O melhor pork pie do mundo é, quelle surprise, o da Dickinson e Morris, de Melton Mowbray
Tenho comido muitos pork pies bons ao longo da vida, mas só este ano é que encontrei um que é transcendente.
Os ingleses são mestres nas empadas e a melhor empada de todas é o pork pie. A não ser que se faça em casa - não é difícil mas é raro -, o melhor é comprar num talho caro que os faça à mão usando boa carne de porco. Easier said than done, não é?
Tenho comido muitos pork pies bons ao longo da vida, mas só este ano é que encontrei um que é transcendente. É também o único que tem indicação geográfica protegida. Habituei-me a ouvir as pessoas da aldeia de Melton Mowbray dizer que só eles é que fazem os verdadeiros pork pies mas nunca acreditei. Seria como acreditar que só numa aldeia de Lancashire é que se fazem steak and kidney pies como deve ser.
Lá encomendei dois pork pies da loja Dickinson and Morris em Melton Mowbray, usando a excelente British Corner Shop, que manda carnes e queijos devidamente refrigerados para Portugal.
Costumo comer pork pie com mostarda inglesa, mas as empadas da Dickinson and Morris são tão boas que tive de comê-las sem mais nada.
O segredo está no tempero. Esta empada tem uma condimentação perfeita, irreproduzível. Em duas dentadas jurei que nunca mais queria comer pork pies sensaboronas.
Uma das particularidades do pork pie é ser injectado com geleia de ossos de porco depois de estar cozido. Não soa bem mas é delicioso, cheio de umami. A geleia deste pork pie é também excepcional.
De repente dou comigo a odiar-me. Como é que eu nunca me dei ao trabalho de arranjar um pork pie a sério, de Melton Mowbray? Seria como provar todos os queijos de ovelha vendidos em Portugal e depois provar, com 63 anos, um queijo da Serra, um Serpa e um Azeitão.
A razão da minha ignorância é a ubiquidade do pork pie no Reino Unido. Toda a gente faz. Toda a gente quer vender a versão que faz. É como se existisse uma conspiração gigantesca para impedir as pessoas de provar o pork pie original e genuíno da Dickinson and Morris.
E faz sentido - porque basta provar um pie deles para nunca mais querer outro. A qualidade da massa é o pormenor mais sensacional. A massa é feita com água muito quente na qual se derrete banha de porco (e, às vezes, dripping, gordura de vaca). É depois levantada e formada à mão. A massa fica compacta e, ao mesmo tempo, estaladiça, quase bolacha.
Não faço ideia como conseguiram isto: é um milagre. Gosto muito das empadas portuguesas (de galinha, de caça, de carne de porco) mas, mesmo feitas por mestres, como é o caso do restaurante Fialho, em Évora, a massa fica saborosa mas não estaladiça.
Em qualquer pie, aliás, a massa faz de tupperware medieval: destina-se a proteger o interior. A massa leva com a sujidade do caminho. Chegando a fome, o trabalhador come o interior e deita fora o exterior.
Trata-se do mais fast dos fast foods: é só desembrulhar, cortar e comer. Não só não é preciso aquecer, é heresia. É também um disparate porque derrete a geleia. Há quem acompanhe com Branston Pickle - mas isso é mania de quem gosta de tudo com Branston Pickle. Eu cá prefiro uma salada de pepino holandês ou um ou dois pepinos picklados alemães.
Um pork pie grande custa 7 euros e dá para duas pessoas (ou refeições). Não é mau para o supra-sumo da especialidade, pois não? A maior despesa é com a transportadora. A British Corner Shop usa a DHL e cobra cerca de 25 euros, mas pode-se aproveitar para mandar vir queijos ingleses e salsichas inglesas ao mesmo tempo, diluindo o preço do transporte.
Embora eles levem uma semana a fazer a expedição (acho que fazem os envios europeus às segundas-feiras), mandam-nos de um dia para o outro.
Quando se recebe o caixote, o gelo das fitas plásticas ainda está intacto e os queijos e as carnes estão impecáveis. Os fãs dos supermercados Waitrose gostarão de saber que a British Corner Shop tem os goodies deles.