Francisca Van Dunem: “A recuperação não pode ser feita integralmente neste tempo legislativo”

“Não questiono, de todo, o direito à greve, mas apenas o momento”, disse esta quarta-feira a ministra da Justiça em relação ao protesto dos guardas prisionais.

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Daniel Rocha

Em entrevista à RTP na noite desta quarta-feira, a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, afirma que as cedências aos sindicatos do seu sector devem ser “fazíveis do ponto de vista financeiro”.

“Não me sinto cercada”, começou por afirmar, a propósito dos vários protestos na área da justiça. A ministra considera “natural” que as estruturas sindicais tenham agendado greves “quase no final do ano que precede ano eleitoral”. Avisou, contudo, que “obviamente a recuperação não pode ser feita integralmente neste tempo legislativo”.

Questionada sobre a greve dos guardas prisionais, Francisca Van Dunem mantém a posição que já antes tinha assumido: “não questiono, de todo, o direito à greve, mas apenas o momento”.

“É óbvio que há uma função de manutenção da ordem deve ser assumida com intransigência, mas também com um grau de humanidade e compaixão”, afirma, referindo-se aos períodos de visitas e à paralisação dos guardas prisionais na altura do Natal, impedindo os reclusos de celebrar com as famílias.

Salientando que as reivindicações têm sido ouvidas, a ministra sublinhou: “a seguir precisamos de ter o nosso tempo para ver se o que os guardas prisionais querem será fazível do ponto de vista financeiro”, referindo-se, por exemplo, à equiparação à PSP.

É necessário "renovar o debate" sobre os Direitos Humanos

Na sequência de relatórios sobre Direitos Humanos que apontaram algumas falhas a Portugal, nomeadamente que salientaram algumas falhas de Portugal em matéria de Direitos, a ministra recordou que “do ponto de vista institucional, Portugal procura cumprir os princípios da carta.”

Francisca Van Dunem foi mais longe, recordando os 40 anos da adesão de Portugal à Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que impôs aos estados membros do Conselho da Europa vários mecanismos de controlo da sua aplicação “a um nível mais micro, no concreto”, como a situação dos sistemas prisionais ou o combate ao racismo e à discriminação de minorias. “Trata-se de cumprir e de responder pelo incumprimento”.

A ministra salienta ainda que as várias cerimónias evocativas de tratados e marcos históricos têm, sobretudo, chamado a atenção para a necessidade de “renovar o debate” sobre as questões de Direitos Humanos. “O tempo passa e a memória parece que apaga tudo.” “Houve momentos da História da humanidade em que nenhum foi respeitado, a não ser a força.”

Ministra não questiona direito de greve dos juízes

Francisca Van Dunem não questiona a legitimidade da greve dos juízes, ao contrário do que têm defendido alguns constitucionalistas. “Enquanto magistrada do Ministério Público já fiz greve”, afirmou. “Compareci no meu trabalho, comunicando para efeitos de desconto que naquele dia estava em greve.”

Afirma que “houve consensos muito importantes em matérias estruturantes”, que foram “resolvidas no estatuto”, mas que a parte excluída do consenso foi a parte da componente remuneratória. “A grande alegação dos juízes é de que não tinham perspectiva de carreira”.

As limitações financeiras pontuaram várias das respostas ao longo da entrevista, com a ministra a admitir a dependência do Ministério das Finanças para a tomada de posições.

Recordando que o país “tem um histórico de dificuldades financeiras”, que “todas as intervenções que impliquem encargos financeiros, encargos para o futuro”, têm que ser “estritamente articulado com ministério das finanças”, que tem uma “dimensão global”.

"Não se pode dizer que Portugal seja um país de corruptos"

A ministra da Justiça lê o aumento de casos de corrupção como resultado do reforço dos instrumentos de denúncia e da maior especialização do sistema. “Não se pode propriamente dizer que Portugal seja um país de corruptos.” “A percepção que tenho é que as pessoas acreditam mais na actuação do Ministério Público”.

Sobre os quadros “reduzidos e envelhecidos” da Polícia Judiciária, com uma “idade média de 48 anos”, Van Dunem relembrou que “neste momento está em curso a formação de 147 novos inspectores, e temos a perspectiva de continuar a refrescar os quadros da PJ”.

No que toca à divulgação de imagens dos interrogatórios judiciais, a ministra considera que “mesmo em processos sem segredo de justiça deve haver ponderação em tornar públicos os interrogatórios”.

“O objectivo de gravação desse tipo de interrogatórios nunca teve como perspectiva a exploração comercial”, aponta. “Quem está num interrogatório está num contexto muito específico de condicionamento e constrangimento, e não tem a mesma leitura no espaço comunicacional.”

Rejeitou, no entanto, comentar as declarações de José Sócrates de que houvesse uma intenção política por detrás da divulgação do seu interrogatório.

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