Nunca houve tantos alunos com bolsa de estudo

Mais de 64 mil tiveram apoio no ano passado. Subida das propinas desde 2003 é inferior à taxa de inflação.

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NFACTOS / FERNANDO VELUDO

Mais de 64 mil estudantes do ensino superior tiveram bolsa de estudo no último ano. Foi o número mais elevado de sempre. E apenas por uma vez, em 2010, o Estado canalizou mais dinheiro com acção social no superior do que no ano passado. Alunos e responsáveis do sector entendem, ainda assim, que o esforço não é suficiente.

O número do último ano corresponde a 21,2% do total de inscritos no ensino superior. É a proporção de bolseiros mais elevada desde 2010. Nesse ano, uma mudança nas regras de atribuição das bolsas de acção social reduziu o número de apoios entregue pelo Estado. Todavia, nos três anos anteriores (2008 a 2010), a percentagem de bolseiros foi sempre igual ou superior à registada em 2017.

No mesmo sentido, a despesa com bolsas no ano passado foi a segunda mais elevada de sempre: 121,7 milhões de euros. Apenas em 2010, ano de mudança das regras da acção social, os gastos com o apoio aos estudantes foram superiores. Pagaram-se então 135,8 milhões de euros em bolsas.

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O dinheiro colocado nas bolsas de estudo está em máximos históricos, mas o sector reclama por um reforço do investimento do Estado. Desde logo, porque cerca de 40% dos estudantes recebe apenas a bolsa mínima, que é suficiente apenas para pagar as propinas.

O nível da acção social existente “é insuficiente para cobrir despesas para as famílias com menores rendimentos”, defende o presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, Pedro Dominguinhos.

No mesmo sentido aponta o presidente da Federação Académica do Porto, João Pedro Videira, que aponta os números do abandono (quase 30%) e das propinas em dívida para argumentar que “muitos alunos que não são elegíveis para bolsas de acção social necessitam de facto de um apoio do Estado para estarem no ensino superior”.

Os 21% de estudantes bolseiros verificados no ano passado colocam Portugal entre os países da Europa onde esta proporção é mais baixa. De acordo com o último relatório da rede Eurydice, países como a Dinamarca e a Suécia dão bolsas a mais de 75% dos universitários. Na Irlanda, França, Espanha ou Holanda, a proporção de bolseiros está entre os 50 e 75%.

Os números não mostram uma outra realidade: é que apenas um terço do dinheiro gasto com acção social no ensino superior corresponde a um investimento directo do Estado. O resto da verba provém de fundos comunitários, através do Fundo Social Europeu (FSE), o que, na opinião de João Rodrigues, da Federação Académica de Lisboa, coloca em causa que a acção social escolar “esteja a cumprir a sua função na sua plenitude”.

A excessiva dependência do FSE é a “maior preocupação” do presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, Fontainhas Fernandes, sobretudo numa altura em que começa a ser preparado um novo quadro de financiamento europeu, em que o apoio aos alunos ensino superior não tem presença garantida. “Aqui é que o Estado não pode falhar mesmo”, sublinha.

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Os apoios do Estado têm acompanhado o aumento das propinas. Desde 2003, ano em que entrou em vigor a actual lei de financiamento do sector que estabeleceu o regime de propinas que ainda vigora, a despesa com bolsas aumentou 78,9%. No mesmo período, o número de bolseiros, apesar de alguns altos e baixos, aumentou 40%.

A subida das propinas desde 2003 é inferior à taxa de inflação no mesmo período. Em 14 anos – os dados mais recentes são de 2017 – o valor da propina máxima aumentou 183 euros (21%). Se tivesse sido actualizada tendo em conta a inflação do mesmo período, o seu valor deveria ser 43,62 euros mais elevado. Ou seja, em vez de 1063,47 euros anuais, deveriam ser 1107,09 euros.

O valor máximo e mínimo das propinas no ensino superior público é definido pela lei 37/2003 – aprovada num Governo liderado por Durão Barroso (PSD). O valor máximo tem como referência a propina de 1941 (1200 escudos, ou seja 5,99 euros). Este valor é actualizado anualmente através da aplicação do Índice de Preços no Consumidor (IPC) para o ano civil anterior, que é definido pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE). A propina atingiu um máximo de 1067,85 em 2013, tendo sido reduzida para 1063,47 no ano seguinte, por conta de uma taxa de inflação negativa. O valor tem-se mantido congelado, desde o início da legislatura, por acordo entre os partidos que apoiam o Governo no Parlamento. Em Setembro, o valor das propinas máxima vai descer 212 euros, para 856 euros anuais

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