PS prepara-se para eleições, atirando à direita e à esquerda

Socialistas ensaiam estratégias para a campanha das eleições do próximo ano, partindo do posicionamento de cada força política nas votações do Orçamento, que começam esta segunda-feira

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Carlos César e António Costa à chegada para as jornadas LUÍS FORRA/LUSA
Carlos César encerrou as jornadas do PS
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Carlos César encerrou as jornadas do PS LUÍS FORRA/LUSA
No sábado, António Costa discursou perante os deputados
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No sábado, António Costa discursou perante os deputados LUÍS FORRA/LUSA

Carlos César falou de uma espécie de vírus que ataca os “outros”, leia-se os partidos parceiros de Governo, como uma “ansiedade pré-eleitoral”. António Costa lembrou que em ano de eleições há quem não resista à tentação de apresentar propostas “para eleitor ver”, referindo-se sobretudo aos partidos da direita. No meio, está o PS que, para os dois homens do topo do partido, está imune a esses estados de alma eleitorais, mas que, na verdade e à vista de todos, já prepara o terreno e o discurso a pensar no ano de 2019.

A estratégia que o partido seguiu nestes últimos dias centrou-se numa necessidade de preparar o caminho a dois tempos: um mais imediato, para controlar as votações no Orçamento do Estado para 2019 evitando a “tragédia orçamental”, como lhe chamou o primeiro-ministro, caso o Orçamento seja muito alterado, outro mais dilatado, tendo em conta as eleições, primeiro as europeias, mas sobretudo as legislativas que serão influenciadas por esta circunstância das votações e do que delas resultar politicamente, mais do que orçamentalmente.

Os dois homens que mandam no PS (no Governo, no partido e no grupo parlamentar) assumiram discursos que aproveitaram as diferentes posições dos partidos sobre o Orçamento, explorando o que consideram ser posicionamentos errados ou mais frágeis politicamente com o mesmo objectivo: atirar à direita (António Costa) e afastar-se da esquerda quanto baste, em especial do BE, para corroer politicamente as expectativas de uma futura solução de Governo com um compromisso mais profundo.

Em relação à esquerda, este quebrar de expectativas foi primeiro assumido por António Costa, quando afastou o BE de uma possível solução de Governo, na sexta-feira, no balanço dos três anos de mandato, e por Carlos César, quando no domingo, sem os nomear, juntou ao BE o PCP e disse que os “outros” estavam “pouco preparados” para entender a governação em tempos “tão sensíveis”, cá dentro e lá fora.

César parece ter entendido no discurso de Costa o abrir da porta ao ataque ao BE. Mesmo não falando directamente do partido de Catarina Martins ou de Jerónimo de Sousa, foi evidente que foi mais para o Bloco do que para o PCP a acusação de que há partidos “que já acham que as propostas da direita são como as propostas da esquerda, parecem tomados por uma ansiedade pré-eleitoral de difícil compatibilização com o sentido de responsabilidade que os portugueses estimam”. A líder do BE tinha dito, no dia anterior, que o partido iria votar favoravelmente todas as propostas “iguais” às do BE, fossem de que partido fossem.

Ai, a crise

César aproveitou para acenar com o bicho papão de uma crise europeia (desta vez mais política com o crescimento de populismos) para defender que é no PS que os portugueses podem encontrar o conforto de um partido que defende as regras europeias. Lembrando que há “outros” que “negligenciam” os compromissos europeus, “compete” ao PS ser o porto seguro dos europeístas, mesmo que isso não impeça conversas preferenciais com os partidos que não o são. “Compete ao PS manter o diálogo, manter um diálogo particularmente à esquerda, mas compete-lhe sobretudo manter o rumo”.

Esse rumo tem como objectivo final uma maioria maior, passe a redundância. É cedo para o uso de expressões como “maioria absoluta” e dificilmente Costa a pedirá com todas as letras, mas o balão de ensaio vai sendo lançado. Mas César já fala em “pedir com a consciência tranquila aos portugueses um PS mais forte que conduza o país por um caminho mais seguro”.

As sondagens dizem ao partido que lhe faltam poucos pontos percentuais para, em teoria, chegar a uma maioria absoluta, não só porque está próximo dos 44% (que deu a única maioria ao partido com José Sócrates), mas porque a distância para o segundo (o PSD) está nos 15 pontos percentuais, o que facilitaria, por causa do método de Hondt, a eleição de mais deputados. Neste quadro, os socialistas sabem que têm de ir à procura dessa franja que lhes falta e parecem entender que ela se encontra nos que tanto votam à direita como à esquerda e valorizam a cautela e as contas certas.

Rigor nas contas

E é por isso que atiram à direita. O PS acredita que será a imagem do rigor orçamental, mais do que o abrir os cordões à bolsa e dar mais a professores e a funcionários públicos, que lhe irá dar os votos que faltam. Será, aliás, neste cenário que Costa se move por estes dias, focando-se na “tragédia” orçamental que seria provocada caso “os partidos”, que não o PS, votassem favoravelmente as 962 propostas de alteração ao OE. Essa tragédia, como lhe chamou, tem na sua origem sobretudo os partidos da oposição que são, disse, os “campeões do despesismo”.

Mas António Costa fez mais. Falou directamente para todos os funcionários públicos, dizendo-lhes que não discriminará positivamente os professores e que lhes dará o mesmo que a todos os outros. Com isto está também a falar a dois tempos: avisa agora os partidos para terem cuidado com as injustiças que poderão cometer para com os restantes funcionários públicos nas votações do Orçamento, dando mais a uns do que a outros (e o Governo optou por dar menos, mas distribuído de igual forma, diz); e pensa em como pode agradar a todos os outros na campanha eleitoral que se estenderá ao longo do ano de 2019.

O vírus das eleições está aí. O xadrez político começa a redesenhar-se e todos, mas mesmo todos os partidos, medem cada vez mais as suas acções. O jogo começa hoje, no Parlamento, nas votações que se iniciam a pensar no ano de 2019.

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