Um horóscopo colectivo para 2019

Se tivéssemos feito este jogo há 20 anos, as 12 previsões não eram dominadas pela sustentabilidade do planeta. Há prova mais científica para confirmar que o optimismo é a opção certa?

Reserve as quartas-feiras para ler a newsletter de Bárbara Reis sobre o outro lado do jornalismo e dos media.

Esta é uma crónica colectiva. Fizemos um exercício com dois problemas e aplicámos um método caótico. Mas durante uma hora demos o nosso melhor a pensar nos leitores do PÚBLICO. Queríamos começar o ano com optimismo.

No primeiro dia do ano contei esta história a um grupo de amigos.

Estamos a voar quando o comandante da TAP fala ao microfone. É aquela lengalenga da altitude e precipitação. Desligo e não ouço nada até isto: “...Paula Bento, captain of this flight.” Virei-me para o meu filho e disse:

— Ouviste? A piloto é uma mulher.

— Ela consegue pilotar e falar ao mesmo tempo...?

— Não é isso. É a primeira vez que viajo num avião pilotado por uma mulher.

— A sério?!

Ouvir isto de um rapaz de nove anos faz-me acreditar que já subimos um degrau na escada da igualdade entre homens e mulheres. Ele nem percebeu o meu entusiasmo. Para ele, é tão normal uma mulher ser piloto como diplomata, juíza ou magistrada do Ministério Público, três profissões cujo acesso era proibido por lei às mulheres até 1974. Em 2030, os rapazes que agora estão na escola primária terão 20 anos. Isso é amanhã e faz-me sentir optimista. Nem tudo está a perdido.

Esta é a premissa do jogo: a partir do que aprendemos em 2018, o que nos dá confiança no futuro? Vamos procurar 12 argumentos.

Primeiro problema da mesa: o que é optimismo? Começámos com a interpretação de Daniel Innerarity, o catedrático de Filosofia Política basco: “Para se ser pessimista é preciso estar muito mais seguro do que para se ser optimista. Os pessimistas dizem que não é possível mudar, que tudo se esgotou, que a história acabou. Isso nunca me convenceu. O meu optimismo tem como base o cepticismo.” A proposta foi esmagada sem piedade, mas o contra-argumento acaba por reforçar Innerarity: a construção do optimismo faz-se a partir da racionalidade; como o ser humano é acima de tudo racional e é isso que gera o progresso, temos razões para ser optimistas.

Segundo problema: de que futuro estamos a falar? Cinco, dez ou 50 anos? Ficámo-nos por um vago “futuro próximo”.

Terceiro problema: é difícil identificar sinais animadores. Estamos rodeados de diagnósticos assustadores e todos os sinais positivos vêm com um “mas...”. Mesmo assim — como é possível mudar, como nem tudo se esgotou e a história não acabou — atrevemo-nos a propor 12 razões para ter esperança.

1. A guerra contra o plástico é irreversível. Isso vai obrigar-nos a mudar os comportamentos.

2. Os carros a diesel passaram a ser malditos. Em Portugal, um carro com motor a diesel de 1600cc e emissão de 120 gr/km de CO2 pagará mais 11,87% de imposto, muito acima da inflação. As cidades vão ser mais limpas. São uma tecnologia do passado. Há marcas que vão deixar de os produzir em 2022.

3. Veneza vai passar a cobrar uma taxa de entrada. Não é para os turistas que dormem, é para quem apenas visita a cidade (como quem chega nos cruzeiros). Será entre 2,5 e dez euros. Já é proibido estar sentado no chão da Praça de São Marcos ou nas escadas do Rialto (200 euros de multa). Ou andar de biquíni (200). Ou nadar nos canais (450). Estas medidas extremas estão a obrigar as cidades que correm o risco de ser devoradas pelo turismo — como Lisboa — a acordar. Sim, são escalas diferentes. Mas sabemos o que aconteceu em Veneza. Se não fizermos nada, o centro histórico da capital portuguesa perde todos os seus residentes e fica 100% cenário para fotografias instagramáveis.

4. Os humanos encontraram sempre soluções para os problemas no momento em que os problemas se tornam tão graves que deixam de ser sociais e passam a ser políticos. Quando se chega a esse ponto, os humanos fazem um esforço concreto e encontram soluções. Foi assim nas guerras mundiais ou no combate à sida.

5. Pouco antes de morrer, Stephen Hawking fez uma previsão apocalíptica: temos de nos tornar uma espécie multiplanetária nos próximos 100 anos e começar a viver noutros planetas. Em mil anos, a Terra passará a ser inabitável, é preciso antecipar alternativas. Pode parecer derrotista (não vale a pena lutar pelo que temos), mas sobretudo é inspirador (levem isto a sério, porque a vida na Terra é finita).

6. Em 2019, Portugal vai ter “acompanhamento técnico” da Comissão Europeia para assegurar o cumprimento das metas de reciclagem de resíduos urbanos impostas pela União Europeia para 2020. Vamos tentar sair da “lista negra”. Para isso, temos que comprar menos e reciclar melhor. Hoje, reciclamos 22% do nosso lixo. A meta europeia é reciclar 55% dos resíduos em 2025 e 60% em 2030 (quando o meu filho mais novo tiver 20 anos).

7. Por ter sentido a experiência e os resultados da nossa má gestão ambiental, a próxima geração vai criar estratégias para melhorar o mundo. Os próximos adultos vão estar mais conscientes e mais informados e, por isso, vão decidir melhor.

8. Os políticos do futuro vão deixar de ser eleitos pelos ideais económicos, mas sim pelos ideais ambientais.

9. O lado bom da histeria do #MeToo é que as mulheres estão mais seguras e os homens mais conscientes sobre o assédio sexual — e isso não altera em nada ficar ao lado de Catherine Deneuve sempre que o debate descamba para o puritanismo absurdo.

10. O lado bom da revolução digital está a dar ferramentas de comunicação a milhões e milhões de pessoas e, com elas, há progressos tangíveis, desde a produção agrícola à participação na vida democrática.

11. Em breve, vamos poder imprimir órgãos humanos em qualquer boa impressora. Será simples, rápido e barato. A tecnologia aplicada à saúde dá-nos boas notícias diárias.

12. Um estudante de 18 anos de Engenharia Física fala com o tio sobre o futuro. Sente-se pressionado pelos mais velhos. O debate sobre o que a geração dos seus pais fez e o que a sua conseguirá fazer não é linear. Nisto, o rapaz diz: “Com Engenharia Física, na pior das hipóteses percebo o mundo. Na melhor, resolvo o mundo.”

Nenhum destes amigos é da Quercus ou coisa do género. Se tivéssemos feito este jogo há 20 anos, aposto que as 12 previsões não eram dominadas pela sustentabilidade do planeta. Há prova mais científica para confirmar que o optimismo é a opção certa?

Sugerir correcção
Ler 3 comentários