Rocha Andrade defende que se estude uma taxa de IVA única

Ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais diz que seria preciso estudar bem a mudança e avaliar bem os “efeitos distributivos concretos” da medida.

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O deputado do PS era secretário de Estado quando o Governo baixou parcialmente o IVA da restauração Enric Vives-Rubio

O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais Fernando Rocha Andrade considera que seria positivo estudar com profundidade o cenário de Portugal deixar de ter três taxas de IVA (23%, 13% e 6%) e passar a ter uma taxa única, possivelmente inferior a 20%. Seria uma revolução e, para a concretizar, precisaria de “ser muito estudada”, afirma o actual deputado do PS em entrevista ao Negócios e à Antena 1.

O ex-governante falou desta hipótese ao ser questionado se seria positivo Portugal passar a ter uma taxa única. “Como é uma mexida gigantesca, milhares de milhões para um lado e para o outro no IVA dos produtos, podia sempre ter efeitos muito complexos do ponto de vista de distribuição. [Ia] permitir baixar muito significativamente a taxa máxima do IVA e o fim de artificialismos”, respondeu.

Na União Europeia, quase todos os países têm mais do que uma taxa (uma taxa geral e uma ou duas reduzidas). A Dinamarca é uma excepção, com uma taxa única de 25%. Fora da Europa há realidades diferentes e vários países com taxas únicas – um caminho escolhido por Angola ao decidir substituir o seu imposto de consumo pelo IVA através de uma taxa de 14% (a alteração que entra em vigor a 1 de Julho próximo).

Depois das observações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o antecessor de António Mendonça Mendes na pasta dos Assuntos Fiscais diz que seria preciso olhar para os “efeitos distributivos concretos” em Portugal.

“Eu dou sempre aquele exemplo da altura em que a lixívia com perfume pagava uma taxa e a sem perfume pagava outra. Ou, como agora temos na restauração, em que se pedir um sumo de laranja paga 23%, mas se lhe servirem uma laranja partida ao meio e um espremedor paga só 13%”, constata Rocha Andrade, que era secretário de Estado de Mário Centeno quando o Governo reduziu parcialmente o IVA da restauração. “A verdade é que é muito difícil [definir qual a taxa que se aplica] nas margens, e há sempre uma discussão muito estéril em torno do que deve ter 6%”.

Para Rocha Andrade, seria útil “estudar com profundidade se é possível sem consequências distributivas negativas fazer uma alteração que permitisse baixar para baixo dos 20% — talvez para os 18%, talvez fosse este momento o da neutralidade — e eliminar as taxas reduzida e intermédia”.

Questionado se faria sentido haver uma devolução do imposto a quem tem rendimentos mais baixos, Rocha Andrade diz que para acorrer a essas situações não se deve ir por aí, mas antes recorrer à despesa directa e não fazê-lo através do IVA. “Um mecanismo de devolução do IVA significaria que [o Estado] estaria a apoiar as pessoas mais pobres em função do seu consumo, o que não me parece um bom critério. O critério deve ser em função das suas necessidades”.

A propósito da preparação da implementação do IVA em Angola, com quem Portugal está a cooperar do ponto de vista técnico, o subdirector-geral da Autoridade Tributária portuguesa para a área do IVA, Miguel Correia, considerou a opção de Angola por uma taxa única uma “excelente decisão”, seguindo as práticas internacionais e o que a ciência económica foi aconselhando. “O que a ciência económica nos diz hoje é que o melhor caminho deveria ser uma taxa una e lidarmos com eventuais preocupações redistributivas através de despesa directa do Estado [com a receita obtida focada em determinados sectores]”, afirmou, em conversa com o PÚBLICO.

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