Será que o jornalismo falhou mesmo?

Este foi o tema da iniciativa do Público, em parceria com a revista Electra (Fundação EDP), que apontou o excesso de opinião, a uniformização das notícias e a perda de autonomia como alguns dos principais problemas dos jornais .

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Ana Sá Lopes moderou a talk, que contou com a participação de Pedro Jerónimo, Carla Baptista e António Guerreiro. Foto/Henrique Casinhas

É preciso rezar pelo jornalismo? A questão abordada por António Guerreiro, na última edição da Revista Electra, marcou também o início da conferência que decorreu no dia 20 de Fevereiro, no auditório do Público, e que pretendeu pensar o jornalismo, sob o mote “O jornalismo falhou?”. “O jornalismo vive hoje numa situação perigosa. Não acredito que vá morrer, mas enfrenta problemas muito difíceis”, disse António Guerreiro. “Há hoje um desencantamento generalizado fruto também da euforia com que o jornalismo nasceu e que o associou a ideais de transparência e progresso.” O debate, organizado pelo Público em parceria com a Revista Electra, foi moderado por Ana Sá Lopes, directora-adjunta do jornal e contou ainda com a presença de Carla Baptista, professora auxiliar na Universidade Nova de Lisboa, e Pedro Jerónimo, investigadora na Universidade da Beira Interior.

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Foto/Henrique Casinhas

Respondendo ainda à questão que serviu de mote à conferência, Carla Baptista disse que o “jornalismo não falhou sozinho” e que ainda assim “é possível fazer melhor”. “Falhámos todos. Falhámos em todos os campos que assentavam numa relação com um público esclarecido”, considerou. Para a investigadora do IC Nova, muitas das falhas que são hoje imputadas ao jornalismo extravasam o seu domínio, como é o caso das fake news. “Quando falo em transversalidade de problemas refiro-me a temas como o modelo de negócio. Nos primeiros tempos da Internet, houve uma adesão não reflectida ao digital e quando houve uma consequência dos riscos não assistimos a uma reacção.” E refere: “Estamos há 25 anos a digerir a mesma questão: ninguém paga para ter informação”. Pedro Jerónimo, docente no Instituto Superior Miguel Torga, considera antes que “o jornalismo tem estado a falhar ao longo dos anos”. “Penso que deve haver uma preocupação com a literacia mediática. É fundamental explicar aos millennials que o jornalismo é importante para a sociedade.”

Opinião a mais e a ilusão de que estamos informados sobre tudo

António Guerreiro e Carla Baptista apontaram o excesso de opinião existente nos jornais como um dos principais problemas actuais. Mais do que a quantidade existente, trata-se sobretudo do impacto que esta opção tem na globalidade de um meio de comunicação. “O excesso de opinião acaba por preencher um espaço que podia ser ocupado por investigação e crítica sustentada”, disse a professora universitária. Além disso, “a opinião não precisa de ser esmagadoramente da área da política. Há um princípio de diversidade ideológica que não está a ser respeitado”.

Carla Baptista, que está preocupada com “a perda de autonomia do jornalismo” citou o jornalista norte-americano, Walter Whitman, para analisar a área: “Ele dizia que o jornalismo deve ser um mapa para as pessoas. Hoje, porém, tornou-se labiríntico, confuso, assinalando coisas que não são importantes e marginalizando outras”. No seguimento da mesma ideia, António Guerreiro afirmou que “o jornalismo deixa no escuro muitas questões da actualidade, criando porém a ilusão de que estamos informados sobre tudo”.

O editor da Electra disse ainda que “falta uma reflexão sobre a linguagem utilizada que é também ela própria carregada de ideologia”. “A palavra populismo, por exemplo, perdeu hoje o seu significado.” E diz: “Para sobreviverem, os jornais querem ser tão críticos que assumem uma atitude que soa a artificial”. Há ainda outra questão fundamental, diz Pedro Jerónimo. Trata-se do “jornalismo de matilha”, que leva a que os conteúdos informativos se repitam de órgão para órgão. “Este jornalismo não é diferenciador e acaba por confundir os leitores.”

Onde falha hoje o jornalismo?

Muitas foram as opiniões e as ideias debatidas durante a talk “O Jornalismo falhou?”, destacamos algumas referidas pelos oradores:

- O excesso de opinião existente nos jornais. “Este acaba por preencher um espaço que podia ser ocupado por investigação e crítica sustentada”, disse a professora e investigadora universitária Carla Baptista

- A ilusão de que temos toda a informação. “O jornalismo deixa no escuro muitas questões da actualidade, criando porém a ilusão de que estamos informados sobre tudo”, considerou António Guerreiro, editor da Revista Electra.

- A uniformização da informação. “O jornalismo de matilha não é diferenciador e acaba por confundir os leitores”, afirmou Pedro Jerónimo, investigador e professor universitário.

O evento decorreu no auditório do Público. Foto/Henrique Casinhas
O evento contou com a moderação de Ana Sá Lopes, directora-adjunta do Público. Foto/Henrique Casinhas
António Guerreiro, editor da Revista Electra, foi um dos participantes da talk. Foto/Henrique Casinhas
O jornalismo esteve em debate durante duas horas. Foto/Henrique Casinhas
A audiência assistiu atentamente às intervenções dos oradores. Foto/Henrique Casinhas
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Carla Baptista, professora auxiliar da Universidade Nova de Lisboa. Foto/Henrique Casinhas
Pedro Jerónimo, investigador da Universidade da Beira Interior. Foto/Henrique Casinhas
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O evento decorreu no auditório do Público. Foto/Henrique Casinhas