A era da descida rápida do desemprego já chegou ao seu fim?

Taxa de desemprego de 6,7% anunciada pelo INE para o quarto trimestre do ano passado foi exactamente a mesma que já se tinha verificado no segundo e terceiro trimestres de 2018.

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Construção de novo hospital privado em Lisboa Andreia Patriarca

São já três, os trimestres consecutivos em que a taxa de desemprego nem sobe, nem desce, dando força à possibilidade de, ao fim de cinco anos de fortes melhorias no mercado de trabalho, se estar agora a chegar ao limite daquilo que a economia portuguesa, com a sua actual estrutura, pode fazer para reduzir ainda mais o desemprego.

A taxa de desemprego de 6,7% anunciada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) esta quarta-feira para o quarto trimestre do ano passado foi exactamente a mesma que já se tinha verificado no segundo e terceiro trimestres de 2018. Antes disso tinha-se assistido a um período, iniciado no primeiro trimestre de 2013, em que este indicador caiu, de forma quase ininterrupta, do máximo de 17,5% até aos 6,7% actuais. O número de desempregados caiu 62,3% ou 577 mil pessoas.

Agora, a dúvida está criada: vamos voltar à tendência de descida forte do desemprego a que se assistiu entre 2013 e 2018, ou os últimos três trimestres são o início de um período de estagnação? O Governo, e diversas outras entidades, prevêem que o desemprego continue a descer nos próximos anos, a um ritmo mais moderado e a verdade é que há alguns motivos para pensar que será mais difícil nos próximos trimestres voltar a uma tendência de descida da taxa de desemprego tão acentuada.

Um desses motivos está na chamada taxa natural de desemprego. Este indicador é calculado com o objectivo de medir qual a taxa de desemprego que, numa determinada economia, não gera pressões inflacionistas, assumindo-se que, a cada momento, é normal esperar-se que a taxa de desemprego real possa caminhar para esse ponto de equilíbrio. No caso português, os cálculos feitos por diversas instituições, como o Banco de Portugal ou a Comissão Europeia, apontam para que a taxa de desemprego portuguesa já esteja neste momento abaixo do seu nível natural, algo que não aconteceu até 2017.

Embora seja necessário ter cuidado em retirar conclusões definitivas de um indicador que se baseia no PIB potencial e que pode ter várias metodologias de cálculo, a passagem da taxa de desemprego real para um nível abaixo da taxa de desemprego natural pode indiciar o surgimento de condições menos favoráveis à criação de emprego no país.

Outra razão para esperar uma continuação deste período de estabilização no mercado de trabalho está no abrandamento que se espera para a economia. A zona euro está a crescer menos e Portugal dificilmente evitará este efeito de contágio. Os números do crescimento do PIB no quarto trimestre apenas serão tornados públicos pelo INE na próxima semana, mas o abrandamento do crescimento homólogo do emprego agora revelado – variação de 1,6% no quarto trimestre contra 2,1% no terceiro trimestre – pode também ser uma consequência de uma tendência de abrandamento semelhante na actividade económica. Entre o início de 2017 e o primeiro trimestre de 2018, o emprego cresceu mais rapidamente do que a economia, mas a partir daí registaram taxas de variações homólogas exactamente iguais.

Neste cenário de expectativas mais fracas ao nível da redução do desemprego – que está a mínimos desde 2004, mas que ainda fica longe dos mínimos históricos perto de 4% - fica a esperança de que se passe a assistir agora a actualizações mais generosas dos salários.

O que a ciência económica antecipa é que, quando a taxa de desemprego atinge patamares mais baixos, se regista uma pressão crescente para uma maior subida dos salários, à medida que os trabalhadores ficam com uma maior capacidade de reinvidicação junto das empresas e do Estado.

Salários sobem 3,7%, o valor mais alto desde 2012

Os dados revelados pelo INE esta quarta-feira parecem apontar para a ocorrência de um fenómeno desse tipo, já que os portugueses a trabalhar por conta de outrem viram, em média, o seu rendimento líquido a subir 3,7% durante o ano passado, o valor mais alto desde pelo menos 2012.

De acordo com a informação obtida através do inquérito ao emprego do quarto trimestre de 2018, o rendimento médio líquido da população empregada por conta de outrem foi, no decorrer de 2018, de 888 por mês. Face a 2017, este indicador registou uma subida de 32 euros, ou 3,7%. Em 2017, a subida tinha sido de 2% e em 2016 de 1,3%.

Esta aceleração dos salários líquidos já vinha sendo evidente nos dados publicados pelo INE trimestralmente. A variação do rendimento médio líquido tinha sido, em comparação com os períodos homólogos do ano anterior, de 3,5% no primeiro trimestre de 2018, 4,2% no segundo e de 3,5% no terceiro. Nos três últimos meses do ano passado, de acordo com a informação agora publicada, a variação foi de 3,6%.

Para esta aceleração podem contribuir vários factores. Uma delas é o desempenho mais forte da economia, com redução da taxa de desemprego, que pode estar a contribuir para que se assista no mercado de trabalho a uma subida de salários, até aqui bastante modesta. Isso começou a ser particularmente evidente ao nível da negociação colectiva em alguns sectores e teve um efeito de base extremamente importante relacionado com a subida do salário mínimo nacional.

Para além disso, em 2018, as mudanças realizadas ao nível do IRS pelo Governo, com mudanças nos escalões, reflectiram-se no rendimento líquido recebido pelos portugueses, por via da adaptação parcial das taxas de retenção.

Por fim, as mudanças operadas ao nível da função pública, como o início do processo de descongelamento das progressões, também constituem um contributo para a aceleração do ritmo de crescimento dos rendimentos.

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