Os 40 anos de carreira do estreante Gimba no Musicbox

Tudo começou em 1978. 40 anos depois, estreou-se enquanto "trovadeiro". Ponto G, editado em Outubro é o mote para a celebração do músico dos Afonsinhos do Condado ou Irmãos Catita. Concerto esta sexta-feira no Musicbox, em Lisboa.

Foto
dr

A banda ia definhando aos poucos, a fazer uns bares, a viajar desde a origem, Lisboa, até Évora ou Setúbal para vir de lá com 20 euros no bolso. A banda ia definhando e naquele vai não vai, acaba mesmo ou vamos dar um tempo, o baixista dirá para o cantor e compositor: “Tu não precisas de uma banda para nada, as tuas canções valem pelo que são. Vai sozinho fazer a tua cena”. E ele foi.

Alguns anos depois, chegou o resultado dessa solidão, Ponto G, álbum de pop escorreita em português bem medido e olhar clínico lançado, em modo sátiro suave e bem-disposto, sobre as desventuras do país, o Chiado lisboeta enquanto montra, a obsessão em estar ligado à rede 24 horas por dia. É o álbum de um estreante chamado Gimba e será apresentado esta sexta-feira no Musicbox, em Lisboa, às 22h30 (10€), com António Zambujo, Samuel Úria e Marisa Liz como convidados. É também o álbum com que o dito estreante celebra 40 anos de carreira. Confuso, não? Não.

É realmente de Gimba que falamos. Ou seja, o cidadão nascido Eugénio Cardoso de Carvalho Lopes em Lisboa, ano 1959. Gimba, o que animava salas e bares, no final dos anos 1970, enquanto membro do duo Tiroliro & Vladimiro, embrião dos Afonsinhos do Condado, cometa que deu colorido, salsa (das Amoreiras) e sambinha (para Gorbachev) aos anos 1980 portugueses. Esse Gimba que, depois, pudemos acompanhar enquanto baixista dos delirantes e inigualáveis Irmãos Catita de Manuel João Vieira. O que trabalhou em televisão (Pop Off), que compôs para cinema, que produziu, que se dedicou à criação de oficina de escrita para canções.

Gimba, esse mesmo. Há uns anos, os seus Gimba & Os Bandidos iam definhando, o baixista disse-lhe que não precisava da banda para nada e ei-lo então a lançar Ponto G, editado em Outubro do ano passado e o primeiro verdadeiramente a solo da sua carreira, tudo baseado no homem e na sua guitarra – difere, nesse aspecto, de Funky, Punky, Trunky (1997). Ponto G é, portanto, e nesse sentido, uma estreia. E chegou em ano de celebração – 40 anos bem medidos desde a estreia a sério em palco, em 1978, com Tiroliro & Vladimiro.

A primeira banda que teve não era exactamente uma banda. Era ele e alguns colegas de escola enfiados numa carrinha, “inspirados na onda hippie que se estava a viver e no [programa televisivo] Zip-Zip, com os baladeiros”, a trautearem canções – “tudo oral, um pouco onomatopeico”, que não havia instrumentos nem ensaios. Mais tarde, esteve no embrião dos Xutos & Pontapés – “uns Xutos & Pontapés de cervejaria, que cantavam no café meia dúzia de refrães e iam à garagem do Zé Pedro tentar esgalhar qualquer coisa, sem grandes progressos”. Chegam então os Vladimiro & Tiroliro, partilhados com Jorge Galvão. Assentam arraiais no Bairro Alto e, já com Nuno Faria, transformam-se nos Afonsinhos do Condado. “Foi o mais perto que estive daquele sonho de jovem, de estar num palco, ter fãs, ir à televisão, fazer estrada”.

Em 1990, ano em que a agenda bem preenchida dos anos anteriores deu lugar a magros quatro concertos distribuídos por 365 dias, os Afonsinhos do Condado tiraram umas férias que duram até hoje. Gimba abandona os holofotes e junta-se, como baixista, à trupe Irmãos Catita. “Era o Manuel [João Vieira] lá à frente e nós éramos uma espécie de figurantes. Soube-me bem esse papel secundário. Na altura bebiam-se uns copos e não ter que estar sob os holofotes soube-me bem. Mas passados uns anos, fartei-me daquelas touradas”, conta. “Quem anda muito tempo em touradas começa a sofrer de uma coisa que é o stress pós-tauromáquico. Sofri muito com isso e arredei-me”.

Houve então o supracitado Funky Punky Trunky e, mais tarde, Gimba iniciou a oficina de escrita de canções. Pelo meio, produziu para nomes tão diversos quanto José Cid, Tim ou Mário Laginha e compôs marchas para Lisboa. Em 2010, volta a vontade de subir a palco e surgem então Gimba & Os Bandidos – “a banda mais invisível da Internet”, descreve, “e como era invisível na Internet ficou também invisível para o grande público”, afirma com uma gargalhada.

Banda desfeita, ei-lo então totalmente a solo, actuando com a guitarra no Clube Royale, o restaurante bar que abrira no Poço dos Negros, em Lisboa. “Percebi que nunca tinha estado sozinho no palco, e gostei”. Gostou ele e foi gostando o público que o ouvia em ambientes intimistas. Nasceu então a vontade de, “nas calmas, ir gravando um disco”. Que é este que agora se apresenta no Musicbox e onde se inclui, por exemplo, a canção-manifesto lá!, hino bem-humorado para o despertar da nação em que participam Ana Bacalhau, António Zambujo, Camané, José Cid, JP Simões, Manuel João Vieira, Márcia, Mário Mata, Marisa Liz, Rita Redshoes, Samuel Úria e Tim (o tema “propiciava uma coisa à We are the world", assim explica Gimba a participação no tema dos doze cantores).

Nos tempos dos Tiroliro & Vladimiro – que voltaram a reunir-se e que estão a resgatar os velhos temas à memória para uma futura gravação —, punham um letreiro à porta dos bares onde actuavam: “Tiroliro & Vladimiro, música para divertir”. Desses tempos até chegarmos, 40 anos depois, aos de Gimba enquanto “trovadeiro” — a expressão é sua —, essa é uma marca que não mudou. Ei-lo então, agora, prestes a chegar ao concerto em que, com António Zambujo, Samuel Úria e Marisa Liz como convidados, celebrará quatro décadas de percurso musical interpretando Ponto G, mas passando também, por exemplo, pelos Afonsinhos do Condado e pela memória de um pioneiro do rock português, Daniel Bacelar.

“Ainda agora estou a recomeçar”, exclamará ele no final da conversa com o PÚBLICO. “O futuro é um presente e é para a frente e não para trás”, como se canta em lá!. “Estou de tanque cheio para a viagem”, diz ele. A partida está marcada para as 22h30, no Musicbox, em Lisboa.

Sugerir correcção
Comentar