Governo impedido de invocar interesse público na requisição dos enfermeiros

Acção de intimação é mais rápida do que uma providência cautelar e permite ter uma decisão final em pouco mais de uma semana. Também impede invocar interesse público para manter efeitos da requisição civil.

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Enfermeiros em protesto contra a requisição civil. LUSA/MIGUEL A. LOPES

O Sindicato Democráticos dos Enfermeiros (Sindepor) vai contestar judicialmente a requisição civil determinada esta quinta-feira pelo Conselho de Ministro apresentando na próxima segunda-feira no Supremo Tribunal Administrativo (STA) uma intimação para a protecção de direitos, neste caso o direito à greve. Este tipo de acção, que se caracteriza por uma maior rapidez relativamente às providências cautelares, também impede o Governo de invocar o interesse público para manter os efeitos da requisição civil – no âmbito das chamadas resoluções fundamentadas –, enquanto um juiz analisa o caso.

Após entrada da acção no STA, que é competente porque se contesta uma decisão do Conselho de Ministros (CM), pode decidir, na melhor das hipóteses, em pouco mais de uma semana. O tribunal terá de decidir se esta requisição civil é válida ou inválida.

Ao contrário das providências cautelares estas acções de intimação não suspendem de imediato os efeitos dos actos que pretendem contestar – neste caso a resolução do CM que serviu de base à requisição civil e a portaria da ministra da Saúde que a concretizou –, mas também não permitem que a Administração Pública consiga afastar essa suspensão com a invocação do interesse público.

A celeridade e o facto de não ser possível ao Estado invocar o interesse público para manter a requisição civil são duas das razões que levaram a equipa de advogados que representa o Sindepor e, de que Garcia Pereira faz parte, a optar por este tipo de acção. “A providência cautelar é mais lenta e a sua utilidade prática é anulável com facilidade com a apresentação de uma resolução fundamentada por parte da Administração Pública”, argumenta Garcia Pereira.

Uma magistrada especializada em Direito Administrativo ouvida pelo PÚBLICO concordou que, face aos 20 dias que faltam para o fim da greve (decretada até ao final deste mês), era muito difícil que uma providência cautelar tivesse um efeito útil. Por outro lado, nota que poderia não ser o mais adequado já que, sendo uma decisão provisória, os efeitos que teria seriam sempre irreversíveis.

Garcia Pereira contesta a falta de fundamentação da resolução do CM que serviu de base à requisição civil. O documento apenas refere que nas quatro unidades hospitalares abrangidos pela requisição civil – os centros hospitalares de S. João, do Porto, de Entre o Douro e Vouga e de Tondela-Viseu – “se tem verificado, de acordo com informações detalhadas dos respectivos conselhos de administração, que os enfermeiros não têm cumprido os serviços mínimos fixados, com claro prejuízo para os utentes e em violação das disposições legais aplicáveis”.

Mas não concretiza qualquer situação. “É invocado o incumprimento dos serviços mínimos sem o concretizar em termos de tempo, modo ou lugar”, sustenta Garcia Pereira, que defende que, por isso, a decisão é inválida. Mas o advogado insiste que é falso que os serviços mínimos não foram cumpridos e garante que a equipa está a fazer um levantamento de vários casos que demonstram isso mesmo.

“Por exemplo, no hospital S. João foi considerado que os serviços mínimos abarcavam dois blocos operatórios que deviam estar a funcionar. Mas para um deles foi marcada uma operação de neurocirurgia, não urgente, que demorava oito horas. Ora tal fez com que as que estavam abrangidas pelos serviços mínimos se concentrassem só num bloco que não foi suficiente para dar resposta a todas as cirurgias”, concretiza. E acrescenta: “Mas a culpa não foi dos enfermeiros."

Garcia Pereira insiste igualmente que alguns hospitais, como o de Braga, têm serviços mínimos mais alargados do que os que funcionam num dia normal, o que tem permitido recuperar listas de espera. 

Sobre o desenrolar do processo, a magistrada ouvida pelo PÚBLICO explica que os juízes terão 48 horas para decidir se aceitam a acção e, se aceitarem, terão de citar o CM que, em princípio, terá sete dias para se pronunciar. Este prazo poderá ser encurtado ou aumentado, em função da urgência e da complexidade do caso. Garcia Pereira já adiantou que vai pedir o seu encurtamento. Se as partes o pedirem, podem-se realizar diligências de prova e no fim, os juízes terão cinco dias para decidir. “Este caso é sobretudo uma questão de prova”, sublinha a magistrada, que diz ser determinante apurar se houve ou não incumprimento dos serviços mínimos.

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