Punição do assédio no arrendamento entra em vigor esta quarta-feira

Diploma que proíbe comportamentos ilegítimos para conseguir a desocupação do imóvel foi publicado em Diário da República.

Foto
Iniciativa legislativa nasceu pela mão do BE, em Abril do ano passado Manuel Roberto

A partir desta quarta-feira passa a ser “proibido o assédio no arrendamento ou no subarrendamento”, com a possibilidade de serem aplicadas sanções pecuniárias a quem tenha um comportamento ilegal.

De acordo com o diploma publicado esta quarta-feira em Diário da República, e que entra amanhã em vigor, entende-se por assédio “qualquer comportamento ilegítimo do senhorio, de quem o represente ou de terceiro interessado na aquisição ou na comercialização do locado, que, com o objectivo de provocar a desocupação do mesmo, perturbe, constranja ou afecte a dignidade do arrendatário, subarrendatário ou das pessoas que com estes residam legitimamente no locado”, os sujeite a um ambiente considerado “intimidativo, hostil, degradante, perigoso, humilhante, desestabilizador ou ofensivo”, ou ainda que os “impeça ou prejudique gravemente o acesso e a fruição do locado”.

O diploma que proíbe e pune o assédio no arrendamento nasceu de uma iniciativa do BE e acabou por sofrer várias alterações do PS. Foi aprovado a 21 de Dezembro na Assembleia da República com os votos do BE, PS, PCP, PEV, PAN e do deputado Paulo Trigo Pereira (que está como não inscrito desde que saiu do grupo parlamentar do PS), tendo o PSD e o CDS votado contra.

De acordo com a lei (12/2019), que vem mudar pela quinta vez o Novo Regime do Arrendamento Urbano, e “sem prejuízo da responsabilidade civil, criminal ou contra-ordenacional” que possa vir a ser determinada, o arrendatário passa a poder intimar o senhorio a tomar providências para “cessar a produção de ruído fora dos limites legalmente praticados”.

O mesmo é aplicável no sentido de corrigir deficiências do imóvel ou de partes comuns que possam afectar a saúde ou segurança de quem ali reside e dos bens e situações como o impedimento no acesso a serviços essenciais como águas, luz, gás ou esgotos.

Como tem de actuar o senhorio

O senhorio tem 30 dias após a intimação para actuar, seja para comunicar as medidas tomadas ou para “expor as razões que justifiquem a não adopção do comportamento pretendido pelo arrendatário”. Se nada acontecer nesse prazo, o diploma estipula que, além do recurso aos meios judiciais ou extrajudiciais, o arrendatário pode “requerer uma injunção contra o senhorio” para corrigir a situação.

Pode também exigir ao senhorio o pagamento de uma sanção pecuniária de 20 euros por cada dia (uma vez passado o prazo de 30 dias), até que o senhorio “demonstre o cumprimento da intimação” ou seja decretada a injunção. A penalização sobe 50%, para 30 euros, no caso de o arrendatário ter 65 ou mais anos, ou um grau de deficiência igual ou superior a 60%.

A intimação, diz o diploma, caduca, tal como o pagamento ligado à sanção, se a injunção for indeferida ou se “não for requerida no prazo de 30 dias” a contar do fim do prazo dado ao senhorio para agir.

A lei refere ainda que o arrendatário pode requerer à câmara municipal a realização de uma vistoria ao locado. Esta é classificada como sendo de “natureza urgente”, tendo que ser realizada “no prazo máximo de 20 dias”, e o auto emitido até dez dias depois de ter ocorrido.

BE fala em "situação desequilibrada" no mercado

Quando avançou com o projecto-lei, em Abril do ano passado, o BE afirmou que “a forte pressão no mercado imobiliário, associada à liberalização do mercado de arrendamento”, estava a colocar “os inquilinos numa situação desequilibrada face aos senhorios”.

“Tem-se verificado, com forte alarde social, a prática de condutas atentatórias à dignidade e segurança dos inquilinos, através de comportamentos activos ou omissivos por parte dos senhorios com vista a dificultar ou diminuir a utilização do locado, degradando o mesmo ou as suas condições de utilização com o objectivo de levar os inquilinos a abandonar os locados”, defendia o BE na exposição de motivos do projecto-lei.

Mais alterações

Esta terça-feira foi também publicada em Diário da República a lei 13/2019, que inclui várias alterações na legislação ligada à habitação, desde o Código Civil ao diploma dos contratos de crédito relativos a imóveis para habitação, passando pelo regime jurídico das obras em prédios arrendados. O objectivo é estabelecer medidas para “corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios”, “reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano” e “proteger arrendatários em situação de especial fragilidade”.

Entre as alterações está a clarificação de que não pode haver discriminação no acesso ao arrendamento, seja por sexo, origem étnica, religião, género, orientação sexual, idade ou deficiência, entre outros aspectos, sendo o mesmo aplicável à publicidade de imóveis para esse fim. Outra mudança é o artigo onde se determina que o prazo mínimo dos contratos passa a ser de um ano e renovável automaticamente por três anos, salvo estipulação em contrário.

Introduz-se também, conforme noticiou a Lusa quando o diploma foi promulgado pelo Presidente da República, protecções contra o despejo de inquilinos idosos ou com deficiência e que residam nas casas "há mais de 15 anos" para contratos anteriores a 1990 e "há mais de 20 anos" para contratos celebrados entre 1990 e 1999.

O diploma permite também a criação do Serviço de Injunção em Matéria de Arrendamento (SIMA), que serve para efectivar os direitos dos arrendatários, nomeadamente o reembolso de despesas suportadas por obras feitas em substituição do senhorio. Neste caso, a lei foi aprovada como votos do PS, BE, PCP e PEV, tendo o PSD e CDS votado contra (o PAN absteve-se).

Os alertas de Marcelo

Apesar da promulgação, e de ter considerado que este diploma “procura responder a certas situações de especial fragilidade”, Marcelo Rebelo de Sousa deixou alguns reparos, afirmado que as alterações “ao reequilibrarem muito significativamente a favor imediato dos inquilinos as actuais disposições legais sobre arrendamento urbano, podem vir a provocar, como se viu no passado, um maior constrangimento no mercado do arrendamento para habitação, frustrando afinal os interesses de futuros inquilinos, bem como de potenciais senhorios".

Além disso, lamentou "as numerosas e contínuas alterações a um regime que deveria manifestamente ser mais estável", com "disposições transitórias muito complexas".

Sugerir correcção
Ler 3 comentários