Solução para os media? Investigador propõe jornalistas a formar leitores de todas as idades

“Acho que faz todo o sentido o Estado intervir porque é do seu interesse ter pessoas críticas”, diz Vítor Tomé. O jornalista e investigador assinala, contudo, que “uma coisa é dar dinheiro aos media em troca de nada” e outra é “remunerar as empresas [jornalísticas] por esta formação” dos leitores.

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Joana Goncalves

Um investigador na área dos media defendeu nesta terça-feira, como uma possível solução para o sector, a literacia dos leitores de todas as idades através de formações dadas por jornalistas, cujas empresas receberiam apoios do Estado para promover tais acções.

“É preciso formar leitores e isso passa por educar as pessoas, numa lógica integrada, desde que nascem. Além da escola, os media poderiam ter um papel nessa equação e essa seria uma forma de o Estado os financiar por esse serviço prestado à sociedade”, disse à agência Lusa o jornalista Vítor Tomé, formador e investigador nas áreas da Literacia dos Media e do Jornalismo.

O professor universitário observou que “o Estado já está a investir em literacia porque já tem a escola pública, mas faltam pessoas essenciais na equação, os jornalistas”. “Penso que os media têm um papel na formação das pessoas e estes são cidadãos de todas as idades, não só crianças nas escolas, como também adultos”, acrescentou.

A seu ver, isso poderia ser “parte da solução para a crise no sector porque era uma lógica de dupla entrada: os media seriam financiados sem haver uma intervenção directa do Estado na gestão dessas empresas e, ao mesmo tempo, haveria leitores mais informados”.

Foi, em parte, esta falta de literacia que levou à crise no jornalismo, segundo Vítor Tomé, que disse “desconhecer” modelos de negócio sustentáveis sem serem baseados nos leitores, ou através da compra de jornais, ou de assinaturas neste e noutros formatos. A juntar a isto, está “a sensação que há que tudo o que está online é gratuito”. “Se as pessoas reconhecerem o valor do jornalismo, as pessoas poderiam pagar para ter esse jornalismo”, referiu o investigador.

A posição surge depois de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter questionado durante a entrega dos prémios Gazeta, na semana passada, se o Estado não tem o dever de intervir face à crise da comunicação social, considerando que há uma “situação de emergência” que já constitui um problema democrático e de regime.

“Acho que faz todo o sentido o Estado intervir porque é do seu interesse ter pessoas críticas. Um público informado não embarca em notícias falsas”, vincou Vítor Tomé. Ainda assim, o especialista assinalou que “uma coisa é dar dinheiro aos media em troca de nada” e outra é “remunerar as empresas por esta formação” dos leitores.

Formar professores para formar alunos

Vítor Tomé é um dos participantes num projecto de literacia dos media que arranca em Janeiro, resultante do 4.º Congresso dos Jornalistas Portugueses (realizado no ano passado em Lisboa), e que será financiado pela Direcção-Geral de Educação e pelo Centro Protocolar de Formação Profissional para Jornalistas (Cenjor), contando com o apoio da Presidência da República. “Há aqui uma abertura [do Estado] para estas iniciativas”, notou o especialista.

Também em declarações à Lusa, a presidente do Sindicato dos Jornalistas, Sofia Branco, explicou que essa iniciativa recebeu o “apoio desde sempre” destas instituições e abrangerá até 100 professores de cinco escolas piloto do continente.

Os estabelecimentos de ensino em causa são o Agrupamento de Escolas Tomás Cabreira (Algarve), o Agrupamento de Escolas n.º 2 de Évora (Alentejo), o Agrupamento de Escolas António Sérgio (Centro) e a Escola Secundária Adolfo Portela e o Agrupamento de Escolas do Cerco do Porto (Norte). A estas escolas serão alocados dez formadores, em equipas constituídas por um jornalista no activo e por um professor universitário especialista em media. Previsto está que, ao longo e depois da formação (que durará quatro a cinco meses), os professores destas escolas do ensino básico e secundário criem actividades com os seus alunos, no âmbito da disciplina de Educação para a Cidadania.

Sofia Branco notou ainda que a área do ensino acaba por ser “outra ocupação para jornalistas”, dado o desemprego existente no sector, resultante da crise.

Relativamente a essa crise, e no âmbito do Orçamento do Estado para 2019 (OE 2019), a Associação Portuguesa de Imprensa apresentou aos partidos uma proposta para a criação de benefícios em IRS para quem comprar jornais e revistas e em IRC para pequenos anunciantes que publicitem nestes meios.

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