Dirigentes do Bloco alvo de insultos e de ameaças de violência e de morte nos últimos dias

Mamadou Ba foi confrontado pessoalmente por militantes de extrema-direita esta sexta-feira de manhã. Partido está com atenção redobrada em relação aos dirigentes que têm recebido mais ameaças e tem tomado algumas medidas de prevenção.

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Mamadou Ba, Joana Mortágua (na foto) e Catarina Martins são alguns dos dirigentes do BE que viram aumentar a gravidade das ameaças desde os incidentes no bairro do Jamaica

Dirigentes e deputados bloquistas têm recebido nos últimos dias dezenas de mensagens com ameaças de violência física ou mesmo ameaças de morte, insultos, críticas com pendor racista, xenófobo e homofóbico. Receber este tipo de mensagens é habitual para os políticos, mas dirigentes do BE asseguram que a quantidade aumentou significativamente nos últimos meses, e, em especial, para alguns dirigentes como Joana Mortágua, Catarina Martins ou Mamadou Ba, o volume e a gravidade aumentaram desde os incidentes no bairro do Jamaica, no Seixal. O partido está atento a acções de alguns autores mais frequentes.

Esta sexta-feira de manhã, por exemplo, o assessor bloquista Mamadou Ba foi seguido durante largos minutos por dois militantes do PNR que o esperavam à porta de um evento em que ia participar, em Lisboa. Mamadou conseguiu dizer que estava a sofrer "bullying" por parte dos dois homens, mas estes continuaram a segui-lo e a confrontá-lo, numa conversa em tom agressivo, de intimidação, mas sem ameaças concretas. O vídeo deste momento foi mais tarde partilhado nas redes sociais pelos próprios elementos que perseguiram o bloquista.

Este é apenas um episódio que está a preocupar o partido que está a ser o alvo preferencial de grupos de extrema-direita. O BE está atento sobretudo depois do incidente no bairro da Jamaica, no Seixal, e na posição pública tomada por alguns membros do partido, como a deputada Joana Mortágua ou Mamadou Ba

As mensagens chegam ao partido por via pública, nas redes sociais, mas também em mensagens directas no chat do Facebook. O PÚBLICO leu dezenas de folhas com mensagens e comentários e resume aqui alguns exemplos. "É preciso fuzilar este gajo". "Espero que o preto, filho da negra que vocifera no comboio, vá enterrar o seu lindo ca***** no seu c*. (...) sua p*** branquela"", lê-se numa das mensagens. "Não perdem por esperar, estas porcas". "Abatidos seria o caminho certo". "Vê lá se morres", escreve um utilizador. "Só espero que a próxima a ser agredida e apedrejada seja ela, aí sim vou aplaudir e defender com unhas e dentes quem praticar tão nobre acto", diz outro.

A maioria são insultos ou ameaças veladas de violência e de morte. O site Polígrafo denunciou no início desta semana que em páginas de Facebook frequentadas por agentes da PSP estavam a circular insultos e ameaças aos dois dirigentes bloquistas. A Direcção Nacional da PSP denunciou estas páginas, mas ainda continuavam activas. Além disso, a PSP disse que não deixaria passar impune quem o fizesse. Essa garantia da PSP levou o BE a desistir de apresentar queixas.

Acresce a todo o clima que o PNR convocou para esta noite um desfile até à porta da sede do BE em Lisboa, algo que a PSP vai tentar evitar. Quem aderir à concentração e conseguir chegar à sede do partido irá deparar-se com uma faixa que o BE colocou na fachada do prédio em homenagem a José Carvalho (ou Zé da Messa), dirigente do PSR (um dos partidos fundadores do BE), assassinado por skinheads há 30 anos junto à sede do partido. 

Aliás, a morte de Zé da Messa é usada por alguns autores em ameaças enviadas a dirigentes do BE. Foi o caso de uma mensagem que o dirigente do BE, Fabian Figueiredo, candidato nas últimas autárquicas em Loures, recebeu via Messenger.

Fabian vai apresentar queixa por causa desta mensagem e diz que decidiu publicar o caso nas redes sociais porque "a democracia se defende com as suas próprias regras" e é "preciso despertar consciências". "Nem eu nem ninguém no BE tem medo", acrescenta.

Para o bloquista, este é um período preocupante, porque se nota uma "reorganização da extrema-direita e do regresso da política violenta", de chantagem e do medo, como aconteceu nos anos 80 e 90. "São dados oficiais: há um crescimento da actividade da extrema-direita", recorda.

Os dados a que Fabian Figueiredo se refere estão inscritos no último Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2017, o qual confirma que houve uma intensificação da organização destes grupos com contactos com as principais tendências europeias, que houve um reforço da propaganda online e ainda a existência de iniciativas com alguma visibilidade.

O relatório destaca, nas suas conclusões, que a violência permaneceu como um traço marcante da militância de extrema-direita, havendo registo de alguns incidentes, nomeadamente agressões a militantes antifascistas. “No seio do movimento ‘skinhead’ neonazi alguns militantes continuaram envolvidos em actividades criminosas extra-militância”, lê-se. Sobre o mesmo assunto, as secretas referiam estar atentas aos novos movimentos e garantiam que as informações que recolheram permitiram "municiar o poder político e as forças e serviços de segurança com informações estratégicas sobre os novos fenómenos de extrema-direita em Portugal e Europa e, por outro lado, para auxiliar com informações táctico-operacionais a prevenção e a contenção das potenciais ameaças associadas às actividades concretas das diferentes organizações”.

E as autoridades estão a fazer o suficiente? "Estão bastante despertas para combater actividades deste tipo de grupos. Creio que os casos recentes e notícias de outros países têm despertado as forças policiais", diz Fabian Figueiredo em conversa com o PÚBLICO.

O facto de alguns dirigentes do BE denunciarem os insultos e ameaças que têm sofrido já gerou alguma solidariedade nas redes sociais. Rui Tavares, líder do LIVRE e cronista do PÚBLICO, diz que o que se tem visto em relação ao BE se trata de "assédio e ameaças" ao partido e que é preciso união "contra o ódio e a intolerância".

Rui Tavares é aliás líder de um partido que há dois anos viu membros do PNR invadirem uma das suas actividades.

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