Enquanto Chaz preparava o seu regresso...

Pelo meio da conversa com Chaz, três nomes centrais no seu universo artístico e afectivo foram surgindo. Uns transmitiram-lhe atitude, com outros cresceu e testemunhou as suas curvas e contra-curvas, outros ainda foi ele a vê-los crescer em maturidade e talento. A palavra a Chaz.

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2018 foi ano em que, de volta à Califórnia, Toro y Moi se sentava a limar os “finalmentes” de Outer Peace, o seu novíssimo disco no qual desaguam sons que já andavam na sua cabeça há mais de dois anos. Disco antiquíssimo, porém, no modo habitual (soberbo) como vai beber a várias fontes e joga com as mais amplas coordenadas da música negra americana e da electrónica (francesa, nomeadamente), pelo caminho nunca se esquecendo do mais importante: divertir-se.

Se 2017 foi um ano trágico pelas partidas que registou (Cohen, Bowie, George Michael), 2018 foi, entre outros domínios (o político, por exemplo, onde uma figura descabeladamente fascista venceu eleições democráticas num dos maiores países do mundo), um ano estranho para a música. Simultaneamente esplendoroso e cinzento, vibrante e viscoso, começou por ser o ano do avassalador regresso da editora GOOD Music e do seu fundador Kanye West. Ostentando sempre o seu ominoso chapéu MAGA (Make America Great Again), West editou, entre trabalhos por si produzidos para terceiros (Nas, Pusha T, Teyana Taylor), alguns dos melhores discos do ano em nome próprio, casos de Kids See Ghosts e Ye. Mas aquele que quanto a nós foi o grande disco do ano ainda estava para chegar: 3 de Agosto e Mac Miller fazia-nos mergulhar em SWIMMING, disco de uma pungência esmagadora na ressaca do fim de uma relação amorosa e da tentativa em se “limpar” (das drogas, das neuroses, dos pesadelos, da ansiedade). Não foi 13, mas podia ter sido: numa sexta-feira em que muitos de nós continuavam, numa prazerosa reclusão, a degustar o seu disco, soube-se que o haviam visto em posição fetal, muito sossegado, a repousar. “Come Back To Earth”, disse Miller a Prince no instante em que, quais estafetas em pleno tartan, se cumprimentavam. Piano and a Microphone 1983 trouxe-nos de volta o génio dos saltos altos numa ida e solitária noite ao piano a recriar-se e a fazer experiências – ou seja, a dar espectáculo. West mentalmente desequilibrado a protagonizar momentos absolutamente confrangedores (quando não ofensivos) enquanto lança discos estupendos (e a relançar, juntamente com o movimento Me Too, o debate sobre a separação entre artista e obra), Miller e Prince a trocarem o manto branco do fantasma – em 2018, o mundo foi um lugar estranho, de facto. Pelo meio da conversa com Chaz sobre o novo disco, os nomes acima, todos eles fundamentais para a música popular moderna, foram naturalmente surgindo aqui e ali, figuras que, geracionalmente diferentes, são centrais no seu universo simultaneamente artístico e afectivo. Algumas delas transmitiram-lhe um património e uma atitude (Prince), com outras cresceu e testemunhou as suas curvas e contra-curvas (West), outras ainda foi ele próprio, ao invés, a vê-las crescer em maturidade e talento (Miller). A palavra a Chaz.

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Prince Michael Ochs Archives

Prince

“Para mim, ele é ‘o’ gajo. Abriu o caminho para tanta gente, quebrou estereótipos e ideia pré-concebidas do que a música negra deveria ser, até do que o próprio rock deveria ser. Baralhou as fronteiras todas entre géneros... É um caminho que eu também quero seguir: um dia compor uma canção jazz, no dia seguinte fazer um grande beat, depois uma malha de house… Quero fazer música assim, como coisa universal”.

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Kanye West Taylor Hill/ Getty Images

Kanye West

“Não é assim tão estranha a forma como ele tem orientado a sua carreira. É muito ‘Kanye’, na verdade! Sou fã dele e oiço muito a sua música, continuo a par de tudo o que faz. A relação dele com a imprensa… bom, está numa posição em que se põe a jeito para que lhe ‘batam’ sempre que tenta fazer qualquer coisa. Interrogo-me sobre quando é que ele vai aprender a não ir por essa direcção! Eu venho de um lugar em que consigo perceber o que ele está a tentar dizer, mas, infelizmente, meteu-se na política... Na realidade, nem acho que esteja mesmo a tentar envolver-se na política, ele quer só ser activista. Eu penso que ele nem sabe o que está a fazer, está só a ser ‘Kanye’. Nem percebo se isto faz parte de um plano maior ou se está só a ‘trollar’! Estou curioso para ouvir nova música dele, porque se o novo álbum for mau [Yandhi, programado para ser editado no final de 2018, foi entretanto adiado ainda sem data definida], todos o vão atirar aos tubarões. Não gostei tanto do Kids See Ghosts como do Ye. Gosto muito do Ye, porque tem uma abordagem cool, é doce, tem uma vibe americana [termo que normalmente se refere a uma estética de fusão dos principais géneros tradicionais da música americana, do folk ao rythm and blues, do rock à country ou ao gospel]. Não é um dos meus álbuns favoritos dele, mas gosto muito de como o disco é afiado e, ao mesmo tempo, mantém o humor”.

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Mac Miller David Wolff — Patrick/Redferns via Getty Images

Mac Miller

“Meu… eu adorava o Mac. Ele era um tipo mesmo doce! Chorei no momento em que ouvi as notícias. Era o tipo de pessoa de que tu precisas na tua vida… e eu não digo isto sobre muita gente. A sério, não estou a dizer isto para parecer bem, mas ele era um tipo mesmo bom! Quando o conheci, ele estava a lutar para ficar clean, e isso fez-me querer conhecê-lo melhor, por o ver a trabalhar tão intensamente para as coisas ficarem bem. Ele estava extremamente positivo, foi mesmo refrescante para mim conhecê-lo! A maioria dos rappers que eu conheço só quer fazer colaborações e obter alguma coisa de ti, mas o Mac só queria mesmo sair contigo, fumar erva, fazer uma jam. E foi o que fizemos! Estávamos os dois a fazer um tour na Austrália e ele convidou-me para o quarto dele. Fizemos uns beats, nada que tenha sido editado, mas foi divertido: fumámos erva, desabafámos… É algo que nunca esquecerei”.

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