Sardenha, um postal com vida

A leitora Ana Trigo partilha memórias do seu Verão em Itália.

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Sentada num muro de pedra, esperava Fabrizio, que nos daria as chaves do nosso apartamento, enquanto observava com uma pontinha de incredulidade e deslumbramento a paisagem desconhecida à minha volta, com o leve barulho de fundo das ondas a embaterem nas rochas, metros abaixo dos meus pés. Acho que ainda não tinha interiorizado totalmente que estava ali, onde parecia que tudo, desde o ar que respirava até ao chão que me suportava, era diferente e, ao mesmo tempo, estranhamente familiar, como se tivesse um eco daquela paisagem presente na minha memória. Entretanto, Fabrizio lá se fez aparecer, dobrando calmamente a curva na sua Vespa branca e apresentando-se com um pedido de desculpas em inglês macarrónico e um grande sorriso na cara.

A vila era, de facto, muito bonita, desde o seu pequeno mas imponente castelo lá no alto, até às vielas que pareciam multiplicar-se a cada passo dado. O pequeno conjunto de casas, de cores vivas em tons alaranjados, encontrava-se voltado para a praia, lá em baixo. Esta tinha sempre uns poucos turistas e um ou outro local, mas nunca estava cheia, o que confirmou a feliz suspeita de que a nossa vila ainda não tinha sido totalmente “descoberta” (como tinham sido muitas outras que visitámos a seguir, cujas praias se tornavam, por isso mesmo, quase impossíveis de desfrutar). A minha parte favorita do dia era o pôr do Sol: aqueles finais de tarde passados na piscina, com um grupo alegre e barulhento de espanhóis ou umas crianças sorridentes a chapinhar na água, todos a aproveitar os últimos raios de um sol que se ia escondendo languidamente no horizonte, deixaram saudades.

Passámos também uns dias em Porto Cervo, na Costa Esmeralda, de grande fama, com praias, ruas e esplanadas mais cheias, mas nem por isso menos encantadoras. A vila não tinha a rusticidade de Catelsardo, mas compensava-o com umas praias lindíssimas, provavelmente as mais bonitas que já vi, que me faziam sentir como se estivesse a viver num postal.

Mas a Sardenha não é só praia, e houve um dia em que nos aventurámos mais para o meio da ilha, onde acabámos por descobrir Nuraghe Santu Antine. O local estava repleto de variadíssimas construções pré-históricas, como antas e pequenas casas de pedra, que nunca deixam de me impressionar. Acho impossível não pensar em toda a história contida naquelas paredes, não questionar o que foi vivido naquele local, do qual nada ou quase nada sabemos ao certo, mas que, ainda assim, nos esforçamos por descobrir, com a pouca informação que temos, como se montássemos um puzzle.

Num dos últimos dias decidimos ir até à ilha de La Maddalena, vizinha da Sardenha, a que se liga por uma ponte. Aí encontrei mais um pequeno paraíso. Descrevê-lo, admito, pode soar estereotipado (praia semideserta, fina areia branca, águas cristalinas…), embora saiba que era exactamente isso que procurava naquela tarde de fins de Agosto. Enquanto o sol já ia dando sinais de que começava a afrouxar e preparávamos as coisas para ir embora, lembro-me de tentar fixar o momento em toda a sua plenitude: um veleiro no horizonte, um casal alemão a aproveitar os últimos banhos de sol do Verão antes de voltar para a sua cidade fria e escura, a cor do mar azul-turquesa, mais intenso no horizonte e suave junto à costa, uma família italiana cuja conversa se faz ouvir levemente (como é bom ouvir italiano!) e, mais uma vez, aquela sensação – a de viver dentro de um postal.

Ana Trigo

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