Democratas assumem controlo do Congresso com um primeiro desafio a Trump

A nova legislatura arranca na quinta-feira e os congressistas da nova maioria querem acabar com o shutdown, a arma do Presidente para conseguir dinheiro para o muro na fronteira com o México.

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ERIK S. LESSER/EPA

O Partido Democrata assume na quinta-feira o controlo da Câmara de Representantes (a câmara alta do Congresso dos Estados Unidos), com um primeiro desafio ao Presidente Donald Trump, votando legislação para financiar o Governo, que tem estado parcialmente encerrado, ao mesmo tempo que nega a verba que Donald Trump exige para construir o muro na fronteira com o México.

Os democratas recuperaram a maioria na Câmara de Representantes nas eleições de Novembro, o Partido Republicano manteve a maioria no Senado

Os líderes republicanos do Senado disseram que só aprovam uma proposta que o Presidente aceite. Pelo que, sem o dinheiro para a construção do muro, dificilmente a iniciativa na Câmara quebrará o impasse que mantém encerrada a actividade do Governo federal desde o dia 22 de Dezembro.

Porém, a estratégia anunciada pelos democratas acelera o início de uma era de grandes divisões em Washington, ao mesmo tempo que constitui um desafio a Trump e aos senadores republicanos — ou aceitam a proposta ou são responsabilizados pelo arrastamento do shutdown.

Os democratas planeiam usar a sua nova maioria para votarem medidas que reabram quase todas as agências federais encerradas, usando meios de financiamento com que os senadores republicanos já tinham concordado. Trata-se de uma lista de gastos feita para atribuir verbas para algumas prioridades e para uma lista de projectos de legisladores de ambos os partidos.

A proposta dos congressistas democratas só não atribuiu qualquer verba à Segurança Interna, responsável pelas fronteiras, que mantém o financiamento que já tinha, não tendo por isso dinheiro para erguer o muro. O plano que garante que as agências governamentais se mantêm abertas até Novembro só alarga o financiamento da Segurança Interna até 8 Fevereiro, de forma que os democratas possam rever dentro de um mês o financiamento para a política de imigração de Trump.

“O Presidente está a usar o encerramento do Governo para impor ao povo americano a construção de um muro caro e ineficaz, mas os democratas estão a propor duas leis que separam a questão do muro da questão do encerramento do Governo”, diz um comunicado conjunto dos líderes democratas da Câmara e do Senado, Nancy Pelosi e Chuck Schumer.

Os republicanos podem aprovar a legislação e reabrir o Governo mantendo activa a guerra do muro, mas se o fizerem retiram a Trump a sua arma de pressão para exigir os muitos milhões de dólares necessários para o construir.

Na segunda-feira, o porta-voz da maioria republicana no Senado, Mitch McConnell, disse que esta câmara só aprovará legislação que tenha a bênção de Trump. “É simples: o Senado não vai enviar nada para o Presidente que este não assine”, escreveu num email na segunda-feira à noite.

O Presidente pediu cinco mil milhões de dólares, muito mais do que os 1,3 mil milhões que os democratas pretendem votar esta semana. Na segunda-feira, Donald Trump convidou os democratas para continuarem as negociações, mas disse não pretender recuar.

“Podem vir agora, podiam ter vindo a qualquer hora. Passei o Natal na Casa Branca, passei o Ano Novo na Casa Branca. Estou aqui, estou pronto. É muito importante”, disse Trump numa entrevista à Fox News na segunda-feira. “Não vamos desistir. Temos de ter segurança na fronteira, e o muro é uma parte muito importante da segurança na fronteira.”

A Casa Branca não comentou esta iniciativa do Partido Democrata no Congresso, mas um dos maiores aliados de Trump no Congresso, Mark Meadows, rejeitou a iniciativa democrata. “A nova proposta de financiamento de Nancy Pelosi não é uma tentativa séria para se chegar a um compromisso ou para garantir a segurança na fronteira”, escreveu Meadows no Twitter. Disse que não era “um bom começo” nem “uma resposta legítima para acabar com o impasse”.

Esse impasse tornou-se o maior encerramento, ainda que parcial, do GGoverno desde os 16 dias de shutdown em 2013, devido ao plano de saúde de Barack Obama (conhecido como Obamacare). 

De momento, são 800 mil os funcionários federais afectados, 350 mil deles estão em casa, com licenças temporárias, outros têm trabalhos considerados “essenciais”. Até agora não houve falhas nos salários, mas podem deixar de receber se o impasse se prolongar. Muitas empresas contratadas pelos serviços federais também estão sem trabalho.

“Neste momento há sobretudo ansiedade: quando é que isto se resolve?”, disse o congressista Gerald E. Connolly, um democrata do Norte da Virginia (perto de Washington D.C.), onde vivem dezenas de milhares de funcionários federais. 

A Federação Americana de Funcionários Federais, o maior sindicato da função pública que representa 700 mil trabalhadores, anunciou na segunda-feira que vai processar o Governo por causa do shutdown — o Governo “está a violar a lei ao exigir que os funcionários públicos trabalhem sem receber”, escreveu num comunicado. No pacote que os democratas querem aprovar está incluído um aumento de 1,9% para os funcionários civis que Trump rejeitou.

No início de Dezembro, os republicanos no Senado aceitaram um plano que evitava o encerramento do Governo, mas que não incluía a verba para o muro. No dia seguinte, Trump disse que não aceitava o plano. McConnell não quer que os “seus” legisladores passem por esta situação novamente. 

A construção do muro ao longo da fronteira com o México foi uma das principais promessas de Donald Trump na campanha eleitoral de 2016 e no início da sua presidência, tendo chegado a garantir que o México pagaria a obra. Depois pediu que a verba saísse dos cofres públicos. Pelosi disse que o muro é “imoral” e garantiu que a nova maioria não o aprovará. 

Trump desistiu de ir de férias para o seu clube em Mar-a-Lago, em Palm Beach, na Florida, para ficar em Washington e resolver o shutdown, mas não teve contactos com a liderança democrata. Não houve negociações directas desde que, a 22 de Dezembro, o vice-presidente, Mike Pence, realizou reuniões no Capitólio. Pence propôs aos democratas baixar os gastos com o muro, mas estes rejeitaram.

Apesar de o Partido Republicano ter maioria no novo Senado, são necessários alguns votos democratas para aprovar legislação sobre fundos, e alguns democratas são veementemente contra gastar-se dinheiro no muro. Isso ficou claro nas eleições legislativas de Novembro, quando Schumer perguntou aos senadores democratas o que pensavam de se gastar cinco mil milhões de dólares no muro, em conversas no seu gabinete no Capitólio. Muitos senadores democratas disseram-lhe que estão dispostos a aprovar uma verba para a segurança nas fronteiras, mas não o pedido por Trump, disse uma fonte próxima do processo. 

As agências federais afectadas pelo shutdown constituem 25% do Governo que é financiado pelo Congresso. O Pentágono não é afectado, uma vez que o seu financiamento foi aprovado e ratificado por Trump no início de 2018. O Congresso e o Presidente também aprovaram legislação para financiar os departamentos do Trabalho e da Saúde, entre outros, antes de Trump exigir o dinheiro para o muro. Outros programas federais, como os de assistência na saúde (Medicare e Medicaid) e a Segurança Social, têm financiamento automático, que não precisa de ser revisto anualmente pelo Congresso. 

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

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