EDP quer criar uma rede telefónica privativa para a distribuição de electricidade

A EDP Distribuição quer criar uma rede fechada de comunicações para as suas equipas no terreno. A Vodafone contesta e diz que a atribuição de frequências à EDP desvaloriza o interesse dos operadores na quinta geração móvel (5G).

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A EDP Distribuição é presidida por João Torres Mario Lopes Pereira

A EDP Distribuição registou-se no Verão passado como prestadora de serviços de telecomunicações e está a aguardar que a Anacom lhe conceda os direitos de utilização das frequências necessárias para criar uma rede telefónica privativa, de suporte aos serviços de distribuição de electricidade.

Na consulta pública que o regulador das comunicações realizou no ano passado sobre as faixas de frequências para desenvolver a quinta geração móvel (o 5G), a concessionária da rede de distribuição veio reiterar o seu interesse em obter o espectro radioeléctrico existente na faixa dos 450 Megahertz (MHz) para montar uma rede móvel com tecnologia LTE. Com ela, explica a EDP Distribuição, pretende-se assegurar as “comunicações de voz e de transmissão de informação digital” para as “actividades desenvolvidas no terreno pelas equipas responsáveis pelo despiste, reparação e reconfiguração da rede nacional de distribuição de energia eléctrica”.

A Anacom diz que “ainda não tomou uma decisão” sobre o requerimento que lhe foi enviado pela empresa, no entanto já é visível que a questão levanta resistências no sector das telecomunicações. Nessa mesma consulta, a Vodafone mostrou que vê com maus olhos a atribuição de direitos à EDP Distribuição, porque seria uma forma de dar uma “vantagem competitiva” a esta empresa face a outras do sector da energia e, em simultâneo, de desvalorizar “de forma significativa o interesse dos operadores de redes móveis na aquisição de espectro para a prestação de serviços 5G”.

Fonte oficial da empresa liderada por João Torres recordou ao PÚBLICO que a EDP Distribuição tem a seu cargo “infra-estruturas críticas essenciais para a prestação do serviço público no âmbito do sistema eléctrico nacional” e, sobre as objecções da Vodafone, sublinhou que a estratégia “passa por completar serviços de comunicações próprios com a oferta existente de serviços móveis públicos” e que a “gestão de risco associada ao fornecimento de energia assim o motiva”.

A concretizar-se, será uma rede fechada, ou seja, sem oferta comercial, e bem diferente de uma experiência antiga do grupo EDP nas telecomunicações com o BCP, quando criou a Oni (que está na génese da Oni actual), que era a dona da extinta Oniway.

Sendo a energia eléctrica “um bem essencial à sociedade e à economia”, as empresas e os reguladores devem “garantir a protecção e a integridade das infra-estruturas e processos críticos”, defendeu a empresa regulada. Assim, “há que manter e desenvolver sistemas de comunicações resilientes e seguros que, de forma integrada, confiram cobertura de áreas (em particular naquelas não cobertas pelos operadores de telecomunicações) e suportem os seus planos de continuidade de negócio nos cenários de maior impacto (ameaças/ataques criminosos, incidentes sísmicos, ou outras situações de grande vulnerabilidade social e económica)”, acrescentou a concessionária.

Se a Altice/Meo, que controla a Siresp SA (que gere a rede de comunicações de emergência), diz que são necessários “estudos adicionais e decisões” quanto à eventual utilização da faixa dos 450 MHz para as comunicações de banda larga para protecção pública e assistência em desastres (BB -PPDR), e que isso pode “condicionar o espectro disponível”, já a Vodafone considera que a atribuição à EDP deverá ser “vedada” ou “seriamente reequacionada”. A empresa sustenta que “um dos potenciais do 5G passa precisamente pela disponibilização de serviços M2M [machine to machine] e IoT [Internet of Things] a entidades como sejam a EDP, num espírito de universalidade de utilização do espectro e de possibilidade de entrega dos mesmos tipos de serviços a todos os prestadores energéticos”.

Se houver “a remoção desse potencial interesse dos planos de negócios dos operadores”, a “consequência inevitável” será “a desvalorização do interesse na aquisição do espectro para esse efeito”, refere a empresa.

Ao mesmo tempo, se entregar à EDP Distribuição as frequências que esta requereu, a Anacom estará a “garantir a esta entidade uma vantagem competitiva que, atenta a escassez do espectro e a quantidade de concorrentes eventualmente em posição idêntica à da EDP, dificilmente poderá ser replicada” para as demais empresas.

A EDP Distribuição é o braço da EDP para o mercado regulado e é a concessionária da rede de distribuição de electricidade em Portugal, embora esteja no horizonte o lançamento de concursos para as concessões municipais que poderão ditar a entrada de outras entidades neste sector de actividade.

A operadora de telecomunicações sustenta ainda que “a possibilidade de qualquer entidade do sector energético recorrer com idênticas condições a este tipo de serviços pode ser garantida através do recurso aos operadores, o que determina a não-inevitabilidade ou essencialidade deste tipo de atribuição”.

Para já, a bola está no campo da Anacom, a quem a EDP Distribuição já expôs “o modelo técnico a desenvolver, os serviços de telecomunicações privativos pretendidos e a identificação dos recursos técnicos necessários” para se constituir como um PVNO (Private Virtual Network Operator).

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