Ascenso Simões propõe "relógio de ponto" para deputados e filmagem permanente no plenário

Deputado socialista enviou a Ferro Rodrigues e Carlos César um conjunto de propostas de alteração do funcionamento do Parlamento. Ascenso quer aumentar as despesas de representação dos deputados e o subsídio de trabalho político mas taxar tudo no IRS.

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Nuno Ferreira Santos

Um regime de controlo de presença dos deputados na Assembleia da República através de uma espécie de relógio de ponto nas três entradas e, no plenário, um novo registo para contabilizar o quórum e a votação, e a filmagem permanente de toda a sala. Valores mais elevados para as despesas de representação e para sustentar o trabalho político em todo o país mas que passam a ser taxados no IRS e algumas despesas pagas contra factura. Obrigatoriedade de os grupos parlamentares apresentarem orçamentos que justifiquem as finalidades dos subsídios recebidos da Assembleia da República.

A lista de propostas de alteração do modo de funcionamento da Assembleia da República é longa e ocupa vinte páginas que foram enviadas esta semana pelo deputado socialista Ascenso Simões ao presidente da Assembleia da República (PAR), Eduardo Ferro Rodrigues, e ao presidente do partido e da bancada parlamentar socialista, Carlos César.

Na carta a que o PÚBLICO teve acesso, o deputado e antigo secretário de Estado faz propostas que irão decerto receber críticas de muitos outros parlamentares, como é o caso do registo da entrada no Parlamento. Nem Ferro Rodrigues concorda com este tipo de fiscalização sobre os deputados e os líderes parlamentares também recusam qualquer recurso a dados biométricos. Há um mês, na conferência de líderes, o PAR afirmou mesmo que “não é, nem pode ser, o polícia dos deputados”.

Ascenso Simões admite que a sua proposta representa um maior controlo dos deputados. Mas considera que é a melhor forma de comprovar o trabalho parlamentar, já que este não se resume às sessões plenárias – para as quais Ferro Rodrigues propôs que se faça um duplo registo –​, mas inclui também, por exemplo, as comissões parlamentares ou audições. “A AR TV mantém uma gravação de imagem permanente de todo o hemiciclo, durante o tempo de trabalho do plenário, que pode confirmar a presença de cada parlamentar a cada tempo”, propõe ainda o deputado.

Ascenso Simões defende que o PAR, os vice-presidentes, os presidentes dos grupos parlamentares e os líderes partidários que sejam deputados não devem estar sujeitos ao regime de faltas, e que os deputados devem dispor de um total de dez dias de ausência para trabalho político externo, sem perda de remuneração, em cada sessão legislativa, desde que justificados pelas direcções das respectivas bancadas parlamentares.

No campo das remunerações, o deputado quer algumas alterações substanciais mas que, garante ao PÚBLICO quando questionado sobre um aumento da despesa do Parlamento, não oneram o bolo actualmente gasto.

Ascenso Simões responde com a simplificação, transparência e equidade das suas propostas. O salário base deve permanecer como está. Mas propõe que se aumente o montante pago aos deputados para despesas de representação dos actuais 10% do vencimento para 40%, desde que estejam em regime de exclusividade – esse valor deve passar a estar sujeito a IRS (algo que hoje não está). E também que recebam subsídio de alimentação igual ao do regime geral da função pública e o passe metropolitano de Lisboa.

Os deputados que não residam na área metropolitana de Lisboa devem receber um subsídio de alojamento igual ao que é pago aos membros do Governo e ainda um abono fixo semanal para a deslocação entre o Parlamento e a residência fiscal (pago tendo em conta a distância e o valor fixado do quilómetro para o pessoal da administração pública). Porém, para os deputados das regiões autónomas dos Açores e Madeira e dos círculos da emigração, as despesas de transporte de avião são pagas contra factura. A esta lista soma-se ainda um subsídio para o trabalho político no círculo eleitoral e no país equivalente a um quinto do salário – ou seja, cerca de 730 euros. Seria a fusão dos subsídios actualmente existentes para o trabalho político no círculo eleitoral e do subsídio para o trabalho político em todo o país, tal como propôs o também deputado socialista Jorge Lacão ao grupo de trabalho que está a analisar os apoios financeiros aos parlamentares.

O socialista também defende alterações ao regime de imunidades dos deputados, propondo que se acabe com a norma que estipula que um deputado não pode ser ouvido como testemunha ou arguido sem autorização do Parlamento e que este só possa determinar a imunidade em situações que decorram do exercício da função parlamentar. Ascenso Simões defende ainda que se acabe com o direito de uso e porte de arma e com o livre-trânsito de que beneficiam os deputados.

Mas as alterações que Ascenso Simões propõe não se ficam pelos deputados e abrangem ainda os grupos parlamentares no sentido de uma maior transparência no uso dos dinheiros públicos. Por isso, o deputado quer que os grupos parlamentares sejam obrigados a apresentar planos de actividades e orçamentos e ainda um relatório de contas anual com informação sobre as despesas de pessoal, os salários, o funcionamento e as actividades externas. Esta medida pretende evitar que o Parlamento financie os assessores das bancadas que acabam por estar a trabalhar para os respectivos partidos em vez de para os deputados.

Também o Parlamento deve ser mais transparente no seu orçamento, o qual deve passar a ser acompanhado de um plano de actividades – e este tem que ser debatido pelas comissões parlamentares e pelos deputados em plenário – e pelos orçamentos e planos de actividades das várias entidades que dependem da Assembleia da República, como a Comissão Nacional de Eleições, a ERC ou a Protecção de Dados. A cada cinco anos deve ser feita uma auditoria geral ao funcionamento da AR por uma entidade externa.

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