Filipe Raposo e Rita Maria mostram ao vivo de que é feita a arte das canções

Gravaram um disco juntos na Noruega, Live In Oslo, e vão mostrá-lo esta terça-feira no Hot Clube, em Lisboa. É o começo de uma aventura maior, em vários discos, chamada The Art of Song.

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Filipe Raposo e Rita Maria em concerto RUI DIAS

Filipe Raposo e Rita Maria, ele pianista e ela cantora, estavam condenados a encontrar-se. “Quando eu estava a fazer um mestrado em Estocolmo”, diz ele, “a Rita passou por lá a fazer uma tournée com o Stockholm Lisboa Project, em 2015, e foi a primeira vez que decidimos encontrar-nos.” Trocaram mensagens, com poemas do António Ramos Rosa, e juntaram-se num café. Filipe glosa um poema de Teresa Muge, Havemos de nos ver outra vez, para concluir: “Os amantes artísticos reconhecem-se à distância pelas afinidades que possuem. Nesse momento, soube que tínhamos um projecto pela frente.”

Chegou a Portugal e, dois meses depois, Catarina Molder estava a convidá-los para gravarem para o programa dela, de ópera, uma ária de Händel. “Começámos a marcar concertos, a responder a convites que nos foram feitos (incluindo a Festa do Jazz no São Luiz).” E aqui surgiu Oslo, um concerto na Cosmopolite, em Novembro de 2017. Os dois, só voz e piano. “Supostamente, não era para ser gravado. Mas como percebemos que havia boas condições para gravar, falei com o técnico e pedi-lhe para fazer uma gravação em wav, estéreo.” Depois ouviram, soou-lhes muito bem, e, falando com outro técnico, perceberam que podia ser masterizado. “E de repente tínhamos um disco!” 

Portugal, jazz, cinema

O disco, Live In Oslo, ainda não tem edição física mas já está nas plataformas digitais. E nele há uma confluência de géneros, que vão do cancioneiro popular português (Oh Bento airoso, En tu puerta, Senhora do Almortão) ao norte-americano e ao jazz (Moon river, My favorite things, Sea lady, Goodbye pork pie hat), passando por temas de José Afonso (Redondo vocábulo) ou Zeca Medeiros (Canção da terra) até composições de Gabriel Fauré (Après un rêve) ou Henry Purcell (Here the deities approve).

É, diz Filipe, um alinhamento com objectivos dramatúrgicos. “Queríamos trazer as nossas referências, que passam pela música erudita, pela música tradicional e pelo jazz. O que é uma vantagem muito grande, porque o público normalmente também é heterogéneo nos gostos e esta é uma maneira de cativar várias parcelas do público. Em concerto, explicamos a importância destas referências para nós. Quando falamos da Senhora do Almortão, falamos da raiz. E quando falamos do Smile ou do Moon river, falamos sempre da relação com o cinema e do cinema como uma forte inspiração para nós.”

No caso dele, o cinema está muito presente, há anos. “Foi estruturante no meu percurso artístico, pelo contacto com a Cinemateca. Já são 14 anos a acompanhar filmes mudos, e isto deixa marcas.” E há já edições em DVD a prová-lo: Lisboa, Crónica Anedótica (Leitão de Barros, 1930) e O Táxi n.º 9297 (Reinaldo Ferreira, o Repórter X, 1927), editados em 2017 e 2018, respectivamente, ambos com música composta por ele.

Sentir a arte das canções

Rita Maria, retomando o fio condutor do espectáculo, acrescenta: “Acho que isto, no fundo, para além de ser um pot-pourri de influências comuns, é também uma semente para aquilo que está para vir na nossa colaboração, que é The Art of Song, um conceito que nós queremos desenvolver a partir daqui. Digamos que este é um disco de estreia, numa visão muito generalista, daquilo que vamos aprofundar.” A ideia é fazer vários volumes, explica Filipe: “Costuma fazer-se a síntese no final, mas aqui a síntese antecede aquilo que virá, com The Art of Song volumes 1, 2, 3, com temas específicos.”

Com voz, piano ou outros instrumentos, se virem que serão necessários. “A base é voz e piano e é um projecto que queremos desenvolver a médio e longo prazo, em termos de consistência artística. Talvez possa haver até uma orquestra.” Exemplificando: “Um dos volumes terá dez árias barrocas e um fado, por exemplo. Que dará início ao seguinte, com dez fados e uma morna. Vamos colocar-nos em determinadas temáticas e depois no fim haverá sempre uma canção a indiciar o que vai acontecer no próximo volume.”

O primeiro disco deste projecto sairá em 2020. Até porque, em 2019, Filipe vai lançar um novo disco a solo (dia 29 de Março, no Festival de Jazz do São Luiz). E Rita Maria conta lançar também um disco a solo, mas em 2021. No concerto do Hot Clube, esta terça-feira, a base será o repertório de Live In Oslo, mas não deverão ficar-se por aí. Rita Maria: “Há uma certa dose de surpresa que gostamos de preservar e que, no fundo, também define esta nossa interacção.” Live In Hot, pois, que Oslo já deu o mote.

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