecto não está fechado”. 

Uma manifestação realizada na segunda-feira à noite, à hora em que decorriam dois jogos de futebol (Benfica/Chaves; Marítimo/Sporting), juntou mais de 250 pessoas, uma adesão maior do que o esperado. O Centro Autárquico de Quarteira, onde decorreu uma sessão de esclarecimento sobre o projecto, não chegou para receber todos os manifestantes. Cerca de uma centena de pessoas ficou na rua, mais para protestar do que para ouvir.

Lá dentro invocaram-se argumentos técnicos e políticos para justificar a obra, que foram de imediato abafados pelo ruído da assistência. Vítor Aleixo começou a sessão a tentar acalmar os ânimos: “Aqueles que estão contra já tiveram o seu momento — manifestaram-se, e muito bem. Agora deixem que as pessoas que querem ser esclarecidas possam ouvir”. O apelo não resultou. “Nós não queremos o projecto”, reclamaram vozes dispersas pela sala. “Isto é Quarteira, não é política”, proclamaram. Outros afirmaram: “É a democracia a funcionar”.

A consultora Paula Teles, responsável pelo projecto de requalificação de Vilamoura (1993), entrou em cena: “Foi nosso entendimento tentar-vos dar um pouco de enquadramento da mobilidade urbana sustentável”. De seguida, uma vez que o intróito não resultou, avança por outra via para explicar o seu trabalho. “O planeta tem problemas graves...”. A frase ficou a meio. O ruído sobrepôs-se, conversa acabada Um sargento da GNR, de serviço na sala, dá três ou quatro passos na direcção de um dos populares, que se fazia notar, gritando: “Não queremos”.

Vítor Aleixo, socialista, pergunta: “Querem, ou não querem a ciclovia?” “Queremos a ciclovia, mas não é naquele lugar, façam-na junto ao mar, na Avenida Infante de Sagres”, sugeriram. O autarca explicou que essa possibilidade está a ser equacionada no plano de mobilidade suave que liga Quarteira a Vilamoura mas não é para já: “É uma obra complicada, que implica a remodelação da rede de esgotos”, justificou.

Na origem de tudo isto está o projecto “Quarteira Lab”, inserido na Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas. A questão é pertinente, na localidade. Basta olhar a desagregação dos pedregulhos dos esporões que seguram a praia de Quarteira para se perceber as mudanças que estão em marcha. 

A primeira fase da ciclopista desenvolve-se num troço de 900 metros, entre as avenidas Mota Pinto e Sá Carneiro. Está previsto que se estenda por cerca de três quilómetros, com ligação à Ecovia do Algarve e à Rede EuroVelo. Na cidade, a falta de lugares de estacionamento levou, logo a partir do segundo ano da inauguração da avenida, a mudar a filosofia e utilização do principal eixo rodoviário. A primeira faixa de cada um dos lados da avenida passou, em permanência, a ser ocupada com carros estacionados, com a conivência de todas as autoridades — policiais e poder autárquico. A marcação da ciclopista obrigou a subtrair à avenida 1,90 metros (1,20 metros de faixa de rodagem mais 70 centímetros de raio de segurança). O parqueamento automóvel, oficialmente consentido na faixa de rodagem, passou a estar marcado no alcatrão. Agora, os automobilistas revoltam-se contra a tentativa de alterar o estado das coisas. 

“Deviam mudar o nome de avenida para rua”, disse Francisco Pescada, instrutor de condução, chamando a atenção para a dificuldade que os autocarros e outros veículos pesados terão em circular. Vítor Aleixo aceitou a crítica: “Está em cima da mesa a possibilidade de cortar uma parte do separador central [para ganhar espaço]”, admitiu, sublinhando: “Isto não é uma solução definitiva”. Do que se trata, explicou, é “testar soluções, tendo em vista a promoção de políticas ambientalmente correctas”. 

A Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta manifestou o seu “apoio à câmara de Loulé por estar a implementar em Quarteira obras que concretizem projectos de mobilidade activa”. Porém, fez questão de sugerir uma “a redução do separador central, de ambos os lados, de forma a que os transportes públicos circulem com maior margem de manobra”.

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