Loulé suspende PDM para travar onda de construção no litoral

As medidas preventivas, para já, vão inviabilizar a proposta de um Fundo Imobiliário que pretende transformar o parque de campismo de Quarteira num empreendimento com torres de seis pisos.

Foto
A câmara quer impedir mais construção para lutar contra a erosão costeira Vasco Célio/Arquivo

As alterações climáticas, em particular a subida do nível do mar, justificam a decisão da câmara de Loulé em estabelecer “medidas preventivas” no Plano Director Municipal (PDM), que está em fase de revisão. Primeira consequência: ficou inviabilizada, por enquanto, a proposta de construção de um empreendimento turístico, com 499 fogos, com torres de seis pisos, no lugar do parque de campismo de Quarteira. O sítio insere-se numa das principais zonas húmidas da região — a lagoa do Almargem, o último grande espaço verde que ainda resta entre Quarteira e Vale do Lobo.

A entidade promotora, um Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado — Invesfundo VII (Grupo Novo Banco) não se conforma com a decisão do executivo municipal. Aos deputados municipais — que deverão tomar uma decisão sobre esta matéria no dia 15 ou 22 desde mês — o fundo dirigiu uma carta assinada por Volkert Reig Schmidt apelando a que a proposta do executivo seja reprovada: “Não pratiquem um acto ilegal e lesivo dos interesses dos particulares”, lê-se. E recomenda à assembleia que não permita “a tomada de decisões em matéria de urbanismo e desenvolvimento local com este impacto sem uma prévia audição de todos os interessados, munícipes, empresas e outras forças vivas da região”.

De acordo com a pretensão da imobiliária, o parque de campismo — com uma capacidade para mais de dois mil habitantes, explorado pela Orbitur —, deverá ser demolido até final do ano. O projecto, denominado Quinta do Oceano, prevê a construção de um aparthotel, prédios de seis pisos e habitações unifamiliares, de um e dois pisos.

O braço-de-ferro entre a câmara e o Invesfundo VII arrasta-se desde Fevereiro de 2009, altura em câmara deliberou que só autorizava o desmantelamento do parque de campismo quando lhe fosse apresentada uma alternativa de relocalização desta infra-estrutura.

Segundo o Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), a lagoa da foz do Almargem faz parte do corredor das Zonas Húmidas entre Armação de Pêra e o Ancão, tal como sucede com a lagoa dos Salgados, em Albufeira, que também se encontra em risco. Em 2011, a Assembleia Municipal deliberou propor ao executivo que a zona fosse classificada de “área protegida de âmbito local” mas o processo não avançou.

O problema é que o PDM de Loulé classifica a área do parque de campismo como “espaço urbano” desde 1995. Mas a câmara entende que, neste caso, não há direitos adquiridos e a proposta urbanística colide com a Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas (EMAAC), que serve de matriz para a revisão do PDM, iniciada há cerca de um ano.

As restrições agora impostas pelo município foram secundadas pelo “parecer favorável” da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) Algarve também emitiu “parecer favorável à proposta de suspensão do PDM e estabelecimento de medidas preventivas” na zona nascente de Quarteira

O parecer da delegação regional da APA — ARH do Algarve, solicitado pela autarquia a este propósito, chama a atenção para “um conjunto de fragilidades ambientais que importa minimizar no âmbito da revisão do PDM” neste troço da costa. O avanço do mar, regista o POOC, ocorre a uma média de 1,4 metros por ano.

Apesar do risco, não faltam projectos para construir em cima das arribas apesar das provas dadas sobre o impacto destas decisões no futuro. Um dos exemplos mais conhecidos é o das moradias do Vale do Lobo, construídas há cerca de 30 anos a mais de duas centenas de metros da costa, e que com o avanço do mar ficaram em situação de risco de derrocada. Para minimizar os efeitos da erosão, que ocorre em cada Inverno, foram investidos, em duas fases, mais de 2,5 milhões de euros na recarga artificial da praia.

A proposta das “medidas preventivas e suspensão do PDM” tem um prazo de dois anos, podendo ser prorrogado por mais um, até à data em vigor do novo plano, revisto.

A câmara de Loulé, no âmbito de revisão do PDM, identificou 28 medidas a pôr em prática, relacionadas com as alterações climáticas. Uma das prioridades é um “Estudo relativo à subida do Nível Médio do Mar (NMM) e a sobrelevação da maré em eventos extremos de galgamento e inundação costeira”. O objectivo é preservar as zonas sensíveis e reduzir a densidade urbanística em áreas vulneráveis. Por isso, o projecto do parque de campismo de Quarteira sofre uma redução para menos de metade das expectativas dos investidores — os índices de construção caem dos 0,7 para 0,3/0,2.     

Sugerir correcção
Ler 4 comentários