Guaidó quer dar alimentos dos EUA e Brasil, Maduro fecha fronteiras e alarga Carnaval

No sábado, voluntários da oposição vão tentar distribuir toneladas de alimentos enviadas pelos EUA e Brasil. Em resposta, Nicolás Maduro mandou encerrar a fronteira com o Brasil, alargou o Carnaval e vai dar um “bónus” aos venezuelanos.

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Guaidó foi reconhecido como Presidente interino por mais de 50 países LUSA/MIGUEL GUTIERREZ

Juan Guaidó, o líder da oposição venezuelana que é reconhecido como Presidente interino por mais de 50 países, partiu esta quinta-feira para a fronteira com a Colômbia, onde no sábado espera começar a distribuir as toneladas de comida e medicamentos armazenadas na fronteira colombiana, contra a promessa do Presidente Maduro de barrar a passagem dos camiões.

O plano dos opositores é reunir um milhão de voluntários em várias regiões do país, nas fronteiras com a Colômbia e com o Brasil.

Em resposta, Maduro anunciou na televisão estatal o encerramento da fronteira com o Brasil e diz estar a pensar fazer o mesmo na fronteira com a Colômbia. Classificou ainda como “uma provocação" a acumulação, na Colômbia, daquilo a que os EUA chamam “ajuda humanitária" — pois é desnecessária na Venezuela, defende.

Segundo Guaidó, os voluntários vão ser enviados para pontos de distribuição nos estados venezuelanos de Táchira e Bolívar, para receberem os medicamentos e alimentos armazenados na cidade colombiana de Cúcuta e no estado brasileiro de Roraima. Haverá também voluntários da oposição nos portos marítimos de La Guaira e Puerto Cabello.

A cidade colombiana de Cúcuta vai ser o centro de toda a operação. É lá que está armazenada a maioria dos medicamentos e alimentos enviados pelos EUA e que o Presidente Maduro se recusa a deixar entrar na Venezuela – Maduro diz que o país não atravessa uma crise humanitária e acusa a oposição e a Casa Branca de montarem uma manobra de propaganda para forçar a sua saída do poder.

O Live Aid de Branson

No sábado, Cúcuta vai também ser palco de um megaconcerto organizado pelo magnata britânico Richard Branson, pensado à maneira do mítico Live Aid – o festival de angariação de fundos para combater a fome na Etiópia que foi transmitido pela televisão para todo o mundo em 1985.

Ainda não há uma lista definitiva dos artistas que vão participar no concerto, mas os organizadores disseram que foram convidados 32 – entre eles estão os cantores Juanes e Luis Fonsi, o DJ sueco Alesso e figuras conhecidas das redes sociais como Rudy Mancuso e Lele Pons.

O objectivo do patrão do grupo Virgin é angariar dezenas de milhões de dólares em doações através de um site e contribuir para que os medicamentos e alimentos enviados pelos EUA entrem na Venezuela.

Branson disse que a ideia do concerto partiu de Juan Guaidó e Leopoldo López, outro dos destacados opositores de Maduro, preso desde 2014 e em prisão domiciliária desde 2017.

“Juan Guaidó, que foi reconhecido como Presidente legítimo da Venezuela por mais de 40 países, incluindo a União Europeia, e Leopoldo López, um líder da oposição que está em prisão domiciliária em Caracas, pediram-nos que ajudássemos a organizar um grande concerto, para chamar a atenção do mundo para esta crise inaceitável e evitável”, disse o magnata britânico na semana passada.

No mesmo dia, e a escassos 300 metros de distância, diz a agência AFP, realiza-se um concerto, que vai durar até domingo, organizado pelo Governo de Maduro, com o mote “Tirem as mãos da Venezuela”. Inicialmente marcado para a ponte pedonal Simão Bolívar, que liga a Colômbia à Venezuela, a 15 quilómetros do local do concerto de Branson, vai realizar-se na ponte de Tienditas, acrescenta a AFP.

Críticas de Roger Waters

A intervenção de Richard Branson na crise política venezuelana foi criticada nos últimos dias por Roger Waters, vocalista e co-fundador da banda britânica Pink Floyd.

Num vídeo partilhado no Twitter, Waters disse que o concerto organizado por Branson “não tem nada que ver com ajuda humanitária”.

“Tem que ver com o facto de Richard Branson, sem que isso me surpreenda, ter comprado a declaração dos EUA: ‘Decidimos ocupar a Venezuela, sejam quais forem as razões'”, disse o músico. “Mas não tem nada que ver com as necessidades do povo venezuelano, nem com ajuda.”

No mesmo vídeo, Roger Waters diz que os seus “amigos em Caracas” lhe dizem que “não há guerra civil, nem desordem, nem homicídios, nem uma aparente ditadura, e nem repressão da imprensa”.

Num relatório publicado na quarta-feira, a Amnistia Internacional descreve um cenário de “fome, punições e medo” na Venezuela.

“As forças de segurança comandadas por Maduro executaram e usaram força excessiva contra pessoas e detiveram outras centenas de forma arbitrária, incluindo adolescentes, numa escalada da sua política de repressão para controlar o povo da Venezuela e, em particular, para punir os habitantes de bairros pobres que decidiram protestar entre os dias 21 e 25 de Janeiro”, diz a organização.

Carnaval alargado

No meio do caos político no país, o Presidente Maduro decidiu alargar as celebrações do Carnaval deste ano, concedendo mais dois feriados à população. Para além disso, o governo vai atribuir um prémio extraordinário aos cidadãos, mas só aos portadores do polémico cartão da pátria – um bilhete de identidade que a oposição diz ser uma forma de restringir o pagamento de subsídios do Estado aos simpatizantes do governo.

“A pensar nos rapazes, nas raparigas, na família, na cultura nacional, este ano vamos antecipar o Carnaval. Declaro feriado nacional os dias de quinta-feira, 28 de Fevereiro, e sexta-feira, 1 de Março. Cumpra-se!”, disse o Presidente Maduro na quarta-feira, a partir do  Complexo Agro-industrial Ezequiel Zamora, a Sul de Caracas.

O Carnaval é uma das festividades mais importantes na Venezuela, com profundas raízes na cultura do país. Tradicionalmente é comemorado a partir do sábado antes da Quarta-feira de Cinzas, que este ano se comemora no dia 6 de Março. Nessa semana, a segunda e a terça-feira são feriados, pelo que este ano os venezuelanos vão começar as comemorações mais cedo, com mais dois feriados na quinta e na sexta-feira anteriores (28 de Fevereiro e 1 de Março).

Ao decretar os feriados, o Presidente Nicolás Maduro anunciou também o pagamento de um bónus aos cidadãos, cujo valor ainda não foi revelado. Mas esse pagamento vai ser feito através do cartão da pátria, um bilhete de identidade criado em 2017 pelo governo venezuelano.

O cartão da pátria funciona com um código QR único (um código que pode ser lido com um scanner) e que foi introduzido no país, segundo o Presidente Maduro, para conhecer a situação socioeconómica dos cidadãos e agilizar o pagamento de prestações sociais do Estado. A oposição acusa o governo de usar este cartão de identidade para controlar os cidadãos e até saber o sentido de voto dos eleitores.

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