Gordon Banks (1937-2019), o guarda-redes do impossível

Morreu nesta terça-feira, aos 81 anos, um dos melhores guardiões da história do futebol.

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O momento em que Banks fez a defesa impossível ao cabeceamento de Pelé Reuters/ACTION IMAGES
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“A marca de um bom guarda-redes é ser obrigado a fazer poucas defesas durante um jogo. Uma defesa espectacular é o último recurso quando tudo – posicionamento, antecipação, defesa – falhou. Mas é pelas defesas que os guarda-redes são recordados e há uma na minha carreira sobre a qual as pessoas estão sempre a perguntar-me e que consideram que foi a melhor da minha vida – para mim não foi!” Gordon Banks foi muito mais do que aquela defesa impossível ao cabeceamento perfeito de Pelé num Inglaterra-Brasil do Mundial de 1970, mas a história encarregou-se de julgá-la como a melhor de sempre e foi por aqui que o guarda-redes inglês começou a autobiografia publicada em 2002. Não por uma adolescência em que foi aprendiz de pedreiro, pelo título mundial de 1966 ou por ainda ter sido um guarda-redes de nível planetário depois de ficar cego de um olho.

Tal como o próprio fizera na autobiografia, também foi por essa defesa que começaram muitos dos tributos prestados pelo mundo do futebol a este grande guarda-redes britânico que morreu nesta terça-feira, aos 81 anos, vítima de cancro renal, doença que lhe fora diagnosticada em 2015. O próprio Banks podia não achar que foi a melhor defesa da história ou a melhor da sua carreira, mas, quando se fala de impossível no futebol, a defesa de Banks tem de entrar na conversa, não pela importância que teve no jogo – o Brasil ganhou -, mas por simbolizar o lugar do britânico na galeria dos imortais da baliza. Se a “aranha negra” soviética Lev Yashin é a escolha mais consensual para o melhor de sempre, Banks estará, pelo menos, na discussão para segundo melhor.

Banks nasceu num bairro pobre de Sheffield e cedo teve de abandonar a escola para ir trabalhar e contribuir para a economia familiar, ao mesmo tempo que dava os primeiros passos no futebol. Foi aprendiz de pedreiro e ajudava na distribuição de carvão, duas actividades de grande exigência física e que o próprio, mais tarde, reconheceu terem sido fundamentais no seu desenvolvimento muscular. Ignorado pelos dois grandes de Sheffield, o United e o Wednesday, Banks acabou por ir jogar para o Chesterfield, a ganhar três libras por semana em Março de 1953. Na primeira época completa pelas reservas do clube, sofreu 122 golos, mas foi fazendo o seu caminho e, em 1959, saltou de um clube da terceira divisão para o Leicester City, que estava na primeira.

Banks começou a época nas reservas e acabou a titular, a primeira de oito temporadas que passaria a guardar a baliza dos “foxes”. Pelo meio, em 1963, foi chamado à selecção pela primeira vez por Alf Ramsey, e iria manter o lugar durante o Mundial de 1966. Não sofreu um único golo nos quatro primeiros jogos do torneio, sendo batido pela primeira vez nas meias-finais em Wembley contra Portugal, com um penálti convertido por Eusébio, por quem o britânico tinha uma grande admiração. “Ele marcou, veio cumprimentar-me e não celebrou. Foi algo que nunca me tinha acontecido e nunca me voltou a acontecer. Era um tipo especial”, contou Banks, que convidaria Eusébio para o seu jogo de despedida, em 1973.

A Inglaterra seria campeã mundial em 1966, com Banks na baliza, mas esse estatuto de nada valeu ao guarda-redes a nível de clube. No ano seguinte, para promover um jovem Peter Shilton, o Leicester colocou Banks no mercado e, depois de se ter falado do interesse do Liverpool, foi o Stoke City a avançar. Banks tornou-se num dos maiores ídolos no Britannia Stadium (onde tem uma estátua), mas a sua carreira no Stoke acabaria por ter um fim abrupto, devido a um acidente de automóvel em 1972 que lhe roubou a visão no olho direito.

A sua carreira em Inglaterra chegou ao fim, mas, cinco anos depois do acidente, Banks ainda fez um par de épocas na North-American Soccer League e chegou a ser considerado o melhor guarda-redes desse campeonato que, nos seus tempos áureos, teve algumas das maiores “estrelas” do futebol mundial. Acabada a carreira de futebolista, tentou uma como treinador, mas sem grande sucesso, e até chegou a vender a sua medalha de campeão do mundo para ajudar os filhos a comprar casa – acabaria por recuperá-la alguns anos mais tarde.

E não, não nos esquecemos da melhor defesa de sempre, “a 1500 metros de altitude e sob o sol impiedoso de Guadalajara”. “Banksy” já tinha 33 anos mas ainda era o mesmo guarda-redes que sempre fora, ágil, rápido, com grande presença física, espírito de liderança e sentido de posicionamento. Era dia de estrear um par de luvas perante o poderoso ataque brasileiro liderado por Pelé.

Banks faz um resumo detalhado na autobiografia da defesa que muitos dos seus colegas e adversários daquele dia ainda não sabem como aconteceu, mas o essencial é: Jairzinho avança pela direita, faz o cruzamento perfeito para a elevação de Pelé fora da pequena área. A bola parece que vai entrar, e Pelé começa a festejar o golo, mas Banks mergulha, a bola não entra e acaba por ir para fora. Palavra final a Banks: “Quando me levantei, o Pelé veio ter comigo. ‘Pensei que tinha entrado’, disse-me. ‘E eu também’, respondi’ […]. Depois, o Bobby Moore veio ter comigo e disse-me, ‘Estás a ficar velho, Banksy, antes agarravas essas bolas todas’. O tanas é que agarrava!”

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