Metade das casas destruídas pelo fogo em Monchique corre risco de ficar por recuperar

Os pareceres negativos do ICNF à construção em zonas de áreas protegidas, levam a câmara a colocar em causa o efeito prático das medidas de 2,3 milhões lançadas pelo Governo.

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LUSA/FILIPE FARINHA

O Governo vai disponibilizar uma verba de cerca de 2,3 milhões de euros para a reconstrução das habitações destruídas pelo fogo de Monchique. O início dos trabalhos não tem data para começar, nem há prazo para terminar as obras. “Tenho sobre a minha secretária um monte de processos, que vieram do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) com parecer negativo”, diz o presidente da Câmara de Monchique, Rui André, receando que metade das 52 casas na lista a reabilitar, não tenham sequer condições para vir a ser licenciadas, por falta de enquadramento legal para construir ou reabilitar em áreas protegidas. O protocolo de cooperação entre a administração central e a autarquia, para ajudar as vítimas do incêndio, foi assinado esta quarta-feira, quatro meses depois sobre os fogos.

A secretária de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza, Célia Ramos, em declarações aos jornalistas depois da cerimónia, indirectamente respondeu às críticas do autarca: “A legislação não se vai alterar por causa da situação de Monchique”, disse. O que defende a governante é um programa de ordenamento da paisagem que passa pela “contenção do povoamento disperso e uma aposta na concentração de pessoas”. Rui André teme que este modelo de ordenamento, sem ter em conta a vivência do mundo rural e o histórico de cada monte e aldeia, acabe por acelerar o despovoamento do interior, deixando o país ainda mais vulnerável aos incêndios: “Espero que, de uma vez por todas, se crie medidas de discriminação posição para fixar as pessoas neste território”, enfatizou.

A Câmara de Monchique fez um levantamento em todo o concelho e detectou 8820 construções implantadas que desrespeitam a lei de protecção contra incêndios – situadas a menos de 50 metros do terreno do vizinho. Nos casos em que os interessados submeteram projectos para reconstruir ou ampliar as casas, sublinhou o autarca, “o ICNF, quando consultado para efeitos de licenciamento, em todas as situações emitiu parecer negativo”. Logo, prevê, os processos para reconstrução das habitações destruídas, correm o risco de vir a arrastar-se no tempo, ou ficarem pelo caminho.

Os municípios algarvios estão a rever os Planos Directores Municipais, mas a situação não deverá sofrer grandes alterações em relação à construção dispersa nem são esperadas medidas de fixação nos territórios de baixa densidade. “O solo rural é para fazer agricultura, não é para estar habitado”, lembrou Célia Ramos, argumentando que os novos aglomerados, a criar a médio e longo prazo, devem ser planeados de forma concentrada por ser “menos onerosa” a criação de serviços e infra-estruturas públicas.

A secretária de Estado da Habitação, Ana Pinho, também presente na cerimónia, procurou desvanecer as reservas manifestadas pelo autarca em relação ao apoio a dar 95 pessoas que viram as casas afectadas. “No caso de haver uma situação em que não possa ser reabilitada a habitação, a família continua a ter total apoio seja para relocalizar a sua habitação, ou para qualquer outra situação possível.” Por seu lado, Célia Ramos acrescentou: “A floresta tem de ter pessoas e tem de ter actividade, não quer dizer é que as pessoas estejam no meio da floresta”.

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