O Bloco Central – das negociatas – na prisão

Estaremos a assistir, no nosso país, ao fim da absoluta impunidade de políticos pela prática de crimes como a corrupção e o tráfico de influência?

Anuncia-se para o início do ano de 2019 a entrada na prisão de Armando Vara, do Partido Socialista, e de Duarte Lima, do Partido Social Democrata, para cumprirem as respectivas penas a que foram condenados pela prática de crimes de colarinho branco.

Armando Vara foi constituído arguido em Outubro de 2009 no âmbito da operação Face Oculta e condenado em primeira instância, em 5 de Setembro de 2014, na pena de cinco anos de prisão efectiva. No passado mês de Novembro, terá sido decidido o último recurso possível no Tribunal Constitucional pelo que, a qualquer momento, a partir do fim das férias judiciais em 3 de Janeiro, podem ser emitidos os mandados de condução ao estabelecimento prisional.

Duarte Lima, pelo seu lado, foi detido pela Polícia Judiciária em 17 de Novembro de 2011 e condenado, na primeira instância, em 28 de Novembro de 2014, a dez anos de prisão no caso Homeland. O Tribunal da Relação de Lisboa baixou a pena de dez anos para seis anos de prisão em 1 de Abril de 2016. No passado dia 18 de Dezembro, o Tribunal Constitucional rejeitou o que será o último recurso possível pelo que, em princípio, os mandados de condução também poderão ser emitidos a curto prazo.

Como é do conhecimento geral, ambos os políticos, no seu próprio entender, são bodes expiatórios sacrificados no altar da Justiça já que ambos se declaram inocentes. De resto, este afã da Justiça em perseguir inocentes confirma-se com o facto de cada um deles ter, pelo menos, mais um processo-crime pendente. Em Janeiro será proferida sentença no processo em que Duarte Lima é arguido por abuso de confiança, acusado de se ter apropriado de mais de cinco milhões de euros de Rosalina Ribeiro — a secretária do milionário Lúcio Feteira que, posteriormente, foi assassinada no Brasil (processo em que Duarte Lima é igualmente arguido). Armando Vara, pelo seu lado, tem pela frente a instrução do processo da Operação Marquês que não será, seguramente, levado a julgamento em 2019. Mas, muito provavelmente, em 2019, irá saber-se qual a narrativa conforme com a realidade, no entender do juiz Ivo Rosa: se a dos arguidos, se a do Ministério Público, o que, por si só, já torna o ano novo crucial em termos judiciais.

Quanto ao processo Face Oculta, Armando Vara veio, agora, insinuar publicamente que a sua condenação se deveu ao facto de não ter feito um favor ao juiz de instrução Carlos Alexandre, o que, para qualquer pessoa minimamente informada sobre o sistema judicial português, não pode deixar de ser entendido como uma verdadeira confissão de culpa.

Duarte Lima, por sua vez, aquando do início do julgamento em 2013, foi contundente ao afirmar que “na comunicação social, durante ano e meio, quem violou sistematicamente, desde o princípio, o segredo de justiça, ajudou a construir uma narrativa sobre este caso que produziu condenações antes sequer de haver acusação, procurando subverter o sentido que preside ao funcionamento da Justiça num Estado de Direito”, mas acrescentou que, perante o tribunal, ia exercer-se o contraditório pela primeira vez, e que a sua contestação fazia “uma demonstração exaustiva das razões de facto e de direito que evidenciam a falta de fundamento da acusação formulada pelo senhor procurador Rosário Teixeira, nomeadamente, a imputação de burla ao BPN”. O resultado não foi certamente o que esperava, mas não lhe são conhecidas declarações sobre a sua condenação, para além de a sua defesa a considerar um “tremendo erro judiciário”.

Estes dois políticos de origens humildes que passaram a frequentar o selecto mundo das offshores, graças às suas próprias qualidades e à rede de contactos e amizades, são, tanto quanto me recordo, os primeiros políticos com relevo nacional que irão cumprir pena de prisão, depois do já longínquo Costa Freire, secretário de Estado de Leonor Beleza e de Isaltino Morais, que estava (e está) à frente dos destinos de Oeiras. É legítimo perguntar: estaremos a assistir, no nosso país, ao fim da absoluta impunidade de políticos – e também de empresários e dirigentes desportivos – pela prática de crimes como a corrupção e o tráfico de influência? Ou serão só dois casos pontuais de políticos que foram abandonados pelos seus pares? A ver vamos...

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