Alerta para salmoura tóxica produzida pelas centrais de dessalinização

Estudo das Nações Unidas revela que as unidades de dessalinização que permitem gerar água doce produzem, afinal, mais 50% mais de água saturada de sal do que se pensava. Além do sal, estas águas residuais contêm produtos tóxicos que podem ser prejudiciais ao ambiente.

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Central de dessalinização em construção na Califórnia, EUA Mike Blake/Reuters

Quase 16 mil centrais de dessalinização em todo o mundo produzem fluxos maiores do que o esperado de águas residuais com elevados níveis de sal e produtos químicos tóxicos que prejudicam o ambiente, revela um estudo divulgado esta segunda-feira. De acordo com este documento, as unidades de dessalinização produzem cerca de 142 milhões de metros cúbicos de salmoura todos os dias, 50% a mais do que as estimativas anteriores, para produzir 95 milhões de metros cúbicos de água doce. Quatro países do Golfo produzem metade dessa água saturada com sal que é despejada directamente no mar.

Cerca de 55% da salmoura é produzida em centrais de dessalinização que processam água do mar na Arábia Saudita, nos Emirados Árabes Unidos e no Qatar, segundo o estudo do Instituto da Água, Ambiente e Saúde da Universidade da Califórnia (UNU-INWEH), apoiado pela ONU. Esta água hiper-salgada é bombeada depois para o mar.

Se fosse possível juntar estas águas residuais ao longo de um ano, teríamos uma quantidade suficiente para cobrir o estado da Florida com 30 centímetros de salmoura, refere-se sobre a tecnologia de rápido crescimento e uso intensivo de energia que beneficia muitas regiões áridas. O Jornal El País junta mais um dado para ilustrar o artigo constatando que as centrais de dessalinização produzem uma quantidade de salmoura que seria suficiente para cobrir Espanha. Em Portugal existe a Central Dessalinizadora do Porto Santo, na Madeira, que foi pioneira e produz cerca de 6900 metros cúbicos de água potável por dia para um total de 5000 habitantes.

Esta salmoura, água que contém cerca de 5% de sal, possui ainda frequentemente toxinas, como cloro e cobre, que são usadas na dessalinização. Refira-se que, por outro lado, a água do mar possui cerca de 3,5% de sal.

Os resíduos químicos "acumulam-se no ambiente e podem ter efeitos tóxicos nos peixes", afirmou Edward Jones, principal autor do artigo e investigador na UNU-INWEH e na Universidade de Wageningen, na Holanda. A salmoura pode reduzir os níveis de oxigénio na água do mar perto de centrais de dessalinização com "impactos profundos" em moluscos, caranguejos e outros seres vivos no fundo do mar, levando a "efeitos ecológicos que podem ser observados em toda a cadeia alimentar", acrescentou. Vladimir Smakhtin, director da UNU-INWEH, explicou que este estudo faz parte de uma investigação sobre como garantir água potável para uma população crescente sem prejudicar o ambiente.

Segundo este especialista, "há muitas fontes de água subestimadas" e que vão desde a possibilidade de instalar sistemas de “colheita de nevoeiro” até ao aproveitamento de aquíferos no fundo do mar. O estudo também envolveu o Instituto Gwangju de Ciência e Tecnologia, na Coreia do Sul.

A salmoura que é produzida pelas centrais de dessalinização próximas de lagos salgados, aquíferos ou rios interiores é mais difícil de tratar do que as águas residuais das unidades que estão situadas junto à costa e que podem ser canalizadas para o mar. 

Gurpal Toor, especialista em qualidade da água da Universidade de Maryland (EUA) e que não esteve envolvido no estudo, confirma que a salmoura "pode ​​tornar-se um problema sério num pequeno corpo de água", como um lago interior. Nestas zonas do interior, acrescentou, esta água muito salgada pode ser aproveitada para irrigar plantações tolerantes ao sal, para a criação de peixe ou para produzir sal de mesa. Alex Drak, engenheiro da IDE Technologies, em Israel, uma importante empresa de tratamento de água, garante que a salmoura processada adequadamente nas centrais costeiras se dissolve rapidamente no mar. "Vemos muita vida marinha e diferentes tipos de peixes nas proximidades destas unidades, até ao ponto de descarga", disse Drak, que não participou do estudo.

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