Tchizé dos Santos esteve contra a nomeação da irmã para liderar a Sonangol

A empresária e deputada critica ainda a falta de oportunidades concedidas a africanos a Portugal, com base no preconceito.

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A empresária angolana afirma que fez de tudo para impedir que Isabel dos Santos ocupasse a função Lusa

A deputada do MPLA "Tchizé" dos Santos, filha do ex-chefe de Estado angolano José Eduardo dos Santos, afirmou esta quinta-feira que a nomeação da irmã, Isabel dos Santos, para liderar a Sonangol, não fez sentido, face ao interesse nacional.

“Não era por falta de competência [de Isabel dos Santos], pelo contrário. É porque já temos tão poucos empresários capazes de gerar os empregos que aquela empresária gerava, para que é que havia de estar a ir para o sector publico? Era muito mais fácil nomear esta grande empresária consultora do presidente do conselho de administração" da petrolífera estatal, afirmou.

A empresária Isabel dos Santos foi nomeada em Junho de 2016, pelo pai, José Eduardo dos Santos, presidente do conselho de administração da petrolífera angolana Sonangol.

“Do ponto de vista da capacidade de gestão, não há aqui dúvida nenhuma que era uma das melhores apostas a fazer. Mas do ponto de vista do interesse nacional eu acho que não fazia sentido”, enfatizou "Tchizé" dos Santos.

“Quando ela foi nomeada para a presidente da Sonangol também não concordei. Veementemente discordei e fiz de tudo para tentar impedir”, recordou a deputada que está no parlamento angolano há três legislaturas e a única presença do "clã" de José Eduardo dos Santos no Comité Central do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido no poder desde 1975.

Preconceito em Portugal

Em entrevista à Lusa, em Lisboa, Welwitschea “Tchizé” dos Santos afirmou ainda que encontra em Portugal um clima de “preconceito” para com africanos e afrodescendentes que não encontra noutros países ocidentais e defendeu uma reflexão na sociedade portuguesa sobre os “desequilíbrios” e o "preconceito", nas relações entre os dois países, ao constatar que em Angola, um português está normalmente em posição de "vantagem”​.

“Hoje, antes de vir para aqui, fui para um shopping almoçar e todas as pessoas que eu via que eram africanas, que estavam ali a trabalhar, estavam a servir à mesa, estavam nas cozinhas, algumas a dobrar roupa nas lojas. Quando chego a Angola e vou para o shopping, os portugueses que eu vejo são os donos das lojas, são os membros do conselho de administração”, criticou.

“Porque é que quando se vai a África e se vê um português, em qualquer situação ele está numa situação de vantagem, ou de igualdade na pior das hipóteses, e quando se vem a Portugal e se vê um africano ele está sempre numa posição de desvantagem”, apontou, admitindo o “ressentimento e tristeza” dos angolanos perante este cenário.

Casada com um cidadão português e com filhos luso-angolanos, “Tchizé” dos Santos diz igualmente que nos negócios que tem em Portugal nunca encontrou africanos num balcão de um banco.

“Quando vou para um banco em Portugal nunca vi nenhum negro, eu nunca fui atendida por um negro no balcão, o único que conheci que chegou a director de um banco foi o Álvaro Sobrinho [Banco Espírito Santo Angola] e foi um milagre”, criticou.

“Vou para Angola e vejo brancos em todos os níveis”, mas “curiosamente, quando se vai a um bairro recôndito onde não há nada, não se vê brancos. Só se estiver lá a vender alguma coisa, ou a fazer solidariedade ou [for] o padre”, acrescentou.

Ainda assim, critica as declarações do colega deputado angolano, David Mendes (União para a Independência Total de Angola, UNITA) que, em pleno parlamento angolano, no final de Dezembro, disse estar “farto dos portugueses” em Angola.

“Foi uma infeliz intervenção (…) Obviamente que eu não estou em Portugal para criticar os portugueses e não digo que em Angola não haja racismo, que há. Mas em Angola, quiçá o que há é ressentimento e uma tristeza por parte dos angolanos, justamente por esta desigualdade, que faz com que os povos portugueses que lá estão, e que até estão de coração aberto e de boa-fé, paguem por tabela por este desequilíbrio”, comentou.

Por isso, defende, é tempo de uma “reflexão” em Portugal sobre as oportunidades nas duas sociedades, que, ainda assim, assume, têm vindo a convergir nos últimos anos.

“Eu convidaria os portugueses todos a reflectirem, a porem a mão no coração, sobre a maneira, sobre o espaço que é dado aos afrodescendentes e aos africanos em Portugal. Inclusive solidarizo-me e fico mais triste pelos portugueses que são afrodescendentes, porque eu por acaso até me casei com um português e os meus filhos são portugueses, são afrodescendentes”, disse. "Não é uma questão de racismo, é uma questão de preconceito e de ignorância”, acrescentou.

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