Mãe vendeu quatro recém-nascidos por mais de 80 mil euros

“A PJ tem a percepção de que eram geradas para serem vendidas”, diz director daquela polícia no Norte.

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Kate Krivanec

A Polícia Judiciária não sabe ainda quem é o progenitor das quatro crianças que terão sido vendidas por pouco mais de 20 mil euros cada uma e algumas contrapartidas menores. Pode ser o companheiro da mulher que as gerou, mas também podem ser elementos masculinos dos casais que as compraram. A detenção da mulher e do seu companheiro foi anunciada nesta quinta-feira pela PJ do Norte.

Tudo partiu de uma denúncia anónima recheada de “informação concreta” sobre aquela mulher, de 41 anos. Nos últimos anos, estava quase sempre grávida, mas não se via embalar qualquer criança. O director da Polícia Judiciária no Norte, Norberto Martins, não sabe se usaria sempre a mesma desculpa. Apenas que nalgumas vezes terá dito que morreram logo a seguir ao parto.

Entre 2011 e 2017, teve quatro crianças. Segundo Norberto Martins, “a PJ tem a percepção de que eram geradas para serem vendidas”. Falta saber se por encomenda. Só os futuros testes de ADN poderão determinar se o companheiro, de 45 anos, era o pai biológico ou se o pai biológico era outra pessoa, incluindo, como já se disse, o elemento masculino dos casais que as compraram.

A progenitora e o namorado têm uma relação afectiva há mais de uma década. Não moram, porém, juntos. Ela vive no Porto e ele em Vila do Conde. Ela trabalha em pastelaria e ele em construção civil.

Vendidas ainda recém-nascidas, as crianças foram registadas como filhas dos casais compradores. Os inspectores já sabem onde se encontram. Foram mesmo feitos contactos com as autoridades dos seus locais de residência. "Por estratégia policial", Norberto Martins não os revela. A esse respeito, diz apenas que as crianças estão dentro da Europa.

Quando se lhe pergunta o que acontecerá a essas crianças, o procurador lembra que, “do ponto de vista policial, interessa a investigação criminal”. Enquanto cidadão com um longo percurso na defesa dos direitos das crianças, recorda que não é imperativo serem retiradas a quem as comprou.

“Tem de se considerar o ponto de vista destas crianças”, enfatiza. “Uma coisa é intervir quando uma criança tem dias ou meses, outra é quando tem seis ou sete anos e foi bem tratada.” Nada disso impede a polícia de investigar quem as comprou ou os tribunais de as julgar por tráfico de pessoas.

O casal foi indiciado por quatro crimes de tráfico de pessoas e quatro crimes de falsificação de documentos. Já foram interrogados pelos inspectores. E iam ser presentes à autoridade judiciária para primeiro interrogatório judicial e aplicação de medidas de coacção tidas por adequadas.

Prioridade é a investigar tráfico de pessoas

Quando tomou posse como director da Polícia Judiciária do Norte, Norberto Martins elegeu entre as suas prioridades a investigação de crimes de tráfico de pessoas. No seu entender, quando o objectivo é a adopção, “a moldura penal é manifestamente desadequada – é entre um ano e cinco anos de prisão, está ao nível do furto”. Passa a ser de três a dez anos quando há intenção de submeter a vítima a alguma forma de exploração, como a exploração sexual, a exploração do trabalho, a mendicidade ou a extracção de órgãos.

Já foi mais grave, em 2004 a Polícia Judiciária deparou-se com casos de tráfico de bebés no distrito de Coimbra e o Código Penal ainda não contemplava tráfico de crianças que não para exploração sexual. Na altura, equipas de várias maternidades assumiram já ter abortado tentativas de entregar filho em troca de dinheiro, roupa, comida ou a mera garantia de uma vida melhor para a criança.

De acordo com o último Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), as autoridades portuguesas sinalizaram em 2017 um total de 45 crianças e jovens presumíveis vítimas de tráfico em Portugal – para fins de exploração sexual, adopção ilegal, mendicidade forçada, mendicidade e gravidez/coacção para adopção ilegal, escravidão e prática de actividades criminosas.

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