2019, o ano da verdade

A tendência para a fragmentação e pulverização de poderes vai estar ao rubro em 2019

A 1 de Janeiro Jair Bolsonaro toma posse como Presidente do Brasil e é sob esse signo inaugural que irá decorrer 2019 como ano da verdade. De facto, o significado do fenómeno Bolsonaro ultrapassa largamente as fronteiras do país onde ocorre, pondo à prova o populismo extremista e nacionalista em vertiginosa ascensão no mundo em 2018 e que terá um dos seus testes decisivos nas próximas eleições europeias. Se a isso juntarmos o beco sem saída do "Brexit", a Europa poderá ver a sua já famosa "crise existencial" transformar-se na implosão de um projecto unitário longamente corroído pela eurocracia institucional e pela diluição da identidade dos velhos e novos partidos europeus – à direita, à esquerda ou ao centro –, proporcionando a afirmação dos agressivos soberanismos nacionalistas (mesmo que as forças que os representam não se tornem imediatamente maioritárias no Parlamento Europeu ou sejam acompanhadas, nalguns países, pelo ressurgimento de movimentos ecologistas).

Pairando sobre estas sombras inquietantes, o triângulo autocrático dos senhores do mundo – Trump, Putin e Xi Jinping – tenderá a conduzir a um ponto eventualmente incontrolável os vários jogos de guerra que vão encenando. Neste quadro, os jogos de simulação e disfarce para esconder cumplicidades inconfessáveis, como aqueles que praticam os líderes russo e norte-americano, poderão revelar-se tão perigosos como os outros. Recorde-se, aliás, que na sua conferência de imprensa de fim do ano, Putin voltou a agitar o espantalho de um conflito nuclear ao mesmo tempo que saudava Trump pela sua decisão de sair da Síria, apesar da oposição do Pentágono e do Congresso. A "estratégia" cega do sonambulismo que conduz aos conflitos mais devastadores parece estar efectivamente de volta. Além disso, tudo indica que as tendências ditatoriais e os apetites totalitários em expansão acelerada à escala global constituem um pano de fundo propício ao desencadear de disputas territoriais ou à afirmação de supremacias regionais, do Médio ao Extremo Oriente, da Turquia aos mares da China.

A tendência para a fragmentação e pulverização de poderes vai estar ao rubro em 2019, com o risco acrescido dos passos para o abismo, enquanto a maior potência planetária se vê cada vez mais remetida às pulsões paranóicas do seu Presidente. Trump parece ter desafiado já todas as leis da gravidade que lhe permitiriam manter-se ao leme da Casa Branca e, nos últimos tempos, elevou esse desafio a patamares de irrealidade pura e simples, enquanto os membros da sua equipa vão desertando e ele mergulha num autismo total de exercício do poder através de tweets de um infantilismo cada vez mais absurdo e irresponsável. 2019 será, finalmente, o ano do «impeachment»? Se o mundo fosse governado pela racionalidade, isso já teria acontecido, mas parece duvidoso, apesar de tudo, que Trump possa sobreviver politicamente a mais um ano de insanidade e auto-isolamento crescente no Gabinete Oval.

Já se sabia que as redes sociais alimentam o autismo, a deriva e a rarefacção dos poderes, mas nunca sonhámos que o fenómeno pudesse atingir as proporções catastróficas que hoje conhecemos, como contraponto a uma globalização que criou uma enorme massa de excluídos (ou favoreceu a interiorização do sentimento de exclusão) através dos quatro cantos do planeta. É porventura o fenómeno mais inquietante do nosso tempo e que transcende largamente a esfera política, económica e social, corroendo a esfera da liberdade e autonomia individual. A ascensão vertiginosa do poder da irracionalidade condiciona o futuro da civilização e é também por isso que 2019 irá ser o ano da verdade das tendências suicidárias a que vimos assistindo num mundo contemporâneo colonizado pelo medo. Nunca é tarde para acordar? Infelizmente, pode ser.         

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