Por uma nova política florestal

Há que encontrar soluções para que as florestas possam contribuir com todo o seu potencial.

Sabemos que se não formularmos bem um problema, a probabilidade de se encontrar uma solução ótima vai depender da sorte e não do conhecimento, que devia ter sido usado na formulação do problema. Falo disto a propósito das políticas públicas sobre o setor florestal em Portugal, onde se pode verificar que não existe uma boa formulação dos problemas e, em consequência, os problemas subsistem sem solução à vista.

Os responsáveis pelo desenvolvimento das políticas nacionais para a floresta, em vez de considerarem as questões fundamentais, têm andado, por exemplo, à bolina das políticas europeias e de subsídios ou atrás de preconceitos ou crendices, como a culpabilização do eucalipto na tragédia dos fogos do ano passado.

Tem sido diagnosticado por muitos que uma causa fundamental do declínio da floresta nacional se prende com a perda de valor da mesma ou a diminuição da retribuição dos seus produtos e serviços. Há muitas razões apontadas para esse facto, desde as ineficiências de mercado até uma evolução sociodemográfica muito penalizante para as atividades rurais.

Vou procurar contribuir para esta discussão com argumentos mais sólidos, a partir da pista das ineficiências de mercado e a partir de uma reflexão recente, desenvolvida a propósito da agenda das alterações climáticas e do papel das florestas na sua mitigação.

Assim, identifica-se que o problema que temos que ultrapassar é o do modelo económico da nossa floresta. Existe um grande desajustamento entre o conceito atual do papel das florestas e a correspondente captura de valor económico, que se limita às componentes produtivas tradicionais. O conceito atual compreende a componente tradicional de fornecimento de matérias primas para diversas indústrias, somadas as contribuições ambientais, tais como a fixação de carbono, a qualidade da água, entre muitos outros.

Desta forma há que encontrar soluções para que, a partir da recuperação do valor económico, as florestas possam contribuir com todo o seu potencial.

Em primeiro lugar, o setor tem vivido nas últimas décadas em permanente subfinanciamento, público e privado. Às declarações bondosas de todos os responsáveis políticos dos últimos anos não tem correspondido o necessário financiamento. O peso político específico do sector é pequeno, e os poucos votantes ligados diretamente à atividade leva à secundarização da disponibilização de recursos públicos. Por outro lado, a alocação de investimentos é feita, tanto no sector publico como no privado, numa perspetiva de curto prazo, esquecendo as vantagens adicionais da criação de valor de longo prazo.

Em segundo, as soluções ensaiadas têm sistematicamente esquecido a necessidade de se constituírem parcerias de ação, sobretudo com impacto positivo nas economias regionais e nas comunidades rurais. Assim, há que procurar soluções integradas de desenvolvimento de sistemas agroflorestais viáveis. Estes sistemas terão que funcionar dentro dos mercados, sendo necessário, contudo, encontrar modelos que integrem o valor criado nos serviços hoje não monetarizados, como por exemplo a fixação de carbono.

Em terceiro, haverá que encontrar modelos de intensificação sustentável das produções. A produção primária das florestas tem que ser potenciada para que o rendimento obtido por unidade de área seja gerador de riqueza suficiente para sustentar modos de vida com qualidade. Esta produção deverá estar baseada em produtos atualmente valorizados pelos mercados, mas deverá também conter uma componente de retribuição de produções hoje não valorizadas economicamente, mas classificadas como fundamentais pela sociedade.

O quarto desafio é ter todos os operadores a atuar dentro das regras da sustentabilidade. Sabemos que o business as usual beneficia muitas vezes de atuar independentemente dos seus impactos, em claro dumping ambiental e social. Agindo como sempre, vamos perpetuar os desequilíbrios e desvalorizar funções produtivas que devem ser valorizadas.

Por último, devemos desenvolver um conjunto de incentivos económicos que permitam perpetuar o uso sustentável e o valor das produções. Mecanismos conhecidos, como a certificação de origem e de modo de produção, que permitam a valorização, não só pelo valor tradicional de mercado, mas também pelo pagamento dos serviços ambientais ou sociais.

Este exercício para a realidade portuguesa foi inspirado na apresentação efetuada por David Brand, CEO da empresa New Forests, no Forum do Global Impact Investing Network, realizado o mês passado em Paris. Nele reflete sobre a necessidade de se atribuir um novo valor às florestas para se viabilizar a solução climática de mitigação através das florestas.

Deixo para discussão e uso um conjunto de ideias que endereçam os reais desafios da floresta portuguesa e não as discussões estéreis sobre espécies, meios de combate e outras perdas de tempo que têm ocupado o espaço político e mediático nacional.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

O Institute of Public Policy (IPP) é um think tank académico, independente e apartidário. As opiniões aqui expressas vinculam somente os autores e não reflectem as posições do Institute of Public Policy, da Universidade de Lisboa ou de qualquer outra instituição

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