Joyce Moreno celebra 50 anos de músicas e termina digressão europeia em Espinho

A cantora e compositora brasileira celebra 50 anos do seu primeiro disco com uma regravação a que chamou 50 e que em breve chegará às lojas. Este sábado termina a sua digressão europeia em Portugal, com um concerto único. No Auditório de Espinho, às 21h30.

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Joyce Moreno em 2017 LEO AVERSA
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Joyce Moreno em 2017 LEO AVERSA
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Joyce Moreno em 2017 com o seu violão LEO AVERSA
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Joyce em 1968 com Milton Nascimento DR

Para assinalar meio século sobre a gravação do seu primeiro disco, Joyce, de 1968, a cantora e compositora brasileira Joyce Moreno resolveu regravá-lo, com duas faixas extra. O disco, com o título 50, só vai sair agora em formato físico na Europa, embora já esteja nas plataformas digitais. É este disco que serve de base à actual digressão europeia da cantora, que termina com um único concerto em Portugal, após ter passado por vários países: Áustria, Suécia, Dinamarca, Bélgica e Inglaterra. Será este sábado, 1 de Dezembro, no Auditório de Espinho, às 21h30. Joyce (voz e violão) terá consigo Tutty Moreno na bateria, Rodolfo Stroeter no baixo e Hélio Alves no piano, um trio que já a companha há anos: Tutty há mais de 40, Rodolfo há 20 e Hélio há 10.

Regravação era uma ideia antiga

A regravação do disco Joyce era uma ideia antiga, agora concretizada, diz Joyce ao PÚBLICO: “Eu sempre tive vontade de fazer isso. Porque gosto muito das músicas do disco e porque acho que não perderam o prazo de validade. São composições do meu início, ainda muito válidas, e tem também composições dos meus amigos daquela época que continuam meus amigos até hoje: Caetano Veloso, Paulinho da Viola, Marcos Valle, Francis Hime, Jards Macalé, Toninho Horta, e vários desses compositores participam nesta regravação.”

Quando gravou esse primeiro disco, Joyce tinha 19 anos, era uma garota. E a passagem dos anos, com inúmeros concertos e quase meia centena de discos em nome próprio (alguns com parcerias), trouxe-lhe um outro olhar sobre essas canções: “É aquele repertório com uma cantora melhor, claro, e com o violão, que eu não toquei no primeiro disco e que hoje em dia é o comando do meu trabalho. Tem os meus próprios arranjos, as minhas ideias de hoje e a participação desses amigos que estão todos óptimos: Marcos Valle, que tocou piano, Toninho Horta tocou violão, Francis Hime cantou comigo, Roberto Menescal (que não está no primeiro disco, mas que é uma figura muito importante na minha carreira) participou, Danilo Caymmi também. Foi bom muito ter esses amigos desses anos todos presentes neste trabalho.”

“Com o tempo, fui ficando mais moça”

O disco de 1968 tinha onze faixas, cinco assinadas por ela, letra e música (Não muda não, Improvisado, Superego, Cantiga de procura e Me disseram), uma parceria de Joyce com Jards Macalé (Chôro chorado) e composições de Caetano Veloso (Ave Maria), Marcos Valle e Ruy Guerra (Bloco do eu sozinho), Paulinho da Viola (Ansiedade), Vinicius de Moraes e Francis Hime (Anoiteceu), Toninho Horta e Ronaldo Bastos (Litoral). O de agora, que Joyce regravou, tem as mesmas faixas, mas acrescidas de dois extras.

“A gente manteve essa mesma ordem das canções, só que no final entram duas músicas novas, recentes. A primeira é uma parceria minha com Zélia Duncan chamada Com o tempo, que ela aliás canta junto comigo no disco. Ela me mandou essa letra, e eu musiquei, e achei que seria muito pertinente gravá-la agora. Porque ela começa dizendo: ‘Com o tempo, fui ficando mais moça.’ Gostei muito da ideia, porque acho que a ideia do disco é essa mesmo.’ E a última é uma música minha que se chama A velha maluca. O disco já toca nas questões femininas desde o início, por Não muda não é a história de uma adolescente que não quer se casar, quer ter liberdade, e propõe ao namorado que não se casem, que não vão para a vida tradicional de família. E A velha maluca é uma mulher de 70 anos [idade que Joyce tem agora, pois nasceu no Rio de Janeiro em 31 de Janeiro de 1948] dando a mão àquela menina de 19, conversando com ela e dizendo todos os clichés que se dizem da mulher quando fica mais velha, bruxa, santa, sábia, maluca, doida. Porque o envelhecimento do homem geralmente pressupõe uma sabedoria e o da mulher é sempre um pouco cheio desses clichés. É importante falar disso porque é uma última questão feminina. O feminismo tem hoje muitas faces, e essa é uma face importante.”

Regresso a um marco chamado Feminina

Antes de regravar Joyce em 50, Joyce Moreno lançara em 2017 Palavra e Som e, em 2015, dois discos que revisitam, respectivamente, clássicos brasileiros e standards internacionais, Raiz e Cool, tendo este último versões de temas como Love for sale, Moon river, Round midnight ou Fever.

“Esses dois discos são irmãos, eu acho. E são músicas de formação, para mim. Repertórios que me formaram como artista, na música brasileira (caso de Raiz) e nos standards (caso do Cool). Eu tenho uma formação de jazz muito forte, sempre ouvi muito, mas essas músicas nem todas são standards de jazz, há também Harry Belafonte, com Banana boat, uma música da minha infância, ou Nature boy, que Nat King Cole cantava. Da mesma forma, em Raiz nem tudo é bossa nova: tem Ary Barroso, tem Dorival Caymmi, que é pré-bossa nova. Mas é música de formação para mim.”

Nesta digressão, além de apresentar 50, Joyce revisita também outros discos seus. “Principalmente o Feminina, que é um disco de 1980, não só porque o disco foi muito marcante mas também porque muita gente gravou e regravou essas músicas no mundo inteiro. E tem algumas coisas do Palavra e Som, que é um disco do ano passado, com canções todas da minha autoria.”

Aprender a cuidar melhor da democracia

Joyce viveu sempre no Brasil, no Rio de Janeiro. “Na verdade, mais de metade do ano a gente passa na estrada, além da Europa nos Estados Unidos e no Japão, todos os anos. Então isso é interessante porque dá uma perspectiva de fora e de dentro.” A situação no Brasil preocupa-a, com reservas. “Em toda a área do pensamento, não só nas artes como nas universidades, de um modo geral, há uma preocupação bastante grande. Mas acho que vamos aguardar para ver o que vai acontecer. Já passámos por muitas situações difíceis no Brasil, a minha geração passou por muita coisa e agora é o momento de as gerações mais jovens tomarem a frente. A preocupação existe, eu tenho sempre dito que a democracia é uma plantinha muito frágil que a gente precisa regar, cuidar, para que ela se transforme numa árvore, numa coisa mais sólida. Eu acho que a gente no Brasil ainda precisa aprender a cuidar melhor dessa plantinha.”

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