Sim, o acesso ao ensino superior é um direito

Dependendo de certas classes dirigentes, a mobilidade social não existiria e o acesso à aprendizagem, à escolaridade, à vida, ao amor, viagens, sonhos, a aventura de viver e morrer livre seria o que durante séculos sempre foi, algo de proibido e vedado, um privilégio das elites.

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Nathan Dumlao/Unsplash

A Professora Doutora Maria Filomena Mónica veio há dias declarar a sua oposição ao acesso universal ao ensino superior. Porque o aumento do número de licenciados só servirá para o aumento do desemprego entre licenciados. Porque as metas da União Europeia são só para inglês ver. Porque é um desperdício de recursos.

Não estou de acordo. Nem posso estar quando a única razão de estar onde estou se prende com a felicidade de poder ter tirado um curso superior. E frequentado outro, mesmo tendo desistido a meio.

Porque o saber não ocupa lugar. Porque, por ter tirado um curso em ensino e frequentado Enfermagem, acabei a coordenar as necessidades médicas de todos os alunos de um município de Londres.

Infelizmente, dependendo de Maria Filomena Mónica, a minha frequência do curso de Enfermagem foi um desperdício de recursos. Lamento contrariar, mas os meus alunos também não estão de acordo quando hoje sei cuidar tão bem como ensinar. Uma vez enfermeiro, sempre enfermeiro; e uma vez professor, sempre professor.

Foi na universidade que me formei e criei amizades para a vida, foi na universidade que encontrei semelhantes e opostos, pessoas de todo o país e de todo o mundo, ideias e ideais, culturas, modos de pensar e viver nem melhores nem piores, diferentes, associações de estudantes e movimentos políticos, protestos, festas, livros, cinema, viagens, saídas de campo, ensino clínico em hospitais, a primeira injecção e depois tantas outras, espécies em extinção, doentes terminais, professores únicos, inspiradores e apaixonados, sofrimento e doença mas também a cura, lágrimas mas também abraços e sorrisos. Na universidade cresci, na universidade vivi.

Dependendo de mim, todos teriam direito a aceder ao ensino superior. Por ser superior. Pela experiência, cabendo depois a cada um decidir pela conclusão do mesmo ou não. Pelo direito universal a saber mais, a curiosidade humana é inata, e que direito têm os outros, os mais velhos, os que vieram antes de nós, de nos dizer o contrário?

Não têm o direito, têm o medo de quem sabe como a educação fica para a vida, querer saber, querer questionar, interrogar, não aceitar a informação com as mãos abertas mas com os punhos cerrados, porque já passámos por muito, já lemos muito, investigámos muito e nada é dado por garantido. Não nos tomem por parvos. Por favor. 

Dependendo de certas classes dirigentes, a mobilidade social não existiria e o acesso à aprendizagem, à escolaridade, à vida, ao amor, viagens, sonhos, a aventura de viver e morrer livre seria o que durante séculos sempre foi, algo de proibido e vedado, um privilégio das elites.

As nossas desculpas se não estamos de acordo. Na sapiência reside a nossa única hipótese de nos declararmos homens e mulheres. Não queremos voltar a assinar de cruz. Agora queremos mais, queremos tudo: queremos entrar para a universidade.

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